sábado, dezembro 08, 2007

O que está em jogo na Venezuela?

A surpreendente vitória da oposição venezuelana no plebiscito, que daria plenos poderes de autocrata a Hugo Chavez, revela algo que muitos articulistas são incapazes de observar. Diz respeito à agonia que as democracias latino-americanas estão sofrendo no continente e a disputa de forças políticas malignas de cunho totalitário, que almejam varrer o sistema de liberdades democráticas vigente no continente. Se há um país que reflete esse paradoxo entre civilização e barbárie, liberdade e tirania, democracia a totalitarismo, é a Venezuela. O país é um palco das disputas políticas, em pequena escala, de muitas coisas que poderão ser determinantes na América Latina. É interessante notar que a disputa no país não foi algo necessariamente nacional. Os venezuelanos não estavam sozinhos. Os defensores sinceros da democracia no continente e no mundo, rivalizando com os apologistas do totalitarismo, torceram fielmente para a derrota de Hugo Chavez nas urnas. E os inimigos da liberdade, frustrados com a tentativa de golpe, inventaram mil e uma desculpas, mil e umas mentiras, para invalidar a vitória da oposição.

Todavia, há uma pequena diferença entre os totalitários e os democratas: os movimentos revolucionários que desejam destruir as democracias estão mais organizados do que nunca. Eles têm perfeita idéia de como arruinar os sistemas que tanto odeiam e da luta desigual que existe entre eles e o resto. Não se está falando de um movimento político qualquer. Os grupos que participam desse processo corrosivo de tirania são psicopatas, no sentido clínico da palavra. Há um histórico de violência e terror da parte deles. Eles usam de todos os métodos possíveis para chegar ao poder. Do crime organizado, passando pelo terrorismo e mesmo usando dos expedientes legais da democracia para destruí-la, é um inimigo que joga sujo, não tem padrões morais para sua disputa. Já os apologistas das democracias estão desarticulados, desorganizados. Pois, ainda que não simpatizem com o chavismo, muitos ainda não percebem a extensão e o perigo que representam essas forças destrutivas e anti-libertárias. Muita gente crê que os desmandos que ocorrem na Venezuela são fatos isolados, particulares daquele país. Essas pessoas acreditam que o mesmo princípio se aplica à Bolívia. Nada mais falso. Tudo é uma ação bem articulada, coordenada, em escala continental. O Foro de São Paulo, o corpo da besta, é um espectro invisível que ameaça o continente.

Há outra questão que se revela no cenário político continental: uma nova crise das democracias. A ascensão da esquerda totalitária na América Latina demonstra um grande vácuo que existe nos procedimentos liberais democráticos: deles sobraram apenas seu aspecto formal, sem uma escala definida de valores fundamentais para a sociedade política. Em nações moralmente fragilizadas, as garantias constitucionais do liberalismo político não são suficientes. Que a democracia liberal seja moralmente nobre, no seu zelo humanitário de respeito aos direitos individuais, isso é inegável. No entanto, o liberalismo clássico foi fundado dentro de uma época, cujos valores cristãos eram profundamente disseminados e arraigados. As noções de liberdades ocidentais são quase todas cristãs, no âmbito teológico da palavra. A visão sacralizada da vida, da liberdade e da propriedade não seria possível sem uma cultura ancestral religiosa que consagrasse esses valores. O esvaziamento do cristianismo na cultura ocidental foi uma das maiores tragédias espirituais da modernidade. Paradoxalmente, o liberalismo, em nome da liberdade de crença e religião, laicizou a moral, as opiniões, os costumes e excluiu as diretrizes históricas e culturais dos seus próprios valores, herdadas do cristianismo. Por mais positiva que seja a liberdade religiosa e moral, contudo, o subjetivismo radical desenvolvido nas sociedades liberais abriu espaço para o relativismo e, consequentemente, para a destruição dos princípios éticos das próprias democracias. A moralidade pretensamente laica se esvazia de sentido quando se distancia dos pressupostos que o geraram.

A idéia absolutista da soberania popular foi outro veneno que dizimou os princípios libertários da democracia liberal. Quando a Constituição Brasileira diz que todo poder emana do povo, ela implica dizer que o poder é fruto da vontade, dos ânimos, dos desmandos e mesmo dos caprichos populares, não de uma ordem de valores hierarquicamente constituída, e que harmoniza a vida social. Para os antigos, a ordem política é emanada de Deus, porque assim todas as sociedades políticas se organizam naturalmente, dentro de uma escala de valores absolutos de hierarquia. Os homens escolhem seus governantes, são responsáveis pelos seus atos; porém, existe uma natureza intrínseca da sociedade política que a torna harmônica em si mesma, ou seja, os dilemas da verdade e da justiça. Mesmo nos Dois Tratados Sobre o Governo Civil, escrito por John Locke, a idéia da soberania popular concebia limites nos desígnios divinos e do Direito Natural. Por princípio, o povo escolhia seu representante e sua sociedade política. Porém, essa escolha não era arbitrária, havia escalas valorativas para fazê-la.

Por outro lado, a idéia orgânica, institucional, hierárquica dos valores de uma sociedade política conjugava com uma ordem de direitos e deveres mútuos entre elites e o povo. Com o advento das massas, da bajulação dos desmandos do povo e mesmo da negação completa do cristianismo na sociedade política, a velha ordem hierárquica de valores que sustentava a sociedade liberal definhou. A liberdade, que constituía em uma relação equilibrada de direitos, deveres, responsabilidades morais e obrigações, tornou-se uma exigência ilimitada de caprichos espúrios. A limitação dos poderes, atribuições de um Estado de Direito, acabou se esvaziando, já que a essência moral de suas leis caiu na mera formalidade positivista. E o mais paradoxal: essa exigência maior de particularidades absurdas se correlacionou com a onipotência maior do Estado. Não é o Estado liberal aquele que atende pelo fator da maior número de suscetibilidades? Não é ele que deve “zelar” pelos mais absurdos desejos particulares, em nome dos direitos individuais? A exigência das massas tirânicas, estupefatas, provém dessa licenciosidade, dessa idéia de que todas as subjetividades podem ser acatadas, por mais que careçam de dilemas morais. Quando elas são organizadas em torno de projetos demagógicos, a liberdade é ameaçada na sua essência. Porque na prática, a liberdade é uma ação moral.

A liberdade sem referências nas sociedades liberais pode ser usada para destruir as instituições democráticas. A liberdade, inclusive, pode destruir a liberdade. A história do século XX é cheia de exemplos trágicos. O nazismo destruiu a república de Weimar, explorando todos os aspectos liberais da democracia. As “democracias populares” do Leste Europeu, impostas pelo Partido Comunista, obedeceram às mesmas formalidades eleitorais. A democracia liberal, em nome da vontade popular, ou mesmo os caprichos do indivíduo, se permite acatar até os sentimentos de Hitler ou de Stalin. Ela pode, involuntariamente, dar poderes aos inimigos da liberdade. E o que ocorreu na Venezuela, em um absurdo plebiscito, cuja pauta era simplesmente fazer sumir, por meios democráticos, as liberdades civis e políticas do país, é um exemplo mais recente disso.

Todavia, essa doença moral das sociedades políticas modernas não é um evento isolado. A Europa atual e mesmo os Eua repetem o mesmo processo. Quando uma democracia se permite votar a favor do aborto, da eutanásia, do casamento gay, ou mesmo pela destruição da democracia, como no caso venezuelano, os valores essenciais que preservam a legitimidade das instituições democráticas estão sendo destruídos. A vida, a família, a propriedade e a liberdade mesma perdem sua sacralidade, seu valor, sua referência. E as instituições que fundamentam esses valores, em sua expressão concreta na realidade política, também são desacatadas. Tornam-se apenas formalidades do Estado laico, dos legisladores, transformando-os numa espécie de engenheiros sociais absolutistas.


Portanto, não basta a formalidade estatal ser liberal democrática, tampouco o zelo individual para isso, ao preservar a liberdade na democracia. Deve haver uma escala de valores conservadores, cristianizados, transcendentais, que não somente zelem pelas liberdades no sistema democrático, como a orientem em vistas da justa e reta razão. A liberdade deve ser indisponível, irrenunciável, dada pelos céus. Deve ser dimensionada dentro da ordem de valores moralmente coerentes e harmônicos. Dentro de uma ordem que a própria Cristandade se encarregou de consolidar, através da Revelação e da Tradição.

Os movimentos esquerdistas totalitários na América Latina souberam tirar proveito do vazio moral das democracias. Eles mesmos roubaram os pressupostos morais e éticos cristãos, dentro de uma visão laicizada de cultura. Agem em nome da justiça, da piedade aos pobres, da liberdade, da igualdade, ainda que para isso, seus métodos sejam totalmente opostos a seus fins. As suas ações parasitam valores autênticos que desejam destruir.


A crise na Venezuela é um alerta para toda a América Latina. Os conflitos que se manifestam naquele país não somente ameaçam os valores democráticos. Ameaçam os valores elementares da moral, da ética, da honestidade, da propriedade, da família, enfim, da vida e da liberdade, que dignificam o homem como ser humano. Não há como se iludir com os aspectos formais da democracia, quando sua escala essencial de valores está sendo negada. Os inimigos da liberdade, mais do que nunca, se utilizam dos valores democráticos para destruir a democracia. A liberdade de que eles desfrutam é uma arma contra a autêntica liberdade. E vão usar da ignorância do povo para torná-lo servo. Na América Latina e, em específico, na Venezuela, a civilização livre, cristã e autenticamente democrática luta, agonizante, contra a barbárie do totalitarismo chavista, do totalitarismo comunista ateu que promete reduzir o mundo a pó. É hora do continente despertar para evitar o abismo! Nós, latino-americanos, estamos no mesmo barco. . .o que está em jogo na Venezuela é todo o continente!

2 comentários:

Otavio Macedo disse...

Excelente texto! Você poderia comentar um pouco mais sobre a "velha ordem hierárquica de valores"?

Anônimo disse...

Venezuela um exemplo de democracia!!!!!!
Foi de dar inveja, uma reforma que o governo tendo ampla maioria parlamentar propôs, sendo literalmente rejeitada pela população e pronto!!! Cadê a semiditadura que os lustras botas do imperialismo da Veja-Rede Globo pregavam que seria, o que eles já classificavam como regime Chavista!!!??? Lógico que eles vieram com seus serviçais analistas, escolhido a dedo no que há de mais puxa saco em cada especialidade, os seus puxa especialistas, escolhido entre profissionais mercantis da saúde e educação, cineastas fracassados e toda a sorte profissional frustrados e por isto mesmo dispostos a se vender por qualquer tostão!!!! Os puxas especialistas já viram na fala de Chavez, falando por hora não deu para fazer as reformas, não como qualquer pessoa que luta por uma idéia rejeitada pela maioria, mas como uma tentativa de não aceitar o resultado!!! Chega às raias do ridículo, pois toda a verdadeira sorte de ilações idiotas que foi feita, não consegue esconder que Chavez, apenas afirmou que a luta continuava!!! Só isto!!!! Perdemos agora, nossos irmãos rejeitaram nossa proposta, vamos lutar para que lá na frente eles aceitem!!!!

Está em moda em nossos puxa especialistas, a forma plebiscitária, direta e eficaz da democracia na Venezuela comparações com o regime nazi-fascista!!!??? Meus hipócritas puxa-especialistas se esquecem de dizer, que como desculpa para a inexistência de parlamento, o representante da população, é que de vez em quando os nazistas faziam consultas, o que é absolutamente diferente do que acontece na Venezuela!!! Lá é tão democrático, que não só se UTILIZA os representantes da população no parlamento, como em casos tão importante como matérias constitucionais, se consulta a PROPRIA POPULAÇÃO, através de plebiscito!!! Mandato popular tb, no meio dos mandatos do executivo, O POVO DECIDE, se são marcadas novas eleições ou o executivo exerce ele todo!!!! Chega a ser totalmente imbecil a comparação com os nazistas, que usava os plebiscitos como substituto do parlamento!!!

A maior prova do que falo foi este espetáculo de democracia na Venezuela, que aqui com distribuição de favores a deputados, se quebrou monopólios para que se pudessem doar nossas estatais, aumentou o tempo de contribuição e a idade para se aposentar, acabaram com a lei dos juros máximos de 12% a.a, a reeleição de FHC e etc e etc. Foi a pouca vergonha da reforma constitucional de FHC, feito na calada da noite, nos porões de Brasília sem que ninguém pudesse opinar!!! Duvido que se tivéssemos a democracia plena que a Venezuela tem, que as reformas de gabinete e contra o povo teria passado!!!! Aqui os porões decidem, lá é o povo soberanamente que decide seu destino!!!!

A nossa grande e golpista imprensa cada vez mais mostra a sua cara de serviçal do imperialismo estadunidense, que precisa denegrir os políticos nacionalistas e os movimentos populares que querem acabar com o puteiro que nosso país e América Latina se transformou para que os EUA Ganhem mais dinheiro!!!

A Veja-Rede Globo é uma mistura da revista do pato (Disney) com o grupo Time-Life!!! Nossos interesses como nação é totalmente diferente do patrão destas mídias!!! Por isto que elas tem que mentir, mentir, mentir desesperadamente!!!!