A discussão nos tribunais superiores do país sobre as pesquisas de células-tronco embrionárias e a sua recente liberalização revelou uma perspectiva moral e ética problemática, senão uma lacuna muito séria: a vida, na opinião dos senhores ministros do Supremo Tribunal Federal, é tão somente uma mera expressão formal, uma discussão da letra da lei, uma opinião prepotente de cientistas e juristas. Os elementos transcendentais que compõem o valor da vida humana foram completamente ignorados. Até porque, como dizem alguns juizes, o Estado é “laico” e as leis positivas estão acima das leis naturais e divinas.
Interessante observar que a “laicidade” nunca foi a carência de pressupostos religiosos. Laicidade é tão somente o inverso do poder eclesiástico, ou seja, o universo ou poder leigo. No entanto, esse poder leigo, quando determina o que é a vida e nega qualquer pressuposto ético acima de seus próprios julgamentos legais, está usurpando arbitrariamente um poder exercido por uma casta eclesiástica. Os juizes e cientistas agora se tornaram clericais, orientando o que é o bem ou o mal. Porém, eles vão além do clero regular. Os eclesiásticos cristãos, ao menos, seguem tão somente uma Verdade Revelada, que está acima deles; os juizes e os cientistas querem ser porta-vozes da verdade, ou mais, transformar as opiniões deles em algum foro de dogma ou divindade. Querem ser como deuses, conhecedores do bem e do mal.
Quando a religião católica e outras denominações cristãs são previamente discriminadas pelo Estado Laico, ninguém percebe, nem mesmo os católicos, que isso representa uma forma de exclusão, um golpe aos valores fundamentais desenvolvidos pela própria sociedade. O “direito à vida”, os “direitos humanos”, os “direitos individuais”, só existem, fundamentalmente, dentro de uma perspectiva teológica cristã, que foi arraigada, por milênios, pela Igreja Católica, na consciência do povo. A posição do Supremo e de certos cientistas e articulistas, a respeito da discussão sobre a vida humana, como também a disposição do Estado em rejeitar previamente a religião, implicam uma completa cisão entre a sociedade e o governo, entre povo e Estado. Se a maioria do povo é religiosa e cristã e o Estado combate duramente os valores cristãos fundamentais que regem a sociedade, que diabos de legitimidade há neste sistema de governo? Na prática, não vivemos no Estado laico, mas no Estado ateu. E a contradição de um Estado ateu é que ele se acha deus.
De forma bastante hipócrita, os defensores da liberação da pesquisa de células-tronco embrionárias falavam da “vitória” da vida e da ciência contra o obscurantismo religioso. Esses paladinos da ciência são os mesmos que, em nome da “liberdade” da mulher, defendem a liberalização do aborto. Não há evidências plausíveis que comprovem que as pesquisas de células-tronco embrionárias melhorem a vida dessas pessoas, salvo em opiniões futuristas e utópicas de alguns cientistas mal intencionados. Na verdade, a propaganda das células-tronco abre portas para o uso indiscriminado do ser humano como cobaia laboratorial. Tais campanhas, como tais exigências “científicas”, nada têm de científicas, propriamente ditas. Elas são ideológicas, uma vez que querem destruir todos os pressupostos morais de transcendência que a sociedade cultiva em relação à vida.
Os liberais, os marxistas e outros paladinos da sacrossanta cientificidade, estão conseguindo, aos poucos, destruir a escala de valores que sustenta a democracia. Estão destruindo-a nas raízes culturais, esvaziando-a de sentido lógico, transformando-a em mera formalidade legal, em mera papelada constitucional. Se a democracia permite legalizar o uso laboratorial de indivíduos como cobaias, não será muito longe a legalização do aborto e da eutanásia. E cada vez mais, a regra positiva que garante o direito à vida vai se esvaziar, até o ponto em que a sociedade viverá no mundo de náusea dos materialistas. As pessoas estão trocando a noção básica da sacralidade e transcendência divina de suas vidas pela idéia fajuta de que são compostos orgânicos descartáveis prontos para serem jogados na lata do lixo. Prontos para serem descartados pelo deus-cientista.
A “ciência” também é outro mito da modernidade. Ela agora serve de parâmetros absolutos para ditar comportamentos e juízos morais. Torna-se, por assim dizer, “mítica”, auto-explicativa de todo o comportamento humano. Não é por acaso que alguns cientistas querem reduzir toda a humanidade como próxima dos macacos. A ciência, tal como é compreendida, inclusive, quer determinar a moralidade dos sistemas políticos. Quando um juiz do Supremo reduz a discussão da vida humana num plano puramente “científico”, ele não está absorvendo o conceito da vida apenas num mero plano biológico; ele dita regras quanto a essa perspectiva. Ou seja, se os embriões podem ser jogados no lixo, é precisamente porque o ser humano só pode ser visto pela perspectiva utilitária da ciência. O problema é que até a perspectiva científica é falsa. Pouco se discutiu um dado essencial, que a ciência mesma já revelou: a vida começa pela concepção. Cara indivíduo gerado é único, insubstituivel, indivisível. Sua sacralidade está na sua individualidade mesma e, precisamente, por ser também uma criação espiritual. Essa espiritualidade é que nos difere dos animais, pelo fato de possuirmos atributos da consciência e da existência que nos fazem particulares. A ciência, dentro de uma predisposição puramente ideológica, nega tudo isso. O discurso científico, tal como é colocado, é pura ideologia, puro ataque à religião e aos costumes. E a discussão sobre as células-tronco no Supremo, não somente revelou um estrondoso preconceito por parte de alguns juizes, como a posição laicista de destruir os parâmetros da moral religiosa na vida jurídica. Se os juizes do Supremo Tribunal vivessem no começo do século XX, talvez seriam capazes de emitir algum acórdão oficializando a esterilização de débeis mentais ou mesmo a eliminação de pessoas consideradas racialmente "inferiores". Até então, era assim que o modismo científico ditava as regras a respeito da humanidade e das pessoas. Não é mera coincidencia que a ciência, como fundamento moral, gerou ideologias políticas perversas como o nazismo, ou mesmo o bolchevismo, nas suas crenças de engenharia social. E a escolha atual do Supremo não é diferente: os seres humanos agora são bestas de laboratório, tais como os débeis mentais e judeus torturados pelo nazismo. São como os camponeses ucranianos da época de Stálin, subjugados pela fome e pelo terror, em vistas do "socialismo científico".
Quando eu leio a Constituição, penso que aquilo é tão somente um pedaço de papel. A democracia formalizou de tal maneira o direito, que no final, as leis se esvaziam de conteúdo. Defender os "direitos humanos" é apenas questão de semântica. O vazio moral do direito é um fato que se consoliza na democracia, no Brasil e no mundo. E a marginalização e mesmo destruição da fé cristã no povo é um componente necessário para destruir os valores da vida humana. O direito, apenas na expressão positiva, é um sem nexo lógico, uma lei sem alma. E o Estado laico, no seu vácuo moral, é uma espécie de Estado-deus.
3 comentários:
"O direito, apenas na expressão positiva, é um sem nexo lógico, uma lei sem alma. E o Estado laico, no seu vácuo moral, é uma espécie de Estado-deus."
Perfeito! Os ministros esqueceram ou não fizeram questão de lembrar que muito ou quase tudo do Direito tem alicerces nos valores cristãos.
Há um excelente artigo do Percival Puggina no MSM que trata disso.
Artigo muito bom. Didático e objetivo. Parabéns!
Excelente,caro Conde!!!
PARABÉNS!!!
KIRK
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