Este texto foi escrito no dia 22 de outubro de 2004. Como nunca o publiquei, resolvi fazê-lo, já que é um bom texto e suas indagações não ficaram superadas. Dividi-o em duas partes, para que não se tornasse cansativo ao leitor.
Quando eu folheio as páginas de Tocqueville, mais precisamente “A Democracia na América”, eis que vejo um verdadeiro profeta dos nossos tempos. Talvez não seja eu o primeiro a falar isso. Chegam a ser impressionantes as análises aguçadas do aristocrata francês convertido a democracia liberal, no que diz respeito aos fenômenos modernos da mentalidade igualitária e democrática. De fato, o objeto de análise de Tocqueville é o pensamento democrático, sua abrangência e influência nos costumes e instituições. E ele coloca em contraposição, as antigas eras aristocráticas, a época do Antigo Regime.
Um dos aspectos mais marcantes que são visíveis no igualitarismo moderno é a sua capacidade de nivelação cultural das pessoas, além da negação de valores superiores e contemplativos. Explico, hoje em dia, as pessoas parecem mais propícias a padronização e as coisas imediatas, do que a busca mesma de valores superiores. Afirmo valores superiores, aquilo que foge ao padrão comum da massa e torna especial a cultura, ou seja, qualquer criação que se eterniza por sua grandeza e seus significados espirituais, que se reavivam eternos e atemporais. É a filosofia, as artes, o pensamento político, enfim, a cultura elevada que faz o homem mais sofisticado, menos medíocre existencialmente e vira tradição através dos tempos.
Todavia, uma questão marcante em nossa época é a falta da contemplação. O homem democrático e igualitário médio, em especial, não é, por regra, contemplativo. Como bem diria Tocqueville, os tempos democráticos são propícios às idéias gerais e simplistas da realidade, principalmente entre os intelectuais. Tais concepções parecem amenizar a falta de reflexão do homem moderno, compensando sua fraqueza de pensamento. Além de serem genéricas, as opiniões comuns dos debates vigentes são transitórias e efêmeras, além de superficiais. O homem moderno talvez não tenha tempo para pensar. A contemplação dá lugar à ação. O prático e o momentâneo valem mais do que o reflexivo e lento. O curioso é que as idéias disseminadas em nosso meio querem sempre ser gerais, porém, partindo de perspectivas subjetivas, e por vezes absurdas, já que são opiniões que não querem ser provadas e sim pregadas como um tipo de ação retórica. Mas agradam as conveniências do momento, pois o importante não é comprovar um argumento por si mesmo e sim seduzir o maior número de adeptos. O contemplativo, o amante da verdade, é um ser em extinção.
Dificilmente teremos em nossos tempos democráticos, um monge medieval, um aristocrata ou mesmo um asceta. Algo nesse sentido parece relegado ao passado. Todavia, se o intelectual do passado era um homem de contemplação, o intelectual moderno é um homem de ação. Ele é rude, direto, extremamente retórico, porém, pouco reflexivo. Ele não busca a verdade, mas milita numa causa. Ao invés de contemplação, ele projeta a realidade em que vive. E como é incapaz de entender os valores do passado, já que concebe sempre o mundo como imediato e presente, ele ignora completamente o legado do passado.
Isto é visível como a história é projetada em nossa época igualitária. O presente é absolutizado e serve de parâmetros para julgar em absoluto o passado. Isso porque o culto do futuro é sempre uma eterna negação do passado e do presente. Como o princípio igualitário sempre se projeta superior culturalmente a todo resto e o dogma do futuro, logo, o pano de fundo democrático se julga no direito de subtrair toda uma cultura intelectual e histórica que nunca foi pautada no igualitarismo, e sim na crença de valores aristocráticos e supremos. O conceito de padronização é notório. A massificação é perigosa.
A palavra de ordem é igualitarismo. Não é o igualitarismo de direitos ou de respeito a escolhas e aptidões, no sentido liberal do termo, tal como fora desenvolvido no século XVII. É o igualitarismo de padrões. O estranho do raciocínio igualitário moderno é sua obsessão sistêmica. O igualitário nas democracias modernas chegou a ponto de crer que o indivíduo é apenas engrenagem de um sistema. A sociedade é apenas um composto orgânico e o sujeito uma peça da máquina. Cada sujeito não tem força própria, é a expressão arrebanhada de uma coletividade, de uma padronização. E como a grande maioria dos padrões se pauta pela mediocridade, logo, o igualitário não consegue tolerar algo que fuja desse padrão. E por isso rejeita a cultura superior e usa como lugar comum, aquilo que está acostumado, sem o menor esforço.
Essa psique é uma constante em nossa época. As universidades e centros culturais estão cheios dessa ideologia perniciosa. As trupes intelectuais socialistas e politicamente corretas julgam obras de arte, literaturas, músicas, filmes, pelas contribuições presentes e futuras ao princípio-mor do igualitarismo fundamentalista, que prima para agradar as susceptibilidades neuróticas de negros, gays e feministas raivosas. Isto porque eles mesmos nivelam todas as culturas, como se fossem iguais. Tanto faz se uma partitura de Bach é superior em talento e espiritualidade em relação às cantilenas do Show Business. Ou Shakespeare ser melhor que qualquer porcaria politicamente engajada disfarçada de literatura. E tampouco se o judaísmo e cristianismo sejam religiões superiores a qualquer culto satânico ou de duendes. Nas academias, os “Coletivos culturais” suplantam a capacidade criativa de indivíduos. Nada passa pelos crivos de seus preconceitos mais odiosos e sua baixeza moral e intelectual.
E na questão histórica, o processo, infelizmente, não é diferente. A obsessão sistêmica igualitária, que reduz o brilho do indivíduo no vazio das multidões é o lugar comum de uma boa parte de filósofos dos últimos dois séculos. E não é por acaso que eles justificaram os piores sistemas totalitários, em nome do igualitarismo. Eis uma nova forma de tirania, a tirania da igualdade ou a ditadura dos medíocres. Quem poderia supor, logo, que a igualdade poderia ser usada como uma forma de opressão? De fato, foi a ditadura de padrões e comportamentos homogêneos, uma das inspirações dos regimes totalitários modernos. Foi pelo dogma do igualitarismo, que se criou um dos sistemas mais injustos da história humana. E foi pela obsessão do igualitarismo, que se renegou algo muito mais importante, que é a liberdade do indivíduo, que por natureza, é desigual.
Um dos aspectos mais marcantes que são visíveis no igualitarismo moderno é a sua capacidade de nivelação cultural das pessoas, além da negação de valores superiores e contemplativos. Explico, hoje em dia, as pessoas parecem mais propícias a padronização e as coisas imediatas, do que a busca mesma de valores superiores. Afirmo valores superiores, aquilo que foge ao padrão comum da massa e torna especial a cultura, ou seja, qualquer criação que se eterniza por sua grandeza e seus significados espirituais, que se reavivam eternos e atemporais. É a filosofia, as artes, o pensamento político, enfim, a cultura elevada que faz o homem mais sofisticado, menos medíocre existencialmente e vira tradição através dos tempos.
Todavia, uma questão marcante em nossa época é a falta da contemplação. O homem democrático e igualitário médio, em especial, não é, por regra, contemplativo. Como bem diria Tocqueville, os tempos democráticos são propícios às idéias gerais e simplistas da realidade, principalmente entre os intelectuais. Tais concepções parecem amenizar a falta de reflexão do homem moderno, compensando sua fraqueza de pensamento. Além de serem genéricas, as opiniões comuns dos debates vigentes são transitórias e efêmeras, além de superficiais. O homem moderno talvez não tenha tempo para pensar. A contemplação dá lugar à ação. O prático e o momentâneo valem mais do que o reflexivo e lento. O curioso é que as idéias disseminadas em nosso meio querem sempre ser gerais, porém, partindo de perspectivas subjetivas, e por vezes absurdas, já que são opiniões que não querem ser provadas e sim pregadas como um tipo de ação retórica. Mas agradam as conveniências do momento, pois o importante não é comprovar um argumento por si mesmo e sim seduzir o maior número de adeptos. O contemplativo, o amante da verdade, é um ser em extinção.
Dificilmente teremos em nossos tempos democráticos, um monge medieval, um aristocrata ou mesmo um asceta. Algo nesse sentido parece relegado ao passado. Todavia, se o intelectual do passado era um homem de contemplação, o intelectual moderno é um homem de ação. Ele é rude, direto, extremamente retórico, porém, pouco reflexivo. Ele não busca a verdade, mas milita numa causa. Ao invés de contemplação, ele projeta a realidade em que vive. E como é incapaz de entender os valores do passado, já que concebe sempre o mundo como imediato e presente, ele ignora completamente o legado do passado.
Isto é visível como a história é projetada em nossa época igualitária. O presente é absolutizado e serve de parâmetros para julgar em absoluto o passado. Isso porque o culto do futuro é sempre uma eterna negação do passado e do presente. Como o princípio igualitário sempre se projeta superior culturalmente a todo resto e o dogma do futuro, logo, o pano de fundo democrático se julga no direito de subtrair toda uma cultura intelectual e histórica que nunca foi pautada no igualitarismo, e sim na crença de valores aristocráticos e supremos. O conceito de padronização é notório. A massificação é perigosa.
A palavra de ordem é igualitarismo. Não é o igualitarismo de direitos ou de respeito a escolhas e aptidões, no sentido liberal do termo, tal como fora desenvolvido no século XVII. É o igualitarismo de padrões. O estranho do raciocínio igualitário moderno é sua obsessão sistêmica. O igualitário nas democracias modernas chegou a ponto de crer que o indivíduo é apenas engrenagem de um sistema. A sociedade é apenas um composto orgânico e o sujeito uma peça da máquina. Cada sujeito não tem força própria, é a expressão arrebanhada de uma coletividade, de uma padronização. E como a grande maioria dos padrões se pauta pela mediocridade, logo, o igualitário não consegue tolerar algo que fuja desse padrão. E por isso rejeita a cultura superior e usa como lugar comum, aquilo que está acostumado, sem o menor esforço.
Essa psique é uma constante em nossa época. As universidades e centros culturais estão cheios dessa ideologia perniciosa. As trupes intelectuais socialistas e politicamente corretas julgam obras de arte, literaturas, músicas, filmes, pelas contribuições presentes e futuras ao princípio-mor do igualitarismo fundamentalista, que prima para agradar as susceptibilidades neuróticas de negros, gays e feministas raivosas. Isto porque eles mesmos nivelam todas as culturas, como se fossem iguais. Tanto faz se uma partitura de Bach é superior em talento e espiritualidade em relação às cantilenas do Show Business. Ou Shakespeare ser melhor que qualquer porcaria politicamente engajada disfarçada de literatura. E tampouco se o judaísmo e cristianismo sejam religiões superiores a qualquer culto satânico ou de duendes. Nas academias, os “Coletivos culturais” suplantam a capacidade criativa de indivíduos. Nada passa pelos crivos de seus preconceitos mais odiosos e sua baixeza moral e intelectual.
E na questão histórica, o processo, infelizmente, não é diferente. A obsessão sistêmica igualitária, que reduz o brilho do indivíduo no vazio das multidões é o lugar comum de uma boa parte de filósofos dos últimos dois séculos. E não é por acaso que eles justificaram os piores sistemas totalitários, em nome do igualitarismo. Eis uma nova forma de tirania, a tirania da igualdade ou a ditadura dos medíocres. Quem poderia supor, logo, que a igualdade poderia ser usada como uma forma de opressão? De fato, foi a ditadura de padrões e comportamentos homogêneos, uma das inspirações dos regimes totalitários modernos. Foi pelo dogma do igualitarismo, que se criou um dos sistemas mais injustos da história humana. E foi pela obsessão do igualitarismo, que se renegou algo muito mais importante, que é a liberdade do indivíduo, que por natureza, é desigual.
IGUALITARISMO NA HISTÓRIA (2)
E a história, onde fica? Não é por acaso que hoje, muitas pessoas em nosso país têm uma profunda dificuldade de entender história. Acostumados a padronizações gerais e simplistas de raciocínio, são ineptos ao compreender a riqueza de detalhes que a história nos abre, em leque de visões muito mais complexas e bem menos simplistas. Incapazes de compreender o passado, muitos mal entendem o presente, e dificilmente entenderão algo no futuro. E a historiografia do século XIX, salvo raras exceções, contribuiu para este fim, em esvaziar de sentido, complexidade, grandeza e particularidade, a história humana. É uma historia de projeções, que não descreve os fatos, e sim os reinventa ao gosto das conveniências presentes ou futuras.
Em particular, neste sentido, um dos pensadores mais perniciosos para estudar história, sem dúvida, se chama Karl Marx. Que uma boa parte da intelectualidade tenha admiração por um sujeito desses, é um enigma que devia ser mais apurado. Contudo, devemos lembrar que o intelectual médio do igualitarismo não pensa, usa a retórica. E nisso, Marx é um mestre. Ele oferece uma boa dose de argumentos simplistas e gerais para explicar a história, como a totalidade da realidade humana. E como um típico igualitário fanático e radical, ele presume sua época histórica superior a todas as outras, e que todas necessariamente serão substituídas por uma época vindoura e hipotética.
O igualitarismo marxista, como uma boa parte dos igualitarismos radicais antigos e modernos, não é libertário. O homem não é dotado de igualdade, no sentido de dignidade e direito à liberdade, mas num conceito mecanicista e sistêmico da realidade. O homem é mero reflexo das condições econômicas e do meio histórico e social, e através de um processo histórico, o destino humano está predeterminado. Se Tocqueville previu, já na sua época, entre os historiadores e pensadores, sem contar uma parte da população, as idéias genéricas e sistêmicas da realidade, Marx é a personificação mais concreta desta profecia. O interessante nesse tipo de visão história é o processo fatalista de investigação histórica. Se o destino humano está predeterminado por condições objetivas “materiais” da sociedade, ou qualquer outra justificativa difícil de se provar, o homem não é livre para escolher e tampouco é um sujeito histórico. Tocqueville afirmava que se tal pensamento fatalista fosse introduzido de tal forma na alma dos povos democráticos, os povos seriam reduzidos da natureza de cristãos a dóceis turcos.
O igualitarismo marxista, como uma boa parte dos igualitarismos radicais antigos e modernos, não é libertário. O homem não é dotado de igualdade, no sentido de dignidade e direito à liberdade, mas num conceito mecanicista e sistêmico da realidade. O homem é mero reflexo das condições econômicas e do meio histórico e social, e através de um processo histórico, o destino humano está predeterminado. Se Tocqueville previu, já na sua época, entre os historiadores e pensadores, sem contar uma parte da população, as idéias genéricas e sistêmicas da realidade, Marx é a personificação mais concreta desta profecia. O interessante nesse tipo de visão história é o processo fatalista de investigação histórica. Se o destino humano está predeterminado por condições objetivas “materiais” da sociedade, ou qualquer outra justificativa difícil de se provar, o homem não é livre para escolher e tampouco é um sujeito histórico. Tocqueville afirmava que se tal pensamento fatalista fosse introduzido de tal forma na alma dos povos democráticos, os povos seriam reduzidos da natureza de cristãos a dóceis turcos.
Será coincidência que onde o materialismo histórico proliferou, ele transformou pessoas em escravas turcas? Tocqueville dizia que era um ato heróico preservar a religião no seio das sociedades democráticas. Mas por quê? Porque a religião, ironicamente, seria a única coisa que restaria de superior que pudesse se contrapor à doença do igualitarismo radical.
O Cristianismo é a cultura antiga e o imperativo da moral de um Cristo contra multidões arrebanhadas que o condenavam, como o judaísmo é o Shemá Israel de D*us para seu povo eleito, a Lei, a mitzvá que cada judeu guarda pra si, no intimo de sua consciência. E isto poderia se opor ao fatalismo das ideologias materialistas.
Uma questão interessante a ser discutida é o tipo de debate sobre história em nosso país. Os jovens na escola, como os acadêmicos, na mania absolutista de julgar tudo pelo igualitarismo ou pelo marxismo, que é sua expressão máxima, impõem arbitrariamente critérios de valor, em termos ideológicos, políticos ou mesmo preconceitos históricos, sem se dar ao trabalho de analisar os sujeitos históricos, os indivíduos e suas instituições. Eles dificilmente entendem os valores culturais de uma época, pelo prisma dos próprios sujeitos que a viveram e não fazem a menor questão de entender o porquê daquilo.
Um exemplo clássico dessa experiência foi um debate que eu tive com uma feminista e um socialista radical. A feminista condenava o homem malvado e a sociedade patriarcal através da história, por causa de uma suposta “opressão” machista. A mulherzinha chegou até a condenar os rituais do casamento, pois a cerimônia da entrega da guarda da filha ao marido, era outras das sandices do machismo malvado. E o socialista condenava todos os sistemas aristocráticos, por causa de seu credo igualitário radical. Nisto, os dois não pouparam criticas a Igreja Católica, aos nobres e até a natureza humana, que devia ser “transformada” historicamente.
Uma questão interessante a ser discutida é o tipo de debate sobre história em nosso país. Os jovens na escola, como os acadêmicos, na mania absolutista de julgar tudo pelo igualitarismo ou pelo marxismo, que é sua expressão máxima, impõem arbitrariamente critérios de valor, em termos ideológicos, políticos ou mesmo preconceitos históricos, sem se dar ao trabalho de analisar os sujeitos históricos, os indivíduos e suas instituições. Eles dificilmente entendem os valores culturais de uma época, pelo prisma dos próprios sujeitos que a viveram e não fazem a menor questão de entender o porquê daquilo.
Um exemplo clássico dessa experiência foi um debate que eu tive com uma feminista e um socialista radical. A feminista condenava o homem malvado e a sociedade patriarcal através da história, por causa de uma suposta “opressão” machista. A mulherzinha chegou até a condenar os rituais do casamento, pois a cerimônia da entrega da guarda da filha ao marido, era outras das sandices do machismo malvado. E o socialista condenava todos os sistemas aristocráticos, por causa de seu credo igualitário radical. Nisto, os dois não pouparam criticas a Igreja Católica, aos nobres e até a natureza humana, que devia ser “transformada” historicamente.
Quando ouvimos relatos como esse, parece que a jovem pensa que existia Delegacia da Mulher na Idade Antiga e Média. Se hoje as mulheres são frágeis, imaginemos na Idade Antiga e Média, em que a força da espada contava mais do que qualquer outro tipo de lei. E quando uma jovem como essa é ameaçada por um mau elemento e implora o socorro do namorado ou marido, ela mal percebe que reproduz historicamente, tudo aquilo que milenarmente condena. O patriarcado para a mulher, em outros tempos, antes foi um ato de generosidade do que de opressão. Porém, para uma jovem fechada no viés do igualitarismo, ela não consegue conceber um mundo senão aquele idealizado no seu autismo ideológico.
O socialista radical comete a mesma falha de raciocínio. As lideranças, como hoje, em épocas imemoriais, sempre foram personalizadas na figura de um homem, até porque a liderança é um dado inato na sociedade humana. Qualquer forma de organização social, política ou mesmo familiar, só podem subsistir se houver hierarquia e capacidade de comando. Quem ignora uma questão tão óbvia e peculiar, desconhece completamente a gênese da sociedade humana. Hierarquia e liderança na sociedade, muito antes de ser um atributo da maldade humana, é uma questão de sobrevivência. E em épocas remotas, liderar gerava privilégios, como hoje, e gerava encargos pesados. Um nobre poderia ter muitos servos, mas o fato de se arriscar numa batalha com bravura por causa de uma mísera aldeia fazia-o amado pela comunidade. Ninguém entenderá a lealdade familiar que um camponês tinha pelo nobre, se não entendermos o que movia esses valores e sentimentos. Isso está muito além de ideologias, como muitos adoram reverberar. Eram verdadeiras alianças políticas e sentimentais, muito próximas entre si. Soaria incompreensível para um socialista militante entender por que em plena revolução francesa, (o prenúncio de tantas tragédias do igualitarismo), uma legião furiosa de camponeses se rebelou pelos seus nobres na região de Vendéia.
Interessante nessa visão é a condenação total do passado, em nome de um futuro hipotético. Vemos isso nas comemorações dos 500 anos do descobrimento do Brasil, em que os mesmos grupos igualitários radicais e marxistas simplesmente condenaram a existência do Brasil. A ignorância histórica chega a tal comicidade, que precisam odiar até o que são, já que nunca entenderam história. A interpretação tendenciosa que se alimentaram, sempre no culto fanático de um igualitarismo hipotético, cegou-os da realidade mais elementar. O marxismo chega a ser um ópio para certos indivíduos. Ou quem sabe alguma seita messiânica.
Para entender tudo isso, é preciso, acima de tudo, salvar o sujeito histórico. E isto está fora da compreensão de muita gente, já que uma boa parte delas está envenenada por esse tipo de interpretação errônea e absurda, que rouba esvazia de sentido a história mesma, por projeções sistêmicas irreais. Se qualquer cidadão é incapaz de entender os dramas e os dilemas de uma época, o porquê de tais pessoas pensarem daquele jeito, o que motivava aquelas pessoas, as crenças, os mitos, as práticas cotidianas, as instituições, a maneira de ver as coisas do mundo, este cidadão jamais entenderá história. E a história é, infelizmente, um conhecimento de poucos, ainda que muitos digam que lêem.
Isto não nega o fato de que a história deva ter comparações e juízos de valor. Porém, é humanamente absurdo relativizar todo o passado e absolutizar totalmente o presente. O presente está dentro de um processo histórico e se ele pode ser comparar, ele também pode ser comparado em suas falhas. E fazendo uma comparação entre a análise da história, perdemos muito no momento presente, ao negar o sujeito, os valores, as suas criações, a ação fantástica de indivíduos, reduzindo a explicações simplistas e desagradáveis do tipo do materialismo histórico, que em muitos aspectos, não passa de uma falsificação grosseira da história. Comparar o passado e o presente e tirar os prós e contras de uma idéia são alguns dos grandes e eternos desafios dos historiadores.
E devemos abandonar de vez essa ideologia pseudo-científica do igualitarismo, no caso, o marxismo e outras ideologias sistêmicas similares. A história não tem destino e finalidade alguma e é totalmente assistêmica. Não sabemos de onde viemos, nem para onde vamos e isso é um dos grandes mistérios da Criação, na melhor das crenças judaico-cristãs. E o fato de a história não haver futuro determinado, prova que muitas questões históricas pendentes estão em nossas mãos. O fato de o futuro não está previsto, é a nossa prova cabal de liberdade de ação. Foram os atos humanos que criaram o passado e vão criar uma boa parte que está para o futuro. O homem é senhor dos seus atos. E como dizia Cícero, a história é a mestra da vida.
Leonard0 Bruno