segunda-feira, fevereiro 11, 2008

O ateísmo militante é burro!

Um aspecto que norteia o ateísmo militante, tanto em escala nacional, como mundial, é a completa ignorância a respeito dos fundamentos da religião ou mesmo um ódio irracional a ela. Em particular, o cristianismo é sua maior vítima. As calúnias, difamações, distorções e invencionices que esses sujeitos mal intencionados se utilizam para denegrir a fé cristã são incontáveis. Se por um lado há uma chuva de calúnias e desinformação, por outro, há uma disputa desonesta nos debates intelectuais em questão. Gente de baixa envergadura como Dawkins, Sam Harris, Hitchens e mesmo do nível de Rodrigo Constantino tem mais espaço na mídia do que qualquer religioso cristão. Na verdade, não há debate algum e sim a hegemonia dos ateus no discurso intelectual, censurando previamente qualquer discussão séria sobre assuntos religiosos. As universidades estão cheias dessas idéias ateístas. Toda a filosofia cristã medieval foi completamente ignorada em favor de intelectuais materialistas vulgares e miúdos querendo reinventar uma nova moral biônica e uma nova sociedade política utópica. A piada da nossa época é que a ausência de religião acaba por mitologizar novas crenças, tidas por dogmáticas. Em nome da “ciência”, da “razão”, da “moral”, da “ética”, se fala tanta asneira e se cultua tantas idéias idiotas, que é de se pensar se o mundo não retrocedeu, desde então. São os novos mitos querendo desfazer as velhas tradições. Na prática, a ausência do cristianismo na cultura intelectual moderna deixou um vácuo, ocupado por inúmeros profetas farsantes. E como não devia deixar de ser, muitas idéias das mais destrutivas do século XX se devem ao trabalho intelectual de estupidez do mundo acadêmico universitário.

O movimento ateu, além de anticristão, é paganista. Na mitologia materialista, a “Idade das Trevas” medieval roubou da civilização ocidental as tão avançadas conquistas culturais da época greco-romana. Não é por acaso que os materialistas adoram relembrar o trato com que os romanos abordavam sua religião estatal, da mesma forma que odeiam a mudança radical que o cristianismo fez na civilização européia. Se os materialistas se dizem herdeiros da tradição clássica, contudo, apropriam-se de conceitos arraigados no Cristianismo. Os liberais ateus falam de individualismo, liberdade e de tolerância; os comunistas falam da igualdade e da fraternidade. E, no entanto, eles atribuem esses valores ao mundo antigo, onde eles menos existiam. Liberdade, tolerância, individualismo, igualdade e fraternidade, só se encontram como conceitos superiores no cristianismo medieval, e, no mundo antigo, nas antiguidades judaicas. A dignidade do ser humano como atributo sagrado de Deus só existiu de fato para judeus e cristãos. Os gregos e os romanos, por mais que pudessem reconhecer os atributos universais do homem, na idéia do direito natural, isso nunca foi importante pra eles. O escravo era visto como abaixo dos animais; e os inimigos, no nível dos bárbaros.

Por mais paradoxal que pareça ser, foram os valores da Igreja que forjaram a idéia do indivíduo, o valor intrínseco da existência humana. Aliás, com a queda do Império Romano, foi a Igreja que combateu a escravidão no continente europeu. Ela empregou os primeiros arquétipos de trabalho livre nas suas terras, através do uso e arrendamento de propriedades aos camponeses. Sem contar que as mais sofisticadas técnicas de administração empresarial se deveram a ela. Mas a cultura católica não se restringiu a apenas isso. Por outro lado, a Igreja defendia o servo medieval dos abusos dos nobres. O escravo romano tinha status de “coisa”, de “bens”; o senhor poderia fazer o que quiser com ele. No direito medieval, o camponês servil era um ser passível de obrigações e direitos. Era uma “pessoa”. Os nobres tinham obrigações para com seus subalternos.


A igreja moldou a idéia da justiça, do direito, da família, da defesa da vida. Há outro aspecto interessante dessa revolução espiritual européia: o poder laico, tal como conhecemos, é uma reinvenção do mundo medieval. No mundo antigo, havia uma mistura das funções religiosas e políticas do governante. Muitos deles eram considerados verdadeiros deuses absolutistas. O único povo que compreendia a não-divinização do rei era o hebreu, na idéia sagrada de Iavé impondo leis eternas, universais e iguais para todos. Mesmo os gregos também compreendiam essas limitações. Só que o cristianismo sofisticou e radicalizou isso. Os governantes não somente eram humanos, limitados, cheios de vícios e erros, como competiam à sociedade e à Igreja fiscalizá-los. É claro que a concepção aristotélica influenciou bastante a percepção da política. Porém, ela não foi suficiente: a Igreja soube hierarquizar uma ordem de valores na sociedade. O rei ou o príncipe não é um fim em si mesmo. Ele está no poder já que cumpre um papel estipulado por Deus na hierarquia de valores, que regula a vida política. Pelo fato de ele ter o poder, ele tem deveres morais e éticos para o bom uso dele. A justiça não era um capricho de um rei ou do governo; era uma ordem natural e divina que se refletia na conduta social, nas instituições e na realidade dos indivíduos e que devia ser dimensionada pelo direito positivo. Mesmo o poder monárquico não era uma deliberação arbitrária. Ele se pautava no mérito do guerreiro, do homem que protegia a comunidade, a milícia pública que defendia os povoados dos inimigos. Daí os direitos nobiliárquicos serem hereditários, porque os ditos e feitos eram heranças de família.

O poder leigo existe, separado da religião. Porém, um orienta o outro. E o poder espiritual, que direciona a ordem do universo e é mesmo a determinação do próprio Deus, organiza o poder leigo. E são poderes separados. A tese das “duas cidades”, a Cidade de Deus e a Cidade dos Homens, retrato da idéia agostiniana, influenciou profundamente a consciência política ocidental. Mal percebemos que essa definição do poder reflete na ojeriza saudável que o mundo ocidental, durante um bom tempo, teve pelos poderes absolutistas. Os poderes humanos são falhos e só uma justiça que independe dos fatores humanos é que pode ser alegada para coibir os abusos do poder. A idéia mesma de direitos e deveres, dentro de um conceito constitucional de valores é um princípio medieval. O parlamento, os conselhos consultivos de nobres, comuns e o rei, vieram da idéia de que os governos, por mais monárquicos que fossem, deviam ser colegiados. Ao contrário do que se pensa, o absolutismo monárquico foi fruto da modernidade e não do mundo medieval. Partiu do enfraquecimento da Igreja e do Parlamento e da centralização do poder real. A Igreja e a sociedade no parlamento eram os elementos constitutivos que limitavam o poder absolutista do rei. A Igreja foi surrupiada pela Reforma e os parlamentos enfraqueceram. O liberal é fruto do mundo medieval sem o saber. E tem gente que acha que o constitucionalismo moderno, com as cartas magnas, são frutos do século XVIII. A Magna Carta de 1215 não é um exemplo claro da contenção dos poderes do mundo medieval? A vida, a liberdade e a propriedade como valores supremos, vieram de onde?



A família romana era simplesmente despótica. O pater famílias tinha pleno direito de vida e morte sobre os filhos. Não era incomum o pai jogar seu filho na lata do lixo. O infanticídio era permitido. A pedofilia era tolerada, senão aceita. E a Igreja combateu duramente essas práticas. Condenou energicamente o infanticídio e a pedofilia. Transformou a família romana, em particular, e a européia, em geral, numa relação genuína de solidariedade e de amor. Os reis antigos matavam pais, filhos e mesmo irmãos, pela disputa de tronos. No mundo medieval isso era um sacrilégio. Na verdade, a família era uma das instituições mais importante do homem medieval, junto com a Igreja. Os homens medievais tinham laços profundos de solidariedade, através das relações familiares, das associações de oficio, das castas sociais. Mesmo a Igreja era um laço de unidade social naquele mundo turbulento. O cristianismo era uma linguagem comum.

Os ateus idiotas costumam dizer que a Igreja Católica sonhava em dominar o mundo e, de fato, impôs um sistema teocrático no mundo medieval. Quem diz isso é um completo ignorante, um analfabeto histórico. A Igreja Católica medieval estava longe de ser um sistema religioso totalitário. Ela nunca negou as instituições, antes as educou e a fortaleceu, ainda que às custas de seus próprios interesses. Na verdade, a sabedoria da Igreja em absorver a noção aristotélica da política fez dela uma instituição muito pragmática na abordagem política. O sonho dela não era governar sozinha, mas reerguer o velho império romano. Ela bem que tentou, quando se libertou das garras de Constantinopla e quis ressurgir um novo império, o Romano-Germânico, sem, contudo, perder sua independência política. No entanto, como este sonho era impossível, ela aceitou perfeitamente os governos dos príncipes. Coexistia com eles. Ela mesma reconhecia um espaço político que não interferia. Mesmo no auge do poder papal no mundo medieval, ela nunca destruiu este espaço, antes a destacou cada vez mais. Os valores cristãos, dentro de nossa sociedade atual, foram apenas laicizados sem serem abandonados.

Todavia, parece que o movimento ateísta e pagão quer ressuscitar o mundo antigo, no que havia de pior nele. Não é por acaso que eles aderem alegremente a ideologias espúrias e causas odiosas. A legalização do aborto tem o mesmo sentido do pater famílias romano em matar seu nascituro. Contudo, o pater famílias agora é feminista, a mulher se acha no direito de matar seu filho. É o “mater familias”. A eutanásia e a eugenia, tão praticadas entre os espartanos, são apoiadas pelos militantes materialistas como uma expressão mesma da caridade humana. Os defeituosos e os enfermos não têm o direito de existir. Como eles são supostamente infelizes, e os eugenistas se acham no direito de determinar o que é felicidade para os outros, envenenem os velhos e executem os débeis mentais. Não nos assustemos quando um pseudo-filósofo como Peter Singer acha perfeitamente válido defender o direito dos animais, quando apóia o aborto e a eutanásia contra idosos e aleijados, tudo em nome de abrandar o sofrimento humano. Ele pensa tanto quanto um senhor pensaria de seu cavalo e seu escravo. O cavalo é mais importante. E o que dizer da família biônica deles? Homens se casam com homens, mulheres se casam com mulheres, enfim, uma família sem referência moral alguma. Tudo em nome da liberdade, claro!

Um autor menor como Rodrigo Constantino condena a religião porque ela é “coletivista”, nega a liberdade individual. Sam Harris diz que a religião tolhe a “civilização global” (sabe-se lá o que é isso?). E Dawkins e Hitchens soltam um bocado de impropérios ao cristianismo, com a “gaia ciência” que promete explicar toda a sorte de infelicidades do universo. Não adianta alguém defender pontos de vista religiosos pela lógica ou pela razão. Independentemente do que se defenda, já é tachado de “fanático religioso”. Todos eles negam o “coletivismo religioso”, em favor do coletivismo dos ateus. Os religiosos até podem adorar a Deus. Só que devem ficarem calados em suas casas, porque só o ateísmo deve ser público e estatal. Os católicos, judeus, protestantes e outros devem relativizar suas crenças, pelas crenças atéias absolutistas de Rodrigo Constantino, Dawkins, Harris e Hitchens. É muita areiazinha para o caminhãozinho deles. . .

Quais teorias morais biônicas estes estrupícios nos oferecem? Rodrigo Constantino dissemina a idéia do tal “egoísmo racional”. Seguindo a seita da Ayn Rand, uma filósofa de segunda categoria, ele nos diz condenar o altruísmo, que é e negação da individualidade. E claro, não é por acaso que a vítima cabal desse ódio é o próprio Cristianismo, que nos exorta a amar o próximo como a si mesmo. Porém, Constantino é a versão caricatural da “filosofia” de Ayn Rand: é a paródia de um moleque egocêntrico, que ele é incapaz de conceber o ridículo de suas exposições. Que diabos de história é essa de o egoísmo ser “racional”? Desde quando um sentimento instintivo pode ser racional? Para ele, as relações interpessoais só existem porque há um interesse implícito nisso, ou seja, o egoísmo instintivo que é também “racional”. Ou seja, se Constantino não racionalizar interesse algum em um esfomeado que pede um pedaço de pão à sua casa, deixará o pobre coitado morrer de fome. Por mais que a humanidade tenha inclinações egoístas, elas não são essencialmente o determinante da espécie humana. Porém, talvez Constantino nos dê a pérola de Dawkins: o gene egoísta, o gene egoísta! Acreditem, esses biólogos acreditam que até os genes têm sentimentos. . .O gene humano pode ser egoísta, tanto como deve sentir amor; deve sentir raiva também e fazer cálculos matemáticos. Se você, caro leitor, acreditava que era o cérebro que desenvolvia sua mente, mude de idéia. É o “gene” que determina. Dawkins dixit!

É curioso pensar que estes sujeitos reverberam o autoritarismo implícito da religião, quando nos impõem uma forma de moralidade que é, no mínimo, perigosa. Os idiotas do ateísmo nos dizem algo quando defendem o aborto: o Estado é laico e a moralidade religiosa não deve intervir. Eles pensam justamente como uma boa parte do mundo antigo pensava. O Estado é, antes de tudo, uma forma de Estado-deus. Rodrigo Constantino, o pseudo-liberal, mal percebe a perversidade do seu argumento. Quando ele nega que haja um aspecto transcendental na justiça, no direito e mesmo na ordem dos valores, só resta mesmo o Estado que tanto diz condenar determinar tudo. Na verdade, o laicismo esconde uma espécie de religiãozinha laica. É uma seita, no amplo sentido da palavra. E gente como Constantino, Dawkins, Harris, Hitchens, Singer, e outras demais porcarias, querem ser os profetas da nova era. Querem nos ditar moralidade e impor explicações mitológicas para o mundo. E eles têm um dogma, que eles chamam de “ciência”. E onde estará sua igrejinha? Na “civilização global” da Onu? No antro das academias universitárias? No Estado “Laico”? Vai saber! Isso é tudo bezerro de ouro. Deparo-me com a bíblia, no Gênesis, que diz: “-Sereis como deuses”! E como tais, do pó vieram e do pó retornarão. Eis a condição de nossos ateus. Como são burros, meu Deus!

27 comentários:

Anônimo disse...

Caro Conde,E-X-C-E-L-E-N-T-E!!!

Um abraço!

KIRK (Porto Alegre-RS)

Anônimo disse...

Burro é o fanatismo religioso.


Sempre vem com o papo:´´disso é pecado aquilo é pecado´´
O Vaticano, o Estado mais rico do mundo, tinha como aliado o Mussolini.
Como uma instituição que na teoria´salva vidas´´ foi patrocinada por um totalitarista
Que tirou milhões de vidas.
Que contradição é essa, dessa instituição rica que presa pela igualdade e acumula seus
bens, enquanto milhões de pessoas não tem as mínimas condições humanas, cadê as ações humanas no Chade, Serra Leoa e em milhões de países que as pessoas brigam por água, comida.
Acreditar em uma instituição que queimou pessoas vivas porque tinha outro pensamento.
Hoje essa instituição não mata hoje as pessoas a base de torturas, mas de alguma forma mata as pessoas de um modo bem frio acabando com o ´´pensamento livre´´ porque tudo é pecado
E eu de uma maneira esses tempos mudei meu pensamento.
Essa instituição é tão repulsiva quanto o nazismo.
Eu não acredito nessa instituição que matou pessoas e idéias
Não sou católico praticante, que coisa mais ridícula. Se você faz parte de uma instituição ou religião, você no mínimo tem que freqüentar ou melhor por em pratica o que você aprendeu.
Imagine um médico não praticante, um advogado não praticante, um carteiro não praticante.

Zeitgeist I - A maior história de Todas [Parte 1]

http://www.youtube.com/watch?v=CZ8naJjapek&feature=related

Zeitgeist I - A maior história de Todas [Parte 2]

http://www.youtube.com/watch?v=vLNpdi41API&feature=related

Zeitgeist I - A maior história de Todas [Parte 3]

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Unknown disse...

Conde

Concluo que esse pessoal tem pecado muito e renegam Deus para aliviar sua consciência e conseguir sobreviver.

Peco muito, mas isso não me tira a certeza da existência divina e sei que vou ser cobrada por isso.

Conde Loppeux de la Villanueva disse...

Burro é o fanatismo religioso.

Conde-Burro é qualquer forma de fanatismo, seja ele religioso ou não. Burro!


Sempre vem com o papo:´´disso é pecado aquilo é pecado´´

Conde-Onde foi que falei de pecado?


O Vaticano, o Estado mais rico do mundo, tinha como aliado o Mussolini.

Conde-Mais rico do que os Eua? Mais rico do que a Inglaterra? Putz! Quanto a Mussolini, a Igreja nunca aceitou o fascismo como doutrina política, antes assinou a Concordata, para recuperar seus territórios perdidos em 1870. O resto é balela.


Como uma instituição que na teoria´salva vidas´´ foi patrocinada por um totalitarista
Que tirou milhões de vidas.

Conde-Mussolini nunca patrocinou a Igreja Católica. Ele tão somente devolveu a soberania do Vaticano, roubada pelo Estado italiano, em 1870. E Mussolini não matou milhões, matou milhares.


Que contradição é essa, dessa instituição rica que presa pela igualdade e acumula seus
bens, enquanto milhões de pessoas não tem as mínimas condições humanas,

Conde-Qual o problema em se ter riqueza? Se vc é tão contra a riqueza assim, pq vc não doa aos pobres e vira pobre junto? A Igreja Católica é "rica", pq todo seu dinheiro é para sustentar instituições de caridade, escolas, hospitais, tudo para atender aos pobres. Como vc acha que ela pode ajudar o mundo sendo pobre, seu burro? A Igreja Católica tem dinheiro (e não é muita coisa, comparada a instituições mais ricas do que ela), tão somente para sustentar suas estruturas, que são mundiais, como as instituições de caridade que salvam tb outros milhões da miséria. Vc é intelectualmente primário, pra dizer o mínimo.

cadê as ações humanas no Chade, Serra Leoa e em milhões de países que as pessoas brigam por água, comida.

Conde-Vc sabe quantas instituições a Igreja Católica sustenta no mundo, pra vc falar essa besteira? Quantos missionários católicos existem na África, sustentando escolas, hospitais e demais instituições de caridade? Na sua cabecita primária e oca, basta entregar tudo aos pobres e tudo estará resolvido. Se a Igreja fizer isso, ela não ajuda ninguém, pq os pobres vão consumir tudo e no dia seguinte vão morrer de fome. Ela precisa de instituições para que a ajuda seja permanente. Uma obviedade que um tolo revoltado como vc é incapaz de analisar.


Acreditar em uma instituição que queimou pessoas vivas porque tinha outro pensamento.

Conde-Primeiramente, a Igreja não queimava pessoas, mas sim as instituições civis da época moderna. Ela tão somente identificava os crimes de heresia, que eram costumes não somente daquela época, como de praticamente todas as religiões da época. A Igreja seria diferente das limitações dos cidadãos que viveram outras realidades? A Igreja fez muito mais a humanidade do que os seus pecados. Vc precisa ler mais a história da Igreja, ao invés de falar bobagens primárias.


Hoje essa instituição não mata hoje as pessoas a base de torturas, mas de alguma forma mata as pessoas de um modo bem frio acabando com o ´´pensamento livre´´ porque tudo é pecado

Conde-Vc ignora a doutrina da Igreja e mesmo a idéia do pecado. Quer dizer que a Igreja não pode condenar o pecado? Se vc mata, rouba, estupra, engana terceiros, adultera, blasfema, a igreja não pode condenar seus delitos morais, jurídicos e éticos, pq vc se acha acima do bem e do mal? Por outro lado, por mais que a Igreja tenha tomado direções equivocadas no quesito da liberdade de consciência, ela defende sim a liberdade individual de escolha e de pensamento.


E eu de uma maneira esses tempos mudei meu pensamento.

Conde-Como se seu pensamento valesse alguma coisa. . .


Essa instituição é tão repulsiva quanto o nazismo.

Conde-Vc quer colocar no mesmo plano uma instituição (igreja) que salvou milhares de judeus do nazismo, com o próprio nazismo? Realmente estamos vendo o tipo de idiota primário que vc é. . .

Eu não acredito nessa instituição que matou pessoas e idéias
Não sou católico praticante, que coisa mais ridícula.

Conde-Não, vc é um idiota praticante, o que é pior. . .aliás, ninguém vai perder tempo com o que vc crê ou não crê. O que vc acredita é literalmente irrelevante.

Se você faz parte de uma instituição ou religião, você no mínimo tem que freqüentar ou melhor por em pratica o que você aprendeu.


Conde-E tento fazer, na medida do possível. E vc? Já percebeu que só fala besteira? O que vc tem de melhor para oferecer à inteligência?


Imagine um médico não praticante, um advogado não praticante, um carteiro não praticante.

Conde-Catolicismo não é profissão, é voto de fé. Vai estudar, moleque burro!

Anônimo disse...

Esse comentário anônimo é típico do estúpido ranço anti-religioso que se tornou caraterística destes tempos.

A imbecilidade é tamanha que o estúpido não pensa duas vezes antes de proferir asneiras e zurrar os velhos bordões - Inquisição e fogueiras, Igreja "contra" ciência, a enorme (sic) riqueza do Vaticano. Afirmar, por exemplo, que o Vaticano é o Estado mais rico do mundo sugere um déficit intelectual que, como disse no início, é típico dessas alimárias.

Mas o cerne da imbecilidade do comentário é a liberdade de pensamento, que segundo esse anônimo - pessoa muito dada ao pensamento livre, como achincalhar a Igreja - esta estaria destruindo nestes adoráveis tempos pós-modernos.

Vamos tentar entender a mente doentia desse estúpido. A Igreja estaria matando o pensamento livre

- ao não ter espaço nos grandes meios de comunicação para manifestar LIVREMENTE o seu pensamento sem ser achincalhada de "obscurantista", "medieval", "inquisirora", "inimiga do progresso científico"?

- ao ser maquiavelicamente abordada por uma mídia franca e majoritariamente hostil à religião, de que são bons exemplos revistinhas tipo Veja, IstoÉ, Época, Superinteressante, Carta Capital ou jornais na linha da Folha de São Paulo?

- ao ter a sua história torcida e distorcida por imbecis anacrônicos que hiberbolizam esse passado na ânsia de forjar uma realidade monstruosa e torpe no presente?

- ao ser comparada estupidamente com um regime que tinha como meta aniquilar sua ação em curto prazo e exterminá-la em médio prazo? Se indigentes mentais como esse anônimo lessem UM MÍNIMO da história do nazismo (pouco possível para eles), com UM MÍNIMO de isenção (aí é totalmente impossível) teriam que concordar com a declaração do físico Albert Einstein, de que a Igreja Católica foi a única instituição que confrontou os nazistas, antes da deflagação da guerra. Ou entenderiam, quiçá, o porquê do Papa Pio XII receber uma comenda do Estado de Israel por sua inestimável ajuda aos judeus.

Realmente, que Igreja "perseguidora" essa. É de conferir, pessoas tão abalizadas (...) como o anônimo defenderem o pensamento livre protestando contra a liberdade da Igreja para dizer o que é e o que não é pecado. Que coisa insuportável a Igreja pensando livremente, não é anônimo?

E já que você não acredita na instituição que "matou pessoas e idéias", inclua nesse rol a HUMANIDADE inteira, com os Estados comunistas ateus anti-religiosos em primeiríssimo lugar. Ou você acha que um perseguidor e assassino de religiosos como Pot Pol foi um defensor da liberdade de pensamento? Vai ver que você acha isso mesmo, na sua mediocridade.

Vai morar na Coréia do Norte, então. Lá você viverá num verdadeiro paraíso anti-religioso, com os seus pares. Pode ter certeza que naquele "maravilhoso" país, a Igreja Católica não está "acabando com o pensamento livre", antes o contrário, bem muito contrário.

Anônimo disse...

> Nessas horas eu falo que é melhor uma verdade que te faça chorar do que uma mentira que te faça sorrir

Com certeza.

Eu era daquelas que a avó levava na Igreja. Depois cresci e comecei a ler sobre a história da humanidade.

O Vaticano tem riqueza suficiente pra tirar muito país, ex-colônias de países católicos, da merda.

Sabe, eu não sigo nenhuma religião.

Aquele papo de ajudar o próximo, deixar de lado as coisas materiais, que Jesus era uma pessoa simples. Aí entro em verdadeiros palácios, decorados com ouro, e penso: Jesus está aprovando essa riqueza toda concentrada nas mãos de alguns? Acho que não.

Não, esta riqueza não pertence ao povo, e não pertence a Deus. Está concentrada num único lugar.

Eu acredito em Deus, não nos homens. E pra acreditar em Deus não é preciso seguir religiões. Apesar seguir o coração.

> Vc quer colocar no mesmo plano uma instituição (igreja) que salvou milhares de judeus do nazismo, com o próprio nazismo? Realmente estamos vendo o tipo de idiota primário que vc é. . .

É, e os judeus torturados durante a Inquisição na Espanha, só pq não queriam se converter ao catolicismo?

Todas as religiões tentam esconder seus próprios erros.

Rei-Soldado disse...

Off.


Premiei o teu blog! Considero-o uns dos melhores que eu costumo ler. Abraços

Anônimo disse...

Esse anônimo...
Só sabe repetir chavões e mais nada.
Fale também que a Igreja dizia que negros não tinham alma. Só faltou essa.

Vai um texto aí sobre a inquisição (é um pouquinho grande):


Não deve o católico envergonhar-se de sua história, que é bela, que é grandiosa. Não deve ceder em face dos ataques dos que, ignorando de todo a nossa história, repetem e propagam "lendas negras", criadas com o fim declarado de subverter nossa Fé e nosso amor à Santa Madre Igreja.



Não deve deixar-se confundir ao ver, como ocorreu recentemente -- para o nosso estupor e tristeza -- os mais altos membros do clero, o próprio Papa, prostarem-se em pedidos de perdão pelos "erros da inquisição", dando ao mundo apóstata mais essa satisfação e dando crédito a tantas calúnias e imposturas que circulam contra a Igreja.



Vários santos foram grandes inquisidores: S. João Capistrano, S. Domingos e S. Pio V, para citarmos apenas alguns. É a inquisição intrinsecamente má? O que é verdadeiro e o que é falso em tudo o que se tem dito a seu respeito? O texto abaixo, extraído do manual de Apologética do Pe. W. Devivier, recomendado nada mais nada menos por S. Pio X, responde a todas estas perguntas.







A HISTÓRIA DA INQUISIÇÃO





RECOMENDAÇÃO DE SS. S. PIO X



quando Patriarca de Veneza

ao editor da tradução italiana desta obra





Muito me honra o seu pedido de eu juntar minha humilde voz a dos eminentes Prelados, que louvaram o Curso d’Apologética Cristã do P. W. Devivier.



Tal é, na verdade, o mérito desta obra que, onde quer que for conhecida será procurada pelos sacerdotes para relembrar as verdades aprendidas no seu curso dogmático. Eles a espalharão também nas famílias como resumo dessa teologia, que os leigos só podem estudar dum modo incompleto, mas que não podem ignorar para darem razão da sua fé a si e aos outros, defendendo-a contra as acusações suscitadas.



Aprovo, pois, o juízo favorável dado por tantos homens distintos e acho até o elogio do tradutor inferior à mesma obra. Também quisera vê-la nas mãos dos jovens e homens de toda a condição, e mesmo nas mãos das senhoras, pois elas às vezes deixam de, nesta época de negligência em matéria de instrução religiosa, aprofundar as coisas da fé, e vivem num estado de dúvida, produzido pelas objeções, que não sabem resolver.



Regozijando-me do bem que fazeis, preparando esta 2ª edição italiana, faço votos para que esta obra seja conhecida e dada como lembrança da 1ª comunhão, como prêmio nas casas de educação, como de leitura nas famílias cristãs. Tenho para mim, que todos os que a leram, dirão, ao Senhor, confirmados na verdade religiosa: “Vossos testemunhos são infinitamente dignos de fé”. (Ps. 92). Eles reconhecerão também quanta perfídia há em outros livros, por demais espalhados, inimigos da religião, e reduzirão ao silêncio, com nobre franqueza, os que em conversas particulares ousam caluniar a Igreja em algum ponto...



Mantua, 20 de abril de 1894.



***



ALGUMAS DAS ACUSAÇÕES QUE SE FAZEM CONTRA A IGREJA


Nunca a Igreja, santa em seu Fundador e sempre pura na sua doutrina e na sua moral, deixou de encaminhar os seus filhos para a prática das mais belas e até das mais heróicas virtudes. E, por isso, não obstante as fraquezas da humanidade e a grande força das paixões, jamais deixou de haver entre os católicos uma grande multidão de santos, de apóstolos, de mártires, de homens de grande e nobre caráter, incapazes de baixezas e prontos a levar a cabo obras da mais elevada perfeição e da mais sublime caridade.



Mas não deixa o cristão de ser um homem livre, e nem a graça do batismo, nem também a do sacerdócio aniquilam as propensões que o puxam para o mal. Mesmo no colégio apostólico houve quem atraiçoasse o divino Mestre. E no correr dos séculos houve sacerdotes, bispos e até Papas, que faltaram às obrigações do seu estado.



E o que se segue daí? Que é falsa a sua doutrina? Mas nunca a esta doutrina nem à Igreja docente foi jamais concedido o privilégio da impecabilidade. Que ela seja impotente para produzir os frutos de virtudes, que ela própria preconiza? Ainda nos tempos mais corruptos contou entre seus filhos santos eminentes que conseguiram reagir contra a corrupção dominante e reformar a sociedade.



Em lugar, porém, de admirarem estes prodígios de virtude, operados pela graça sobrenatural num sem número de almas, apesar da impetuosidade das paixões, dão-se os inimigos do catolicismo, com grande afã, a rebuscar, através dos séculos, os abusos e faltas, necessariamente inerentes à frágil natureza humana, para delas fazerem o grande cavalo de batalha na sua guerra contra a religião e para perpetuamente as estarem lançando em rosto à Igreja. Para esses homens não tem importância alguma a obra de regeneração social que ela efetuou: nem eles atentam na luta incessante que ela tem de sustentar contra tudo quanto se opõe à lei divina. Os crimes de alguns celerados, que receberam o batismo, são o grande arsenal para estes farejadores de escândalos. Rebatamos, pois, já que é necessário, as principais acusações, que eles obstinadamente se empenham em assacar à Igreja de Jesus Cristo.


***



A INQUISIÇÃO



Chama-se Inquisição uma instituição destinada a fazer averiguações sobre as heresias e as reprimi-las; e, assim definida, tomou no decorrer dos tempos as três formas seguintes:



A Inquisição episcopal, que existiu desde os primeiros tempos da Igreja e continua ainda existindo hoje em dia [Nota: o texto é anterior ao Concílio Vaticano II].



A Inquisição pontifical, instituída por Gregório IX, pelos anos de 1231, contra os cátaros.



A Inquisição espanhola, estabelecida em 1478 pelos reis católicos, Fernando e Isabel, e ratificada por Sixto IV, destinada a exercer a vigilância primeiramente sobre os judeus relapsos do século XV, e depois sobre os mouros do século seguinte, e mais tarde a defender os povos das doutrinas heréticas.



A Inquisição episcopal e a pontifical partem dos mesmos princípios e apresentam-se com os mesmos caracteres fundamentais, pelo que na nossa exposição as consideraremos como idênticas, sob a denominação comum de Inquisição eclesiástica.



Para a Inquisição espanhola reservamos um lugar especial, por ser uma instituição com um duplo aspecto, o civil e o eclesiástico; e por isso mesmo, de responsabilidades muito distintas.



I – Origem e natureza da Inquisição eclesiástica.



A. NOTÍCIA HISTÓRICA



Durante toda a sua existência se considerou a Igreja obrigada a combater a heresia; e foi naturalmente aos bispos, encarregados de olharem pelo tesouro da fé, que ficou confiada esta missão de vigilância e das salutares admoestações, e, sendo necessário, de usar de repressão.



Nos começos do cristianismo eram as penas espirituais as que se empregavam, e especialmente a excomunhão; e bem duras eram, como é sabido, as penitências a que os excomungados se sujeitavam para alcançarem a reconciliação com a Igreja.



Da legislação civil é que depois vieram as penalidades temporais, aplicadas contra os hereges. Apenas se firmou a paz com a Igreja, começaram logo os imperadores cristãos a impor pelos seus códigos penas severas contra as heresias, equiparadas aos crimes de lesa majestade; e mais de uma vez chegaram os juízes imperiais a punir com a pena de morte os maniqueus, os donatistas e os prescillianistas. Não eram estes castigos pedidos pelos chefes da Igreja; e a maioria dos S. Padres, entre outros Santo Ambrósio, S. João Crisóstomo e S. Martinho, mostravam-se-lhes abertamente adversos. E Santo Agostinho, que ao princípio não queria contra os hereges senão as penas espirituais, mudou depois de parecer, ao reparar nas grandes desordens praticadas pelos donatistas na África, e admitia que se usasse com eles a luta comedida, por meio de multas contra os hereges vulgares e do exílio contra os cabeças; mas protestou sempre contra a pena de morte, aplicada aos hereges. E foi este o sentir que adotaram a maioria dos Papas do Ocidente.



Também os bárbaros, depois que se converteram, consideraram a heresia como um crime social, que devia ser, como os demais, punido pela autoridade civil; e assim, já muito entrada a Idade Média, não foram poucos os casos de hereges castigados pelos juízes civis com penas temporais, e até com pena de morte, depois de condenados pelos tribunais dos bispos. E por vezes nem o povo esperava pela condenação em regra, senão que se apoderava do delinqüente e lhe dava a morte; e os bispos, que geralmente seguiam o pensar de Santo Agostinho, protestavam contra tais violências e quanto possível as impediam.



Por fins do século XII começou a heresia dos cátaros a propagar-se com uma rapidez tão assustadora, que não só punha em risco a fé dos povos, mas também a ordem social constituída, o que obrigava os chefes da Igreja a, de combinação com os príncipes cristãos, tomarem uma série de precauções contra aqueles hereges, muito mais severas. Reuniu-se em 1148 um sínodo em Verona, para o que intervieram o Papa Lúcio III e o imperador Frederico Barbaroxa; e nele se ordenou aos bispos que por si ou por outrem fizessem vistorias pelos lugares suspeitos; e as decisões de Verona foram confirmadas pelos concílios de Avinhão, de Montpellier, de Tolosa e, sobretudo, pelo concílio ecumênico de Latrão (1215). Havia em cada freguesia pessoas de confiança, encarregadas de vigiar e de denunciar ao tribunal do bispo os que eram suspeitos de heresia. E os hereges, que fossem convencidos e condenados de heresia por este tribunal, ficavam incursos em várias penas, que eram aplicadas pelos magistrados civis. Havia já por este tempo enviados especiais do Papa, encarregados de, coadjuvados pelos bispos, fazerem em determinadas regiões as devidas averiguações acerca da situação dos hereges; e entre eles distinguiu-se muito S. Domingos (1221); mas ainda a Inquisição se não apresenta sob a forma de uma instituição com organização própria; e é falso o dizer-se que S. Domingos fosse o primeiro dos inquisidores.



Não eram ainda estes meios dotados de suficiente eficácia. Muitos bispos, conjuntamente senhores temporais e chefes da Igreja, eram amigos ou aliados de famílias heréticas, sujeitas às pesquisas, e não tinham o zelo, que se requeria, ou não eram secundados pelos magistrados civis.



O Papa Gregório IX (1227 – 1241) é que, para atalhar a perversidade herética, fundou a Inquisição, com o título de Inquisitio hæreticæ pravitatis. O imperador Frederico II pouco se preocupava com os interesses da Igreja; mas como via os perigos das novas idéias anti-sociais e as desordens, com que os cátaros ameaçavam a paz dos seus estados, promulgou, a partir de 1220, uma série de constituições, que muito agravavam as penas pelo sínodo de Verona impostas aos hereges.



Era, porém, para temer que o poder civil tomasse o lugar do poder religioso em julgar pelos delitos que dependiam principalmente da alçada da Igreja, como eram os das heresias; e, para prevenir esta usurpação, tomou Gregório IX a dianteira; aprovou os estatutos imperiais e tratou de os pôr em prática nas cidades italianas. E para atalhar, sobretudo, qualquer ingerência dos magistrados civis nos processos de heresia e bem assim para acabar com a apatia dos empregados dos bispos, começou por enviar, a partir de 1231, a diversas regiões, um certo número dos seus delegados, Inquisitores hæreticæ pravitatis, os quais de certo se deviam entender com os bispos para o desempenho da sua missão, mas que no entanto recebiam diretamente do Papa a sua jurisdição e que podiam formar tribunais estranhos aos dos bispos. A sua alçada estendia-se não já, como a dos bispos, a uma diocese, mas a regiões inteiras, como a Provença, a Lombardia, etc. Os magistrados civis eram obrigados a usar da força para a execução das condenações, e podiam mesmo ser constrangidos por meio da excomunhão.



Foi então que, propriamente falando, a Inquisição começou a desempenhar o seu papel por meio dos seus tribunais, distintos dos episcopais, com jurisdição diretamente recebida do Papa e com os rigores especiais no andamento dos processos, tomados, sobretudo, das leis de Frederico II. Foi a gerencia inquisitorial comumente confiada a religiosos mendicantes, e especialmente, ainda que não unicamente, aos religiosos dominicanos. Dedicavam-se estes religiosos a defender de um modo especial a santa Sé; eram mais alheios que os leigos às influências mundanas; e por isso estavam mais no caso de desempenharem melhor estas funções. A maior parte daqueles, cujas notícias biográficas conhecemos, eram, a juízo dos próprios adversários da Inquisição, homens de ciência e de probidade; e muitos deles sofreram o martírio no desempenho deste cargo, que lhes foi imposto pela Santa Sé, e mereceram as honras da canonização ou da beatificação.



Em quatro pontos principais se diferenciam os processos inquisitoriais dos outros usados nas dioceses. Os incriminados primeiramente não dispunham de advogado, porque logo este ficaria suspeito como fautor de heresia. Em segundo lugar os desqualificados perante os tribunais dos bispos (os antigos hereges, as pessoas de maus costumes ou os condenados por diversas causas) não eram refugados como testemunhas nestes tribunais; o acusado tinha, contudo, o direito de recusar os seus inimigos pessoais. Os nomes das testemunhas ficavam, em terceiro lugar, secretos para os acusados que assim tinham de defender-se contra acusações, cuja procedência eles ignoravam; fazia-se isto por precaução contra as represálias dos acusados ou dos seus amigos. E, enfim, a tortura não foi conhecida no foro episcopal; e só se introduziu nos processos inquisitoriais no ano de 1252.



Era esse processo muito rigoroso, pois que despojava os denunciados por heresia da maior parte das garantias, que nos tribunais da Igreja se concediam aos outros culpados. É, contudo, falso que os denunciados, levados ao tribunal da Inquisição, ficassem de todo entregues ao arbítrio dos seus julgadores. Não falando das penas espirituais e corporais impostas às falsas testemunhas, devia o inquisidor aconselhar-se com homens prudentes e instruídos, que tinham conhecimentos dos nomes dos acusadores e que os podiam refugar, e que eram comumente dignitários eclesiásticos e membros do foro diocesano, tidos como boni viri. A sua influência foi aumentando com o tempo, de modo que se assemelharam depois aos que hoje chamamos jurados. Era aos acusados permitido aduzirem testemunhas que, sob juramento, abonassem a ortodoxia que se punha em dúvida. Não podia, enfim, o inquisidor dar a sentença sem primeiro ouvir o parecer do prelado diocesano; nem a tortura se podia aplicar senão citra membri diminutionem et mortis periculum; e só foi empregada em casos extremos, os quais, segundo se averiguou, foram realmente muito raros. E, demais disto, facultava-se sempre a apelação para o Papa.



Os acusados, convictos ou pelo menos gravemente suspeitos de heresia, a quem os inquisidores encontravam nas suas viagens, eram encarcerados ou ficavam sob a fiança em liberdade, até a sentença solene ou auto de fé. Não era este auto da fé, como muitos supõem, o suplício dos hereges, pois que somente consistia na abjuração solene e pública daqueles hereges, que queriam entrar na Igreja, e que depois de imposta uma penitência, eram absolvidos das censuras. Na mesma cerimônia eram anunciadas as penas impostas aos hereges que se recusavam a abjurar os seus erros.



As principais penas impostas pelos inquisidores eram as multas, as contribuições para obras pias, as peregrinações, o servir na cruzada durante um certo tempo, o trazer no fato umas cruzinhas, que perante os fiéis assinalassem o herege arrependido ou absolto, e a flagelação em determinadas ocasiões. As penas maiores, reservadas aos hereges obstinados ou pouco sinceros e pouco sólidos na sua conversão, eram o cárcere durante um certo tempo ou por toda a vida, a confiscação dos bens em proveito do fisco e a entrega deles ao braço secular. Esta última pena, que tinha como resultado para o condenado o suplício de fogo, só era imposta aos obstinados e principalmente aos relapsos. No fim do auto de fé era o condenado levado para fora da Igreja, para um estrado levantado na praça pública, e lá o entregavam aos oficiais civis. O seu suplício só se efetuava no dia imediato, para que o condenado pudesse ainda reconsiderar e entrar em si, pela noite adiante. Se durante a fogueira fizesse a abjuração dos seus erros, era devolvido à Inquisição, e assim se livrava da morte; exceto se fossem relapsos, porque na segunda abjuração não escapavam ao fogo.



Estes suplícios foram em França, por exemplo, relativamente raros, sendo, como diz Vacandard, “a percentagem dos condenados à morte, de um para treze no tribunal de Pamiers, e de um por vinte dois ou vinte três no de Tolosa”.



As penas pecuniárias ou a prisão podiam sempre ser ou mitigadas ou suprimidas pelo inquisidor, quando este julgasse as disposições do delinqüente merecedoras deste favor. Conquanto o campo de ação da Inquisição fosse dilatado, nunca, contudo, abrangeu a toda a cristandade e nem sequer a todos os países latinos. Quase não exerceu a sua influência, por exemplo, nos países escandinavos; e, se algo influiu na Inglaterra, foi só a propósito da questão dos templários e nunca mais. Em Castella e Portugal não foi conhecida antes dos reis católicos Fernando e Isabel (I). Em França quase não funcionou, ao menos seguidamente, senão nas regiões meridionais, no chamado condado de Tolosa e mais tarde no Languedoc. Houve tribunais permanentes no reino de Aragão, nas duas Sicílias e em muitas cidades da Itália e da Alemanha, tornando-se no século XVI notável a atividade deles em Flandres e na Boêmia. Por ocasião do grande cisma perdeu a Inquisição em França a sua influência, a qual passou para os Parlamentos, que pouco a pouco se tornaram o tribunal supremo para todas as questões religiosas. Foi com o Parlamento que os huguenotes tiveram que haver-se; e não puderam com isso dar-se os parabéns.



B. JUÍZO CRÍTICO



Prestou-se a Inquisição eclesiástica, de que acabamos de falar, a atos dignos de censura, como geralmente acontece com as instituições humanas. Tornaram-se verdadeiras iniqüidades certos processos, como o dos templários, no reinado de Filipe o Belo, ou o de Joana d’Arc. Foram tais as queixas que houve, sobretudo por causa das violências praticadas pelos inquisidores de Carcassona, que chegaram a Roma e causaram muito desgosto ao Papa Clemente V, que, em 1306, nomeou uma comissão composta de vários cardeais para irem àquela região a averiguar o que havia de verdade nestas queixas; e tais foram os abusos que observaram nos processos, e tais os maus tratos usados com os encarcerados que tiveram de reformar muitos abusos e despediram todo o pessoal inquisitorial de Carcassona. Muito para lastimar foram também as proezas de um Conrado de Marburgo na Alemanha e de um Roberto de Bougre em Champagne. Bastariam só as muitas cartas dos Papas aos inquisidores a relembrar-lhes as suas responsabilidades, para demonstrar que realmente vários deles e, sobretudo, os seus subalternos tinham incorrido em culpas graves. E o que é mais para notar é que, observa Vacandard, “quando os inquisidores tinham de contar com os soberanos ou com a política, é que os inquisidores se achavam em maior perigo de incorrerem em maiores excessos”. “A parte que o poder civil tomou nos processos dos hereges, diz ele noutro lugar, não foi em favor dos processados, senão muito pelo contrário; e até parece que quanto mais o Estado exercia pressão sobre os tribunais eclesiásticos, mais o processo corria o risco de descambar nas arbitrariedades”.



Pode realmente e deve um católico censurar os excessos, por vezes graves, de certos membros ou clérigos ou leigos dos tribunais da Inquisição; mas praticar-se-ia um grande agravo contra ela, se lhe imputassem os abusos de que alguns dos seus membros se tornaram culpados. Quando é que entre os homens deixou de haver abusos?



Para, por outra parte, se fazer um juízo reto acerca das formalidades e procedimento da Inquisição medieval é mister saber-se contra que espécie de gente ela tinha que haver-se, para assim usar de uns rigores até então desusados nos tribunais eclesiásticos. Houve de, com efeito, os empregar contra os cátaros, sectários ferozes, que renovavam o dualismo dos maniqueus, e que, como estes, admitiam um eterno antagonismo entre o bem e o mal, e que por isso abalavam não só os dogmas e a moral da Igreja, mas também com a mesma paixão e furor arruinavam a ordem social. Era o catarismo uma heresia radical e juntamente uma revolução também radical. Pelos seus anátemas insensatos contra a matéria e a carne, emanações do Mal, condenava toda a propriedade, rejeitava o matrimônio e rematava em puro e execrando pessimismo. Para se poder compreender o perigo social, que esta heresia, grandemente contagiosa, consigo trazia, bastará aduzir aqui o testemunho de um historiador que, não há muito, ousou apresentar-se como apologista dele, Henrique Carlos Lea. “Confessamos, afirma ele, que em tais circunstâncias a causa da ortodoxia e a da civilização e progresso iam a par uma com a outra. Não há dúvida que, se o catarismo chegasse a dominar ou mesmo só a ombrear com o catolicismo, a sua influência houvera sido desastrosa”. Não menos significativo é o parecer de um escritor, que nem por sombra ousaríamos equipar àquele infeliz polemista americano, mas que também não pode ser suspeito de parcialidade para com a Igreja. “Nem sempre, diz este escritor, Paulo Sabatier, o Papado esteve ao lado da reação e do obscurantismo; quando ele, por exemplo, deu cabo dos cátaros, a vitória dela foi a vitória do bom senso e da razão”. [1]



Seria do mesmo modo uma falta de equidade o não se terem presentes, ao falar-se da Inquisição, as idéias, ou como hoje se diz, a mentalidade dos tribunais civis da Idade Média, quanto à repressão dos delitos e dos crimes. As garantias indispensáveis aos processados e os direitos de defesa eram excessivamente menosprezados. Ainda em pleno século XVI “por toda a parte dominava a diversidade, a incerteza e a arbitrariedade nos tramites do foro, diz Poullet; o acusado ficava privado da garantia da publicidade, que se requer nos debates judiciais; e o juiz podia, querendo, recusar o advogado ao acusado; e este nem podia assistir ao interrogatório das testemunhas”. A tortura estava em voga na maioria dos tribunais europeus, e continuou ainda por muito tempo, depois de os tribunais inquisitoriais a terem abolido. E o mesmo se diga da escolha das penas impostas aos culpados. “Basta atentar, diz Lea, nas atrocidades da legislação criminal da Idade Média, para se ver quanta falta faziam os sentimentos de piedade nos homens de então. Esmagar sob a roda, meter em água fervente, queimar vivo, enterrar vivo, escorchar vivo, esquartejar vivo, eram os meios ordinários admitidos pelos criminalistas daqueles tempos para impedir as recaídas nos mesmos crimes, e para com estes exemplos meter medo às multidões, bastante refratárias aos sentimentos de humanidade”. E tais rigores eram desconhecidos dos tribunais ordinários da Igreja, isto é, no foro diocesano; nos tribunais da Inquisição, porém, em razão da gravidade maior dos perigos, empregavam-se alguns dos castigos tomados da legislação civil, os quais ou desapareceram ou se foram atenuando à medida que iam desaparecendo os perigos, que davam ocasião a se fazer uso deles.



II – Origem e natureza da Inquisição Espanhola.



A. NOTÍCIA HISTÓRICA



Foi a Inquisição espanhola fundada por fins do século XV, afim de atalhar os males do judaísmo, que fazia afluir à nação um grande número de judeus só aparentemente convertidos ou judeus relapsos. Foi a introdução da Inquisição em Espanha o penúltimo ato de um drama que, havia séculos, se vinha desenrolando e que devia terminar em 1492 pela expulsão dos judeus da Península.



Tinham eles já grande influencia durante o governo dos reis visigodos; e foram eles que abriram as portas da Espanha aos mouros; e sob o domínio dos Ommeiadas gozaram de uma prosperidade, a que só no século XII os Almohades conseguiram por termo. Voltando novamente a Castela, puderam reaver a sua influencia dominadora. O seu sistema de comércio e as grandes usuras, que exigiam, foram a causa de ruína para muitas fortunas. Assacavam-lhes além disto crimes horrendos, assim como também maior facilidade para reproduzirem e propagarem a peste negra, que nos fins do século XIV infestou grandemente os povos; com o que se suscitaram contra eles inúmeras perseguições, sob o peso das quais se viram obrigados a optar ou pelo batismo ou pela morte.



Um grande número deles abraçaram sinceramente o cristianismo, movidos pelas pregações de varões apostólicos e mormente de S. Vicente Ferrer, que desde 1412 se deu à evangelização deles; mas, a par desses verdadeiros prosélitos, havia uma grande multidão de falsos convertidos, que só de nome eram cristãos. Estes judeus, disfarçados de cristãos, diz Maranos, continuavam com as suas práticas supersticiosas, conseguiram meter-se por toda a parte, e trabalhavam com as suas riquezas e influência por implantar o judaísmo em terras de Espanha e por nelas destruir a religião cristã. E estes é que, depois de terem escalado os mais altos postos do Estado, se mostram mais intolerantes com os seus irmãos convertidos, que, como era de esperar, se tornaram judeus relapsos.



Impunha-se, portanto, a instituição de um tribunal, que pusesse cobro às vinganças populares e que servisse a Espanha de defesa contra um inimigo que comprometia a própria existência nacional.



E assim é que foi a Inquisição considerada como o remédio mais eficaz para a triste situação da Espanha; e porque ela por esse tempo tinha perdido toda a sua importância neste país, resolveram os Reis Católicos Fernando e Isabel restabelece-la em seus Estados, posto que sobre novas bases.



Precisava-se para isto a autorização da Santa Sé, a qual o Papa Sixto V concedeu por breve de 1° de novembro de 1478. “Foram dados plenos poderes a Fernando e a Isabel para nomearem dois ou três inquisidores, arcebispos, bispos ou outros dignitários eclesiásticos, abonados pela sua prudência e virtudes, padres seculares ou religiosos, de quarenta anos pelo menos, de costumes irrepreensíveis, lentes ou bacharéis em Teologia, doutores ou licenciados em direito canônico, ou reconhecidos como aptos depois de se sujeitarem a um exame especial”. Delegava o Papa nestes inquisidores a jurisdição necessária para, em conformidade com o direito e as normas de costume, instaurarem processo aos culpados, e concedia aos soberanos espanhóis o poder de os destituírem e de nomearem outros para o seu lugar. Assim se expressa Llorent na sua História Crítica da Inquisição Espanhola. [2]



Antes de se empregarem os meios de rigor procurou-se ainda, a pedido da rainha Isabel, chamar ao bom caminho os transviados, por meio de pregações e de outros modos brandos, mas todos foram baldados; a obstinação desta gente frustrou mais esta tentativa. Não restava, pois, aos soberanos senão o uso de meios mais enérgicos; e por isso é que, em virtude da bula do Papa, nomearam a 17 de setembro de 1480, a Miguel Morillos e a João Martins como inquisidores para a cidade e diocese de Sevilha e como seu adjuntos dois padres seculares. Começou logo o tribunal a funcionar e os judaisantes obstinados foram entregues ao braço secular. Uma peça importante veio, porém, acrescentar-se à engrenagem deste tribunal, a do inquisidor-mór. Confiou Sixto V este cargo, em 1483, ao dominicano Tomaz de Torquemada, depois de lhe haver designado as atribuições. Foi mais, associado a este cargo de inquisidor-mór, o conselho da Inquisição, com o fim de principalmente se dar andamento às apelações, sendo Torquemada quem instalou este tribunal, em virtude dos poderes, que do Papa recebera, para delegar a sua autoridade.



Um fato importante registra-se aqui para bem se caracterizar a Inquisição Espanhola; e vem a ser que “assim como foi o Papa que, como cabeça da Igreja, tinha autorizado a nomeação dos primeiros inquisidores, assim foi também ele, quem por um ato importante fixou pela primeira vez as normas que a nova instituição devia observar”. Afim de, com efeito, suprimir as demasiado freqüentes apelações para a corte de Roma, que de ordinário não passavam de uns pretextos, destinados a dificultar os tramites de Sevilha como juiz de apelação e como representante seu nas causas submetidas à Inquisição.



B. NATUREZA DA INQUISIÇÃO ESPANHOLA



Seu duplo elemento. Alguns autores, como de Maistre, Banke, Hefele, Hergenroether, Knoepfler, procuraram apresentar a Inquisição Espanhola como uma instituição puramente política, e como uma fundação do Estado, estranha à ação da Igreja. O espanhol Rodrigo demonstrou, na sua Historia verd. da Inquisição, ser semelhante asserção insustentável. “Os tribunais do Santo Ofício, diz ele, eram tribunais eclesiásticos, tanto em relação às causas, sobre que tinham de julgar, como em relação à autoridade, de que gozavam. Se, porém, se olhar à delegação, que pela coroa era dada aos juízes, pode muito bem dizer-se que estes tribunais tinham um caráter misto”, isto é, a Inquisição Espanhola era um tribunal eclesiástico, mas tinha poderes, que lhe eram conferidos pela autoridade real.



Eram os membros do conselho da Inquisição funcionários do Estado e nomeados pelo rei, ainda que eram escolhidos dentre os propostos pelo inquisidor-mór; e, como tais, recebiam naturalmente do rei a jurisdição secular; mas não tinham poder algum espiritual, sem que antes fossem investidos deste poder pelo delegado do Papa. [3]



Apresenta-se-nos, pois, a Inquisição Espanhola como uma instituição de natureza mista, em que o elemento religioso conserva uma preponderância bem marcada. E o fato de os juizes eclesiásticos entregarem os réus ao braço secular, vem a confirmar esta asserção; porquanto, como se explicaria este procedimento, se a Inquisição espanhola fosse apenas uma instituição do Estado ou um tribunal real? Um tribunal, que tem por costume ordinário e incessante, entregar os culpados ao tribunal secular, não é em si uma corporação secular, a não ser que este epíteto se tome uma acepção inteiramente diversa da que ordinariamente tem. Se, pelo contrário, se admite o caráter especialmente religioso deste tribunal, já facilmente se explica o recusarem-se os juízes deste tribunal a porem em execução as sentenças de pena capital, e o implorarem estes a clemência do poder secular em prol dos condenados, o que, como é sabido, foi uma norma usada em todos os tribunais eclesiásticos e preceituada pelo direito canônico.



OBSERVAÇÕES – A má sorte da Inquisição Espanhola esteve em que teve de haver-se com homens que se tinham feito cristãos à força e que, como relapsos, tão infiéis a Cristo como a Moisés, constituíam um contínuo perigo para a sociedade cristã.



Outro grande mal para a Inquisição espanhola foi a sua demasiada dependência da coroa. Recebia certamente o Santo Ofício do Papa, a sua jurisdição e as normas, em si muito comedidas; mas estava muito influenciada pela coroa, pelo que estava em contínuo perigo de se tornar uma máquina do Estado, um instrumentum regni. E foi o que infelizmente aconteceu, não obstante a oposição dos Papas, que sempre encontravam grandes dificuldades mesmo em salvaguardar os seus direitos de apelação, que viram os seus breves desfavoráveis à Inquisição sonegados (1509); e a excomungar os inquisidores de Toledo. E outros, como Pio V, só com muito custo puderam avocar a si as causas, que só deles dependiam, como aconteceu com a do infeliz arcebispo de Toledo, Bartolomeu de Carranzas.



III - Legitimidade, por principio e por direito, da Inquisição.



Exposta assim a história da Inquisição eclesiástica, e da mista, peculiar à Espanha, só nos resta agora resolver a questão de princípio e do direito, em que ela se funda. Será realmente justa a repressão das heresias, e até por meio de penas temporais, se se julgarem necessárias? Será ela de fato legítima tanto por parte da Igreja como por parte do Estado?



Que seja legítima por parte da Igreja, não pode haver dúvida alguma para um católico, pois que todo os Papas e concílios, os santos e doutores e a Escritura com a Tradição, são concordes em afirmar que a Igreja tem o direito e o dever de olhar pela pureza da fé, e de punir, até com penas temporais, aqueles dos seus filhos, que se apartarem da verdade e que por seus exemplos se tornarem pedra de escândalo para os seus irmãos [4]. Este direito inalienável, que lhe vem dos poderes que Jesus Cristo lhe concedeu, sempre o exerceu a Igreja, a qual olhou sempre os crimes de heresia, de apostasia e de sacrilégio como tão dignos de castigo como os atentados contra a propriedade, a honra e a vida do próximo.



São esta doutrina e estes procedimentos da Igreja inteiramente razoáveis e justos; pois que o direito e o dever de uma sociedade perfeita é encaminhar real e eficazmente os seus membros para a consecução do fim, que ela se propõe, assim como olhar pela sua própria conservação. Ora, sendo a Igreja uma sociedade perfeita, provida por seu divino Fundador de tudo o que é necessário à sua conservação e vitalidade, necessariamente possui o direito e, conseqüentemente, o poder de fazer leis e de punir os seus súditos que as menosprezarem. E, se eles relutarem ou se mostrarem rebeldes contra ela, devios et contumaces, como se expressa Bento XIV, pode e deve também, como mãe terna, sim, mas não fraca, corrigi-los, para os fazer voltar aos seus deveres e para impedir que os demais se deixem arrastar pelos maus exemplos deles. Procede ela, obrando assim, como procederia um pai de família, que, por meios prudentes e eficazes, corrige os seus filhos e procura preservar o seu lar de tudo o que seja de natureza a perturbar-lhe a paz e o seu bem estar, ou como procedem hoje em dia os governos, quando, por um sistema de precauções enérgicas, impedem que entre a peste, ou a cólera ou qualquer outra moléstia epidérmica, ou quando organizam corporações de vigilância destinadas a descobrir os malfeitores, os assassinos, os conspiradores e aos entregarem à vindica das leis, para assim lhes frustrarem os seus sinistros e malévolos intentos.



O que é a varinha para o pai de família, ou o que são os cordões sanitários para os países ou as comissões medicas, os corpos de polícia e os tribunais, era a Inquisição para sociedade religiosa, isto é, um meio de conservação para ela e de preservação para os seus membros. [5]



Quanto à legitimidade por parte do Estado, para ela se poder compreender bem, é mister reportar-se aos tempos, em que ela foi fundada. Nos tempos, em que, de fato, a Inquisição se fundou, a sociedade européia era completamente católica, como todos sabem, e era tão geral a convicção acerca da verdade dos dogmas católicos, como nas sociedades modernas pode sê-lo a convicção acerca da verdade, relativa aos princípios da lei natural. Tinha-se e, com razão, como coisa certa, que a revolta contra Deus não era menos digna de castigo do que a revolta contra o próprio soberano.



Tanto os soberanos como os vassalos consideravam, além disto, a conservação da religião católica, a única verdadeira e divina para eles, como um bem social, muito mais transcendente do que todos os bens naturais. E assim se achava a legislação dos diferentes países da Europa baseada numa íntima aliança a Igreja e o Estado; pelo que qualquer desobediência contra a religião ficava, ipso facto, punível segundo as leis civis, logo que por atos públicos se desse a conhecer.



Correndo as coisas por esta forma, era muito natural a fundação de tribunais que tivessem por fim averiguar, por meio dignos e legais, as infrações externas das leis religiosas, discernir os hereges obstinados dos que só acidentalmente caiam nalguma fraqueza passageira, e punir os verdadeiros culpados, lavando da culpa os inocentes. Eram estes tribunais tão fundados em justiça como o são modernamente os tribunais destinados a averiguar os delitos contra a segurança do Estado, ou contra a pessoa, a honra e os haveres dos cidadãos. Dissemos exteriores, pois está claro que os recônditos das consciências só a Deus são patentes; e por isso as leis humanas não podem estender-se aos atos internos, nem castigam senão as infrações que se revelam por sinais exteriores.



E, porque os princípios e povos da Idade Média se achavam compenetrados destas verdades, é que nunca julgaram violar a liberdade de consciência, quando puniam a heresia e a apostasia.



Em conclusão, tratando-se neste caso de uma sociedade estabelecida segundo os princípios que acabamos de expor, e governada por uma legislação orientada por esta forma, ninguém, que pense sensatamente, ousará negar ter a Igreja procedido muito atiladamente em, de combinação com o poder civil, encarregado de executar os castigos, estabelecer um tribunal destinado a, com todas as garantias da justiça, averiguar quais fossem os réus de delitos graves e a lhes instaurar os processos, e mais, sendo estes crimes considerados como grandemente nocivos tanto à sociedade civil como à religiosa.



OBSERVAÇÃO – Se hoje se encontram homens que sentem uma tal ou qual repugnância em admitir esta conclusão, é porque o ambiente social, que se presentemente se acha impregnado de muitos erros, lhes não permite ver com lucidez a verdade, que outrora abraçariam com prazer. E não descansam os inimigos da religião, para mais facilmente propagarem o mal, em fazerem crer que qualquer repressão da impiedade e da heresia é um atentado contra os que eles falsamente chamam sagrados direitos da consciência.



É, sem embargo, fora de toda a dúvida, que o homem não tem nem pode ter, como hoje querem muitos, o direito de pensar, de escrever tudo o que lhe vem à cabeça. Sendo o homem criado para Deus e estando tudo dependente de Deus, jamais lhe será lícito blasfemar ou ultrajar ao Autor da sua existência; tornando-se pelo batismo filho da Igreja, jamais lhe será permitido insurgir-se contra sua mãe e pôr-se em revolta contra ela; sendo membro de uma sociedade, é-lhe vedado socavar os fundamentos em que assenta essa sociedade; sendo dotado de livre arbítrio, para assim, de um modo meritório, poder praticar o bem, não a de servir-se deste dom para ir perverter os seus irmãos e os arrastar para o mal.



É do mesmo modo incontestável haver erros, que implicam culpa; há desvarios da mente, que praticamente andam acompanhados de perversidade moral. Está o homem, acima de tudo, obrigado a abraçar a verdade e a libertar a sua inteligência: e a razão é clara; pois que para querer é necessário conhecer; e para retamente querer é necessário conhecer a verdade. Se, de fato, não houvesse regras ou normas para as idéias, também as não poderia haver para as ações. Se assim não fora, aonde iriam parar a moral e a sociedade? Ora, bem os pecados de incredulidade, de heresia e de apostasia avantajam-se a quaisquer outros erros, quando há culpa. Os atentados contra a honra, contra as vidas ou contra os haveres de um homem, simples criatura, não são atos que se possam comparar na gravidade com os crimes, que diretamente vão atentar contra a soberana majestade de um Deus. Negar-se obstinadamente a crer uma revelação feita por Deus e, como tal, bastantemente demonstrada e reconhecida, constitui um crime de lesa majestade divina, pois é, em certo modo, negar a veracidade infinita de Deus.



Ora, nos tempos e nos países em que dominava a Inquisição, era a todos fácil ter um certeza moral completa (ainda que proporcionada ao estado e capacidade de cada individuo) acerca da divindade da religião cristã e da Igreja Católica.



IV. Que juízo se há de fazer sobre a Inquisição em geral, e em especial sobre a Inquisição na Espanha.



Mas não será pelo menos digno de censura o modo, como este direito foi posto em prática; não houve realmente crueldade por parte da Inquisição da Espanha? Não tem esta questão a importância da que acima tratamos, e em parte lhe demos a solução. Façamos apenas, para remate, algumas observações.



1. Seria primeiramente absurdo imputar à Igreja os abusos, de que são unicamente responsáveis os juizes inquisitoriais. Assim como não podem imputar a um indivíduo senão os atos e os efeitos provenientes da sua atividade pessoal, assim se não pode também acusar uma corporação senão dos resultados que se deram em razão da sua existência e da sua ação como associação, ou, por outras palavras, em razão dos seus princípios constitutivos, das suas leis e do exercício regular da sua autoridade. Quem é que, pois, com justiça ousaria incriminar as leis civis ou os regulamentos militares pelos abusos cometidos pelas autoridades encarregadas de executarem essas mesmas leis e regulamentos, abusos que essas mesmas leis e regulamentos condenam?

Ora, os abusos, que se comprazem em assacar à Inquisição, não são de nenhum modo um fruto dos princípios professados pelo cristianismo; estão em completa oposição com o seu espírito, e foram de fato severamente censurados pelos soberanos Pontífices todas as vezes que deles tinham notícia. “Os inquisidores eram homens, observa Vacandard, e muito seria para espantar que nunca tivessem abusado dos poderes que lhes tinham sido confiados. Mas nunca a Igreja jamais pensou em lhes abonar todos os seus atos; deixa-os à apreciação dos historiadores; e o que ela só quer é que este assunto se trate com uma serena imparcialidade e um são critério. Os que assim fizerem o estudo da Inquisição facilmente observarão que o uso da força em prol da fé foi por vezes além dos limites da equidade e não serviu aos interesses da religião; nem será a Igreja que o negue; e nada encontrarão em sua doutrina que os impeça de pensar deste modo.



2. Convém também ter presente que a crueldade dos suplícios não era única e exclusivamente praticada pela Inquisição. Já dissemos que o sistema penal se ressentia muito da influencia da barbárie, influência que só lentamente viria a desaparecer [6].



Temos um monumento da extremada severidade dos tribunais daquele tempo na Carolina, código penal de Carlos Quinto, pelo qual se regeu a Alemanha até o último século.



3. E, demais disto, quando se comprassem em declamar contra as torturas da Inquisição, esquecem-se de nos dizer ou fingem ignorar que este meio de se descobrir a verdade estava então em voga em todos os tribunais da Europa. E assim, quando por exemplo, os conselhos judiciais da Bélgica foram, em 1765, consultados acerca dos projetos de reforma que conviria introduzir no direito criminal, relativamente à abolição eventual da tortura, todos os do conselho, à uma, optaram pela sua conservação. E, quando mais tarde foram de novo ouvidos sobre o mesmo assunto, ainda todos se mantiveram firmes no seu primeiro parecer, quanto à abolição das torturas.



Note-se, além disto, que foi a Inquisição a que primeiro renunciou à tortura, e muito antes dos outros tribunais da Europa. “É coisa certa, afirma Llorente, que há já muito tempo que a Inquisição não emprega a tortura”. E, além disto, nunca ela permitiu, como permitiam os tribunais civis, se recorresse várias vezes a ela durante o mesmo processo; e exigia sempre a presença do médico para verificar o momento em que a vida do supliciado começasse a correr perigo.



4. Com respeito à Inquisição Espanhola não temos dificuldade em confessar que realmente houve numerosos abusos; nem isto é para estranhar, pois eram homens os que intervinham como juízes. Em todo o caso é mister deslindar bem as responsabilidades. Os papas é que, como vimos, se mostraram sempre adversos a uma demasiada severidade tanto em clamar a atenção sobre os abusos como em coibir. Vejam-se, por exemplo, as reclamações logo no começo feitas por Sixto IV e as precauções por ele tomadas contra a demasiada severidade e contra a irregularidade dos tramites seguidos pelos inquisidores. [7]



Convém ainda notar que as crueldades imputadas à Inquisição da Espanha andam vulgarizadas com uns exageros que causam espanto e que revelam uma grande má fé. Até o próprio Llorente, hostil à Igreja, confessa que os tribunais da Inquisição eram secos, bem abobadados, e que eram uns palácios, comparados com os cárceres dos outros tribunais europeus. Nenhum encarcerado da Inquisição era, assegura ele, amarrado com correntes ou carregado de grilhões.



Sobem por vezes, note-se ainda, a centenas de milhares o número de vítimas imoladas pela Inquisição espanhola durante um curto espaço de tempo. Ora, segundo o supracitado Llorente, o seu número não vai além de umas 35.000 durante 331 anos que durou a Inquisição; e ainda neste número se contam diversos gêneros de malfeitores, propriamente ditos, como são, por exemplo, os contrabandistas, os mágicos, os feiticeiros e os usurários, que dependiam deste tribunal. Além de que este mesmo número é evidentemente exagerado; pois que a dar-se, por exemplo, crédito ao próprio Lorente, nos autos de fé em Toledo nos dias 12 de fevereiro, 1 de maio e 1 de dezembro, do ano de 1486, contaram-se como, respectivamente, condenados e entregues ao braço secular, 700, 900, 750. Ora, o fato é que não houve nem uma só vítima; pois eram simplesmente culpados, mas nenhum deles foi supliciado. [8]



Faça-se uma comparação da tão falada severidade da Inquisição espanhola com a pouco falada crueldade, praticada por Isabel de Inglaterra, e ver-se-á que, como assegura o protestante Guilherme Cobett, mais gente matou num só ano esta sanguinária mulher do que a Inquisição durante todo o tempo da sua existência. Acresce ainda que muito mais violenta foi por toda a parte a intolerância dos protestantes contra os católicos do que a destes contra os protestantes: a perseguição sanguinolenta foi o meio empregado pelos príncipes luteranos para arrancar os povos à Igreja. E, contudo, é só contra a Igreja católica que se ouvem palavras de censura e de incriminações.



“Porque, pergunta Langlois, pouco favorável à Igreja, veio afinal a Inquisição a ser o bode expiatório das cóleras que a lembrança das antigas perseguições religiosas ainda hoje está atiçando? Milhares de seres humanos foram queimados vivos por causa das suas crenças, antes de a Inquisição existir. Quando se deu o segundo grande assalto, em parte vitorioso, que a hierarquia católica sofreu no século XVI, quase só em Espanha florescia a Inquisição propriamente dita. E foi acaso menos para lamentar o martirologio dos países, em que ela deixou de influir, como em França, ou em que ela nunca entrou , como na Inglaterra dos Lancastres e dos Tudores? Sob o regime do estatuto De hærético comburendo, ou sob o regime inquisitorial na Espanha, de Carlos V? Foram mais numerosos os cátaros, que morreram vítimas da Inquisição albigense, ou os anabaptistas, que a Alemanha luterana ou calvinista imolou ao seu partidarismo? E não se igualaram as grandes perseguições da Igreja Oriental, que fundaram a ortodoxia grega no sangue dos dissidentes, às mais cruéis que assolaram o ocidente?



Mas, tempos novos, novos costumes. Tem, sem dúvida a Igreja o direito de punir os seus filhos rebeldes; mas por ela ter feito uso deste direito, por assim o julgar conveniente, não se segue que haja sempre de fazer uso dele; e deve até pô-lo de parte, quando ele se tornar contraproducente. E há já muito tempo que, de fato, renunciou a servir-se dele; e por isso já não é mais que como uma lembrança histórica ou como um espantalho ao serviço da ignorância e da impiedade.



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NOTAS:



[1] Guiraud, na Vie de S. François d’Assise, demonstrou para os valdenses, para os fraticelos, para os hussitas e para os lollardos o mesmo que Sabatier demonstrou para os cátaros. “Se o rol dos sectários queimados ou emparedados se riscassem os sectários que foram condenados como perturbadores da ordem pública e como malfeitores contra o direito comum, ficaria o número dos condenados por heresia reduzido a um pequeno número”. Vacandard, L’Inquisition.



[2] Teve a Inquisição espanhola por historiador um homem abjeto, chamado Llorente, cônego de Toledo e secretário geral da Inquisição, o qual se vendeu ao rei Joseph e se enriqueceu com os despojos dos bens nacionais. Depois de expulsos os franceses, a qual ele teria sacrificado a sua pátria, refugiou-se em Paris, donde, por causa dos seus escritos, foi expulso em 1822. Depois de escrever a sua história em 4 volumes, teve o cuidado de queimar a maior parte dos documentos relativos à inquisição, os quais o poderiam sem dúvida ter convencido de caluniador. Respondeu-lhe José de Maistre pelas suas Lettres à un gentilhomme russe: “A obra escrita por este lastimoso escritor é o como evangelho a que recorrem todos os adversários da Inquisição. Nele ao menos deviam ver como os cárceres do Santo Ofício e o seu sistema de impor as penas revelam preocupações humanas e indulgentes, desconhecidas para todos os governos e em todos os tribunais civis daquele tempo”.



[3] Supõem alguns ser a Inquisição uma instituição puramente eclesiástica; o que é um exagero, reconhecido até pelos próprios protestantes. Ainda não há muito escrevia Philippson, ao fazer o juízo crítico de uma obra de Schaefer: “Engana-se este senhor, quando se empenha em provar que a Inquisição de Espanha era um tribunal composto de padres. A verdade é que ele estava submetido à vontade do rei; deste é que sempre recebia a direção; o conselho superior era nomeado pelo rei, e, se o inquisidor-mor precisava ter a aprovação papal, não era esta mais que uma pura formalidade, sem conseqüência alguma prática. O rei podia, além disto, forçar o inquisidor-mór a se demitir do seu cargo. E nos negócios mais importantes o conselho da Inquisição pedia diretamente as ordens do rei. E Philippe II sobretudo, como protetor do Santo Ofício, impediu sistematicamente qualquer ingerência do Papa nos negócios da Inquisição espanhola”.



[4] Não se deve esquecer que, quando se discute acerca da Inquisição, a questão não tem nada que ver com os infiéis ou com os pagãos e judeus, sobre os quais a Igreja não tem nenhuma autoridade, nem jamais sonhou em os constranger pela força a se submeterem às suas ordens; o assunto diz unicamente respeito aos cristãos, aos filhos da Igreja, aos que, regenerados pelo batismo, ficaram submetidos às suas leis. Os primeiros, diz S. Tomás, não devem à força ser obrigados a obedecer à Igreja; os outros, pelo contrário, devem ser constrangidos.



[5] “A Inquisição, o braço secular! Eis os palavrões que soam com terror aos ouvidos dos contemporâneos. Mas nada de medos infantis. Para se julgar do passado, é mister que nos formemos uma alma histórica, uma alma de antepassado. A Inquisição, falo da romana, apresenta-se com rigores, que todos os espíritos retos do tempo, em que ela funcionava, consideravam como justos e necessários, porque os hereges se lhes antolhavam, e com razão, como perigosos perturbadores da sociedade assente sobre o princípio da unidade cristã, que se lhes afigurava com direito pleno de defender as suas instituições fundamentais, do mesmo modo que as modernas sociedades se julgam com direito para defender as suas contra os anarquistas, os niilistas e os coletivistas... Os que se procuram convencer de que os rigores são baldados, e de que a idéia se não reprime, estarão acaso bem seguros de que bastariam somente os meios persuasivos, atualmente mesmo, para salvaguardar a ordem social contra a propaganda subversiva? Seja, porém, qual fora a sua opinião, o certo é que a dos nossos pais não admitia dúvidas. Quando a Igreja lançava mão da severidade, fazia-o de acordo com o sentir geral; e o Estado, ao castigar os hereges, sobretudo relapsos, julgava fazer uma obra grandemente social. Fica deste modo justificado o princípio em que se baseia a Inquisição”. (Vacandard, De la tolerance religieuse).



[6] O que nos diz Poullet acerca da jurisprudência criminal do Brabante, se há de também aplicar ao resto da Europa. Queimavam-se vivos naquele tempo os moedeiros falsos; vergastavam-se ou condenavam-se à morte os falsificadores de pesos e medidas; o roubo com escada tinha o castigo de garrote; e os convictos de recidivos em questão de roubo eram igualmente condenados à morte. Não seria difícil demonstrar que em geral os tribunais da Inquisição se mostravam sob todos os respeitos muito mais eqüitativos e menos rigorosos para com os acusados do que todos os tribunais civis. Hafele na sua Inquisition d’Hespagne nos dá a prova desta asserção acerca do tribunal daquele pais, o mais incriminado de todos; e isto baseando-se nos dados fornecidos pelo próprio Llorente.



[7] [N. do Tradutor] Note-se o modo seguro e posição firme que o autor aqui toma defendendo a Igreja e demonstrando ser ela irresponsável pelos abusos inquisitoriais. Esta deve ser a tática, que se há de seguir, quando nos vierem com esta ária, infinitas vezes e em todos os tons realejada, dos Torquemadas, dos cárceres, das fogueiras da inquisição: mostrar como nunca um homem de juízo pode incriminar a Igreja romana por abusos, que ela sempre condenou. Mau serviço prestam, pois, à religião e à Igreja, cremos nós, os apologistas que para defendê-la, julgam também haver de defender a inquisição da península hispânica, à qual somente se referem, e não à romana, os escrevinhadores e declamadores, quando querem mover as turbas ignorantes para um determinado fim. Nesse terreno é que eles se querem e nos querem; mas nós não devemos querê-lo, por que é falso. Não lhe demos neste ponto nem lugar sequer a discussões. “Isso dos horrores da inquisição ou dos abusos por ela cometidos, digamos-lhes mais ou menos, não tem nada que ver conosco, católicos romanos: não vem nada a propósito tratando-se da religião católica, apostólica, romana. Canis extra chorum. Convém, sim, varrermos ou mostrarmos estar varrida a testada do Vaticano: as dos palácios inquisitoriais de Sevilha, de Granada ou, se quiserem, de Coimbra que as varram outros como quiserem ou puderem”.



[8] Lancemos uma vista de olhos sobre o que então se passava numa região protestante. Em Nuremberg, uma das cidades mais cultas da Alemanha morreram no espaço de 40 anos (1577-1617) 356 pessoas no cadafalso dentre as 55.000 almas de que se compunha o distrito judicial: a Inquisição espanhola houvera, proporcionalmente falando, supliciado 55.960 desventurados neste mesmo espaço de tempo. Em Nordlingen, que contava 6.000 habitantes, morreram em 4 anos (1590-1594) trinta e cinco feiticeiros: guardando-se a mesma proporção, isto é, mais 11.000 ainda do que ela em realidade, segundo Llorente, mandou supliciar, para toda a sorte de crimes, durante todo o tempo da sua existência. E chamam excepcionais sobre todos os outros rigores empregados pela Inquisição da Espanha!


(Pe. W. Devivier, S.J., Curso de Apologética Cristã. Editora Melhoramentos, São Paulo, 3a. edição, 1925)

Anônimo disse...

Vou enviar mais outros textos (sugiro ao Conde que, em vez de publicar, utilize como material de consulta ou poste no blog, se possível, com comentários. Alguns não citarei a fonte porque salvei diretamente da página):

A INQUISIÇÃO ESPANHOLA: UMA QUESTÃO CANDENTE


Por R.P. Nicolas Portail


A inquisição... a palavra faz tremer, repassando cenas de torturas e fogueiras armadas para queimar as vítimas miseráveis. Os livros de história tratam mui particularmente da Inquisição Espanhola. Vejamos o que disse o manual de Malet & Isaac:

"Fernando e Isabel, príncipes mui devotos ― chamavam-lhes de Reis Católicos ― tomaram medidas terríveis (...) Em 1492, os judeus, e em 1502, os mulçumanos, tiveram de escolher entre o batismo e o exílio. Muitos preferiram ir (...) Os que se converteram ao catolicismo fizeram-se suspeitos a olhos espanhóis; acusavam-lhes de professar sua antiga religião em privacidade. Os reis criaram contra estes o tribunal religioso da Inquisição, chamado na Espanha de Santo Ofício, do qual designavam os integrantes. O grande inquisidor Torquemada, dominicano, celebrizou-se devido aos judeus convertidos que entregou ao braço secular para serem queimados vivos, sem contar os milhares que condenou à prisão perpétua..."

Essa é a apresentação trágica e confusa que a história laica faz de tema tão controvertido. Sem pretender esgotar o assunto, traremos um quadro geral que permita situar a Inquisição Espanhola em seu contexto histórico, limitando-nos a estudar seus primeiros anos (1478 – 1504).

A ORIGEM DA INQUISIÇÃO ESPANHOLA: MARRANOS E CONVERTIDOS.

Mesmo que oficialmente a Inquisição espanhola tenha sido autorizada pela bula "Exigit sincera devotionis" de Sixto IV (1478), faz-se mister recuar no tempo para entender as razões que aconselharam Fernando e Isabel a pedir à Santa Sé sua constituição.

A situação da comunidade judia na Espanha diferia muito da de outros países. Arraigados a estas terras havia muitos séculos, com o passar do tempo algumas famílias judias se converteram à fé cristã. Ainda que alguns pedissem ser batizados por temor do poder civil e dos progroms, há-de se asseverar que a Igreja nunca impôs o batismo pela força, consciente de que o amor não se obtém pela força, e que a fé é um dom de Deus. Ademais, sempre se preocupou com a conversão deste povo, do que são testemunhas as pregações de São Vicente Ferrer e a célebre "disputa de Tortosa", organizada por Bento XIII, que tinha por objetivo demonstrar aos judeus a veracidade da religião católica.

O processo de conversão se estendeu às diversas camadas sociais. Muitos dos convertidos pertenciam à nobreza, ocupando altos postos, administrando os domínios da coroa e cobrando impostos. Chegaram a ascender aos cargos eclesiáticos; rabinos como Salomão Ha-Levi foram consagrados bispos. Não obstante, a situação se degrada, porque se podia pedir o batismo menos por conversão do que por oportunismo: os judeus ricos convertidos podiam aceder a cargos públicos que lhes conferiam o domínio de todo um povo, abandonando tão-somente em público o apego à sua antiga crença. O povo espanhol não tolerava seu poder e apostasia, de modo que, desde 1449, buscou retomar o poder, primeiro em Toledo e depois em Córdoba, em alguns casos com episódios de sangue. Em 1474, a situação era tal que a revolta popular já visava a convertidos próximos ao próprio poder real.

Os verdadeiros convertidos pediram aos reis que arbitrassem algum meio que afastasse toda causa de suspeita a seu respeito, fazendo-lhes justiça. Contaram-se, assim, entre os promotores da inquisição. O risco de uma guerra civil era cada vez maior e a atitude dos falsos convertidos lançava um manto de descrédito sobre os que eram e queriam continuar sendo católicos. Se não se fizesse justiça, o povo o faria com suas próprias mãos, com tudo o que isso implicava em matéria de ajustes de contas.

RESPOSTAS DA IGREJA: INQUISIÇÃO ANTIJUDAIZANTE, MAS NÃO ANTISEMITA.

Nesse estado de coisas, os soberanos espanhóis pediram a criação da Inquisição. Talvez hoje creia-se que a medida se ordenava a perseguir a comunidade judia; em realidade, os reis sempre a protegeram.

Seu único fim era julgar os judeus convertidos ― quer dizer, aos católicos de origem judia ― e afastar toda suspeita que pudesse afetar os verdadeiros convertidos, assegurando a paz social através do recurso à Igreja, que é a autoridade em matéria de fé.

Sixto IV assim o entendeu: "Sabemos que em diferentes povos do reino de Espanha, muitos daqueles que, por iniciativa própria, tem sido regenerados em Jesus Cristo pelas águas sagradas do batismo, voltam secretamente a observância das leis e costumes da superstição judia (...) incorrendo nas penalidades previstas contra os hereges pelas constituições de Bento VIII. Em virtude dos delitos destes homens e da tolerância da Santa Sé a seu respeito, a guerra civil, o homicídio e outros males afligem vossos reinos (...)

"Queremos fazer justiça a vosso pedido e aplicar os remédios aptos a curar os males que assinalais. Autorizamo-los a designar três, ou pelo menos dois, bispos ou homens probos, que sejam sacerdotes do clero secular, religiosos das ordens mendicantes ou não, de quarenta anos no mínimo, de boa-fé e vida exemplar, mestres ou bacharéis em teologia, ou doutores ou licenciados em direito canônico, cuidadosamente examinados e eleitos, temerosos a Deus, e que julgueis dignos de ser atualmente nomeados em cada cidade ou diocese dos ditos reinos, segundo a necessidade (...) Ademais, concedemo-lhes, em face a todos os acusados de delitos contra a fé e a quem os ajudem e favoreçam, os direitos particulares e jurisdição que a lei e o costume concedem aos Ordinários e aos inquisidores da heresia".

A bula de Sixto IV define, pois, claramente a missão dos inquisidores, em razão dos múltiplos critérios que devem guiar sua eleição pelos soberanos: a investigação de personalidades "judaizantes". Trata-se de uma Inquisição antijudaizante e não de uma Inquisição antisemita, dirigida contra os judeus enquanto raça ou religião.

A comunidade judia, em compensação, ficou protegida, como sempre o foi pela Igreja, que proibiu, por locução de Eugênio IV, "de molestar os judeus, matá-los ou privá-los de seus bens... Incumbe a todos os cristãos protegê-los, sob pena de excomunhão, em face a todos os seus perseguidores, não impor-lhes novos tributos, assistir aos sermões, não introduzir-se abusivamente nas sinagogas, não proibir-lhes a observância do sabá ou obrigá-los a batizar-se".

A Inquisição espanhola ilustra nitidamente a união necessária entre a Igreja e o Estado para assegurar a salvação das almas e a concórdia social. Importa proteger a fé dos fiéis, e não exterminar os que estão fora do caminho da salvação, fechando-lhes definitivamente as portas da Igreja.

Sensíveis a esta misericórdia, os soberanos espanhóis não quiseram instalar imediatamente os tribunais inquisitoriais sem permitir aos convertidos compreender seus erros e deles abjurar.

CONCOMITANTE À MEDIDA, PREGAR "A TEMPO E A CONTRATEMPO".

Empreendeu-se pois uma verdadeira campanha de propagação da fé durante dois anos (de 1478 até 1480) sob os auspícios do confessor real, Fernando de Talavera, ele mesmo um convertido, e sobretudo, através do ímpeto que lha imprimia o Cardel Mendoza.

Consciente do perigo que a heresia entranhava e a fim de conjurá-lo, o Cardeal Mendoza instaurou uma política orientada a catequizar o povo e impregnar o tecido social de um espírito profundamente cristão: estimulou a construção de igrejas, criou instituições de caridade e fundou o Colégio da Santa Cruz em Valladolid, dedicado a estudantes sem recursos, doando todos os seus bens a eles. Como esse mesmo espírito, propugnou campanhas de pregação popular no interior do reino.

Convém destacar que a Igreja ambiciona que as almas alcancem a fé por meio da pregação, fazendo eco daquilo que disse o Apóstolo: fides ex auditu, quer dizer, que a fé vem pelos ouvidos. Esta campanha rendeu frutos, ainda que fossem mui escassos. Os reis nomearam dois inquisidores, que tiveram de arrostar a hostilidade dos convertidos.

O inquisidor Pedro de Arbués foi morto no altar da catedral de Zaragoza, em outubro de 1485. os atentados se multiplicaram, e seis assassinos foram condenados à fogueira pela justiça civil. Por vezes os convertidos obstacularizavam vigorosamente a tarefa da Inquisição, como o mostra o episódio de Teruel: em 1484 a cidade se negou a permitir sua entrada, até que cedeu ao assédio das tropas do rei Fernando.

OS MORTOS DA INQUISIÇÃO.

A Igreja tem direito de julgar e de condenar à morte? Diz-se que a Inquisição Espanhola é o exemplo típico desta matéria: trezentos mil mortos, sem contar os exilados por causa do edito de banimento de Dom Fernando. Abandonava a Igreja o preceito da caridade?

Digamos antes que nada, nem a caridade, pode existir sem a virtude da fortaleza e da justiça. Se a Igreja não pode julgar e condenar erros em matéria de fé, ver-se-ia reduzida a nada. Possui um poder exterior que a permite sancionar leis e fazê-las cumprir. Por isso, no âmbito de sua competência, pode e deve julgar o que dizem e fazem seus membros.

Com respeito à quantidade de condenados à morte pela Inquisição Espanhola, todos os historiadores concordam em duas coisas:

- Não se pode determinar atualmente a cifra exata, em razão do desaparecimento dos arquivos;

- Os números que Llorente dá são evidentemente exagerados. Fala de trezentos mil, mas Henri Charles Léa, não menos desfavorável à Inquisição do que ele, desmente-o baseado em quarenta anos de minuciosos estudos. Por sua vez, G. e J. Testas falam de dois mil condenados a morte sobre cem mil casos julgados durante os quinze anos do frei Tomás de Torquemada.

A TORTURA: MITO E REALIDADE.

Nada há mais falso que o emprego sistemático da tortura. Ainda que se empregasse regularmente nos juízos civis, a Igreja só recorria a ela excepcionalmente, reduzindo ao máximo as circunstâncias de aplicação e suas conseqüências. O procedimento estava especificamente regulamentado, pois que necessitava de uma ordem especial confirmada pelos inquisidores e pelo bispo do local, não podendo estender-se a enfermos, mulheres grávidas, ocasionar a perda de um membro nem dano corporal irreparável ou nem, a fortiori, levar a morte.

Ademais, as confissões obtidas deviam ser retificadas a posteriori pelo acusado, sob pena de nulidade. Daí H. C. Léa afirmar que "a crença popular segundo a qual a sala de tortura da Inquisição era teatro de especial crueldade, destinado a arrancar uma confissão, é erro imputável aos escritores sensacionalistas que exploram a credulidade pública".

AS EXPULSÕES.

Ainda resta esclarecer o edito de expulsão da comunidade judia das terras de Espanha. De acordo com os historiadores contemporâneos, entre 150.000 e 200.000 pessoas saíram do país e se refugiaram em Portugal, Itália e nos Estados Pontifícios. A decisão tomada por Isabel e Fernando respondeu à enérgica reação que se produzia na comunidade judia quando algum de seus membros se convertia ao catolicismo.

Decididos a proteger a fé dos novos fiéis, evitar qualquer ajuste de contas e a perpetuação dos processos inquisitoriais, decidiram banir os judeus, permitindo-lhes que levassem consigo os bens, exceto ouro, dinheiro, armas e cavalos ― bens cuja saída do país estava, demais, proibida a todas as pessoas. Os expulsos podiam depositar seu valor em bancos e recuperá-los no exterior por meio de letras de câmbio. Parece que medidas tiveram êxito, já que a partir do ano de 1500 decresceu notavelmente a quantidade de tribunais da Inquisição e o país recuperou paulatinamente a paz civil.

CONCLUSÃO.

A Inquisição Espanhola dista em muito do quadro de imagens estereotipado pelos meios de imprensa e pelos livros de história. Se há alguma dúvida a respeito, veja-se o que disse Bartolomé Bennasar, que, apesar de pensar que a Inquisição era "um empreendimento sistemático de controle social", manifesta o seguinte: "Se a Inquisição fosse um tribunal como os demais, não duvidaria em dizer, sem risco de contradição nem desapreço às idéias recebidas, que é superior a eles. Ou, para melhor dizer, mais escrupuloso: uma justiça que examina atentamente os testemunhos, que aceita sem discussão negações feitas pelos acusados em virtude de testemunhos suspeitos, uma justiça que tortura muito pouco. Uma justiça preocupada em educar e explicar ao acusado porque se equivocou; que reconsidera e aconselha, na qual as condenações definitivas não alcançavam senão aos reincidentes".

(Tradução: Permanência. Revista Iesus Christus - Año XV, nº 95 - Septiembre/octubre de 2004, págs. 6-9.)

Anônimo disse...

Épocas obscuras?

Rogério Côrte Sassonia


Fides, si non cogitatur, nulla est.

(A fé, sem a razão, é nula.)

Santo Agostinho, 354-430 d.C.




São muitas as vozes, amplificadas pelos meios modernos de propaganda, que defendem que a Igreja Católica Apostólica Romana propaga o obscurantismo e impede o desenvolvimento científico. Recentemente, esta acusação tem sido feita com maior freqüência devido às condenações pela Igreja ao uso de células-tronco retiradas de embriões humanos e à terapia transgênica. A Igreja, se bem que em si e por sua natureza tenha por fim a salvação das almas e a felicidade eterna, é entretanto, na própria esfera das coisas humanas, a fonte de tantas e tais vantagens, que as não poderia proporcionar mais numerosas e maiores mesmo quando tivesse sido fundada sobretudo e diretamente em mira a segurar a felicidade desta vida [i]. Esta afirmação poderia ser demonstrada de diversas maneiras, em particular, este artigo traz argumentos que mostram a participação fundamental da Igreja na institucionalização e organização da Universidade, instituição que tem sido, reconhecidamente, uma das criações mais fecundas do Ocidente medieval, na qual os doutores escolásticos transmitiram o amor à verdade, que precisava ser descoberta onde estivesse, e no desenvolvimento científico, onde numerosos integrantes do corpo eclesiástico deram significativas contribuições.

A Universidade medieval não tem precedentes históricos tanto por sua estrutura institucional quanto por seu papel social e intelectual [ii], [iii]. Poucas foram as escolas que se avizinharam da instituição universitária. É verdade que Platão traçou um programa de formação intelectual no Livro VII de sua República. Nessa República ideal, Platão supõe um Estado que patrocine e controle os estudos, mas na realidade, nenhum Estado concretizou, de fato, essa aspiração. No mundo helênico aparecem escolas públicas, mas todas isoladas. Em Roma, somente Adriano pensou estabelecer um Ateneu que se parecia muito a uma Universidade. Esse projeto, entretanto, somente se realizou e, assim mesmo, efemeramente, no tempo de Cassiodoro e do Papa Agapito I no século VI [iii].

As primeiras Universidades apareceram em Bolonha, Paris, Montpellier e Oxford nos primeiros anos do século XIII. Derivadas de escolas preexistentes, para além da diversidade das instituições, elas tinham em comum serem organismos autônomos de natureza corporativa [iv]. Neste aspecto, foi principalmente do papado, representado pelos grandes papas teólogos e canonistas da primeira metade do século XIII, que o apoio foi decisivo [ii]. Em todos os lugares o papado garantiu a autonomia universitária. Em 1214 foram outorgados os privilégios pontificais da Universidade de Oxford. Em Montpellier, onde prossegue o desenvolvimento contínuo das escolas de medicina desde os anos de 1130, a transformação em universidade foi conseguida em 1220 graças aos estatutos outorgados por um legado pontifical. Ademais, um legado pontifical outorgou à jovem universitas magistrorum et scolarium Parisiensium seus primeiros estatutos, confirmados solenemente pela bula pontifical Parens Scientiarum, de 1231 [ii].

Ser autônomo significava ser mestre de seu recrutamento, poder dotar-se de estatuto, poder impor a seus membros o respeito a uma determinada disciplina coletiva e a regras de cooperação mútua, poder, enfim, organizar livremente aquilo que era a própria razão de ser da cooperação universitária, quer dizer, o ensino, os programas, a duração dos estudos, as modalidades dos exames que sancionavam esses estudos e a colação dos graus que coroavam o êxito nos ditos exames [iv]. O título de doctor ou a licentia docendi, conferido pelas universidades medievais, não tem antecedente na Antigüidade clássica [iii].

A gratuidade do ensino e dos graus era um princípio sagrado no século XIII [iii]. As primeiras derrogações vieram de Oxford, onde para fazer viver os mestres, uma ajuda monetária foi consentida; em Paris, em 1281, o Papa Martinho IV sancionou a existência de uma caixa comum, para a qual os escolares contribuíam semanalmente.

O leque social nos meios universitários era extremamente largo [v]. Os nobres nunca foram muito numerosos nas universidades medievais; freqüentemente menos de 5% e, no máximo, 10 a 15%, em casos excepcionais. Os estudos universitários não condiziam ainda nem ao tipo de cultura nem ao tipo de carreira a que esse grupo social se dedicava preferencialmente. É bem provável que o maior número dos estudantes e dos graduados viesse das "classes médias", sobretudo urbanas (notários, comerciantes, artesãos abastados etc) [ii]. Muitas matrículas assinalam a existência de pauperes studentes, reconhecíveis por serem mais ou menos dispensados do pagamento dos direitos universitários. Eram muito numerosos nas universidades alemãs. De uma maneira geral, os estudantes pobres eram particularmente numerosos nas universidades em que as faculdades de Artes haviam permanecido importantes e nas com característica eclesiástica. Os estudos de artes eram relativamente breves, pouco dispendiosos e podiam dar acesso a ofícios intelectuais como o de mestre-escola. Do papado, os universitários haviam também recebido privilégios apreciáveis em matéria beneficial: podiam receber benefícios eclesiásticos e gozar de seus rendimentos durante cinco ou sete anos sem residir no local e sem receber as ordens exigidas [v]. O Chanceler da Universidade de Paris, Jean Gerson (1363 – 1429), filho primogênito de uma família camponesa de doze filhos e nascido na pequena Vila Ardennais, havia começado seus estudos no mosteiro Saint-Remi em Reims. Ainda no século XIX, o monge agostiniano Gregor Mendel (1822–1884), cujo trabalho explicou a hereditariedade e fundou a Genética, era filho de camponeses pobres em Brunn, Morávia, para citar integrantes do corpo eclesiástico que deram significativas contribuições ao desenvolvimento científico.

Além disso, pelo fato do estatuto jurídico dos estudantes e dos mestres torná-los, por princípio, privilegiados, tornar-se estudante significava poder furtar-se ao imposto e às formas mais rigorosas da justiça ordinária, significava poder pleitear proventos dos benefícios eclesiásticos sem obrigação de residência e tomar assento sob a salvaguarda das mais altas autoridades, laicas ou eclesiásticas [iv].

Em todas as faculdades, o ensino era dominado por dois tipos fundamentais de exercícios: a aula (lectio) e o debate (disputatio). A primeira visava a fazer conhecer ao estudante as "autoridades" e, através delas, permitir-lhe dominar o conjunto da disciplina que estudava; a segunda era, ao mesmo tempo, para o professor, o meio de aprofundar mais livremente certas questões do que num comentário de texto e, para o estudante, a ocasião de pôr em prática os princípios da Dialética e de avaliar a precisão de seu raciocínio [v].

As aulas distinguiam-se entre ordinárias e extraordinárias. As aulas ordinárias eram dadas pelos próprios mestres sobre os livros importantes do programa, no início da manhã; as aulas extraordinárias, dadas por bacharéis, tinham lugar no final da manhã ou à tarde. Nos dois casos, o método era o mesmo: o professor, após uma aula de introdução, lia o texto a ser explicado, interrompendo-se em alguns trechos para um comentário; os estudantes acompanhavam em seu próprio exemplar do texto e tomavam notas.

O texto que se analisa é designado por lectio. Como mostra Pacheco [vi], a busca do entendimento do texto, que se escolhe dentre a já rica pluralidade de fontes e autores, cristãos ou não, inclui a tentativa da descoberta da intentio auctoris e o comentário analítico rigoroso. Acrescenta Pinekaers [vii], a escolástica, estruturada a partir da dimensão interpretativa do texto, assume características especiais: é abstrata, como resultado de um pensamento liberto das conotações acidentais; é analítica, pois a palavra significa a essência; é aistórica, situando-se ao nível do essencial, num presente independente do passado e do futuro; é impessoal, já que nunca usa a primeira pessoa; nunca é subjetiva, mas sempre aponta para o universal.

Os debates, por sua vez, eram um tipo de exercício característico da universidade medieval e constituíam a parte mais significativa do ensino nela praticado. Como salienta Pieper [viii]:

"Houve na universidade medieval a instituição regular da "disputatio", que, por princípio, não recusava nenhum argumento e nenhum contendor, prática que obrigava, assim, à consideração temática sob um ângulo universal".

Nas palavras de São Tomás de Aquino, a existência dos debates explicava-se porque:

"Assim como um juiz não pode sentenciar em um Juízo até haver escutado as duas partes, assim o homem que estuda a filosofia julga melhor se observa o choque das idéias, como o de dois adversários em luta" [iii].

Durante suas duas estadas em Paris, São Tomás organizou pelo menos 528 debates, ou seja, mais ou menos dois por semana [v]. Não era suficiente escutar a exposição das aulas por um mestre; era essencial que as idéias se examinassem criticamente nos debates [ix]. Os mais freqüentes eram os "debates ordinários": o mestre escolhia um tema "quaestio", presidia a sessão e encarregava um de seus bacharéis de apresentar a "questão" e de responder às objeções dos discípulos, pronto para ajudá-lo ou retomá-lo em caso de necessidade; o público podia compreender, além dos estudantes e dos bacharéis de aula do mestre, estranhos vindos de outras classes. No dia seguinte ao do debate, o mestre apresentava a síntese da discussão e a esclarecia. Uma ou duas vezes por ano, cada mestre devia também organizar um debate de quolibet, onde qualquer tema podia ser abordado e ao qual assistiam todos os membros da faculdade.

As leituras, comentários de textos e a participação nos debates habituavam os estudantes a se exprimir tanto em latim quanto em vernáculo e a posicionar-se em público, a enfrentar e, se possível, vencer, pela argumentação, os eventuais adversários. Seus estudos de lógica e de retórica lhes teriam dado a arte do raciocínio correto e da demonstração convincente. Um longo exercício da memória lhes permitia convocar, sem se referir a notas escritas, múltiplas citações de autoridades que fundamentavam seu saber. Junte-se a isso o fato de, na maior parte das universidades, os estudantes e os jovens mestres em artes poderem tomar a palavra na deliberação das diversas assembléias e conselhos, exercer funções eletivas, representar a universidade diante de autoridades exteriores. Pela importância dada a todas essas atividades, a universidade certamente contribuiu para a formação de homens de saber, dotando-os, não apenas de uma certa bagagem intelectual, mas de saber-fazer e de desembaraço social e politicamente úteis [iv].

Ademais, a Idade Média era atenta às finalidades sociais da universidade. Com efeito, repugnava-se, então, não apenas a idéia de uma cultura desinteressada, mas, também, aquela de um saber cujo detentor utilizasse a seu modo e exclusivamente para seu próprio benefício pessoal [iv]. "Deve-se aprender apenas para a própria edificação ou para ser útil aos outros; o saber pelo saber é apenas uma vergonhosa curiosidade" [x], já havia dito São Bernardo (1090-1153).

Há que se distinguir desde logo o século XIV, que, em muitos aspectos, especialmente em Paris e Oxford, aparece como um prolongamento do século XIII e o século XV onde as dificuldades sensivelmente se acumulam sobre as instituições devido às mudanças ligadas à emergência do Estado moderno [iv]. As universidades modernas, a partir da Renascença, são criações de príncipes e do Estado, que as absorve cada vez mais [ii], [xi]. Os estatutos que elas receberam desde sua fundação, sempre as caracterizando como instituições autônomas, deixam largas possibilidades de controle e de intervenção aos poderes externos e seus representantes. A mais óbvia foi freqüentemente que os professores (ou pelo menos alguns dentre eles) seriam, dali por diante, pagos pelo príncipe que, como retorno, exerceria o direito de responsabilizar-se por suas nomeações. No século XV, vê-se, na França, onde o reforço do poder real foi particularmente precoce, as velhas universidades (Paris, Orléans, Toulouse) passarem para a tutela de reis, de seus Parlamentos e de seus oficiais. Agora, as universidades estavam no quadro das instituições nacionais. O lento abandono de determinados tipos de exercícios (por exemplo, os debates) é, sobretudo no século XV, uma realidade incontestável [iv]. Talvez o mais inquietante seja o fato de os graus parecerem ter sido cada vez mais fáceis de serem obtidos, a julgar-se pelas taxas de êxito crescente que se percebe. De 1600 a 1800, as taxas de êxito passam em Oxford, (bacharelado em Artes) de 35% para 58%; em Franeker (Países Baixos) de 6% para 71% [ii].

O absenteísmo professoral, associado à falta de assiduidade dos alunos, esvaziava aulas e disputas. Para tomar o caso da França, se as principais universidades – Paris, Toulouse ou Montpellier – preservavam um determinado nível de exigência, pequenas universidades provincianas – Avignon, Orange, Orléans, Nantes, Caen, Reims – especializavam-se vergonhosamente na venda de graus a preços de liquidação e sem exame sério. As dispensas de todo tipo eram facilmente conseguidas. O próprio Estado resignava-se a isso, e tanto que, em 1682, autorizou os alunos de Direito com mais de 24 anos, "em virtude da idade", a conseguir sua licença em seis meses (ao invés dos cinco anos exigidos) [xii].

Na Idade Clássica, até o final do século XVIII, a atividade das Universidades não mais resume toda a vida intelectual. Os reformadores do Iluminismo advogam a sua extinção como resíduos de uma inútil tradição medieval e propunham substituí-las por escolas especializadas [iii]. A Universidade, tão cara a Idade Média, sofria agora o perigo dos chamados "sábios" Iluministas. Os princípios defendidos nessa época são de que o ensino dever-se-ia ficar adstrito a pequenos grupos privilegiados. Voltaire, escrevendo a La Chalotais , concordava em que este tinha razão de proscrever os estudos entre os lavradores. E, numa carta a Damilaville, no ano de 1766, dizia claramente que seria conveniente que o povo fosse guiado e não instruído, afirmando: "Parece-me essencial que haja pobres ignorantes. ... Não é preciso instruir o artesão, mas sim o burguês. ... Se o povo se mete a raciocinar, tudo estará perdido" [xiii].

Além de instituir e fomentar o ensino universitário, a Igreja Católica desenvolveu e difundiu o saber através de seus clérigos. Integrantes do corpo eclesiástico formaram cientistas notórios como Descartes, que estudou no Colégio Jesuíta La Flèche; desenvolveram novas teorias; inventaram máquinas, aparatos; escreveram tratados, estudos, manuais; demonstraram novos princípios em diversos campos da Ciência e das Artes e levaram suas descobertas ao Oriente e às Américas.

A Idade Média viu surgir teorias valorosas, cujos méritos, muitas vezes, foram outorgados a Idade Moderna. A partir de estudos de tratados medievais sobre dinâmica e cinemática, Pierre Duhem argumenta que as idéias essenciais dos princípios básicos da física de Galileu (1564–1642) já estavam presentes no século XIV. A teoria do ímpetus de Jean Buridan (?1300–1358) é vista como um presságio da lei de inércia, que está no cerne da Revolução Científica dos séculos XVI e XVII, e as teses de Nicole Oresme (1323–1382) como uma antecipação da lei da queda dos corpos de Galileu e da geometria analítica de Descartes [xiv].

A participação significativa de integrantes do corpo eclesiástico no desenvolvimento científico foi reconhecida por cientistas notórios. O próprio Galileu, quando em 1611 esteve com Jesuítas em Roma, escreveu a um de seus amigos:

"Estive com os padres Jesuítas e me entretive durante muito tempo com o padre Clavius, com dois outros sacerdotes muito versados na nossa ciência e com os seus alunos também...percebi que eles verificaram a existência real dos novos planetas e que, há dois meses, eles não cessam as suas observações; nós as comparamos às minhas e umas concordam perfeitamente com as outras" [xv].

O trabalho do P. Leon Battista Alberti (1404-1472) é central no desenvolvimento da perspectiva. A palavra "perspectiva" designava, na Idade Média, a ciência da óptica (perspectiva communis). No seu tratado "Sobre a Pintura" de 1435, P. Alberti expõe a perspectiva expressamente no plano matemático e se baseia em conhecimentos sólidos de geometria e óptica: é pela análise dos triângulos e outras figuras formadas pelos raios visuais que convém estudar a representação do espaço. Daí a definição: "o quadro é uma interseção plana da pirâmide visual". A perspectiva lhe fornece, em particular, os meios de "geometrizar" corretamente as projeções mais importantes das linhas retas (verticais, ortogonais ao plano do quadro etc) [xvi].

Para a história do pensamento científico, o fato é significativo. Como salienta Panofsky [xvii] "não é um exagero afirmar que, utilizado desta maneira, esse motivo (...) representa de algum modo o primeiro exemplo de um sistema de coordenadas que, na esfera da concretude artística, torna visível materialmente o ‘espaço sistemático’ moderno, antes mesmo que o pensamento abstrato matemático o tivesse postulado". P. Alberti sintetizou e conceituou essas conquistas.

Na Idade Média essa área de estudos era muito ativa; através do que hoje veríamos como passos vacilantes, preparava-se uma síntese cada vez mais ajustada entre a análise geométrica e o estudo da visão dos objetos. De modo direto ou indireto, P. Alberti e seus contemporâneos conheceram esta tradição medieval. Não só o tratado de Jonh Pecham teve ampla difusão, como Blaise de Parma escrevera, por volta de 1390, um tratado de óptica (Quaestiones Perspectivae). Mais ainda, na década de 1420 circulara um tratado, Della Prospettiva, cujo autor foi Paolo Toscanelli. Como conclui Pierre Thuillier 16: "as inovações do século XV devem ser compreendidas com relação a um plano de fundo teórico muito rico. É impossível, em todo caso, aceitar-se a lenda (ainda muito difundida) do ‘obscurantismo medieval’".

Contudo, o primeiro corpo de católicos eruditos que se tornou preeminente em ciências seculares foram os Jesuítas. A Sociedade de Jesus foi fundada em 1540 por Santo Inácio de Loyola. Os ‘homens do papa’, como eram conhecidos pela sua defesa e propagação da autoridade e do ensinamento papal, deram expressivas contribuições a inúmeras áreas do saber.

Foi o P. Christopher Scheiner (1573–1650), na sua obra Oculus (1619), o primeiro a provar a importância fundamental da retina na visão. Em 1630 publicou Rosa Ursina, sua principal obra. Nestes livros, P. Scheiner descreve algumas de suas descobertas e experimentos tais como a determinação do raio de curvatura da córnea e a descoberta da saída nasal do nervo óptico [xviii], [xix]. Este mesmo padre fornecera provas concludentes sobre a faculdade de acomodação do olho, e se celebrizara pela descoberta das manchas solares e pela invenção do pantógrafo [xx]. Outro jesuíta, o P. Francesco Lana-Terzi (1631–1687) criara um alfabeto para surdos-mudos e um método de leitura para cegos.

Na Matemática, o trabalho do P. Jesuíta belga Gregory Saint Vincent (1584–1667) Opus Geometricum Quadraturae Circuli et Sectionum Coni (1647) fez com que Leibniz o reconhecesse, ao lado de Fermat e Descartes, como um dos que estabeleceram as bases da geometria analítica [xxi]. Pode-se citar também o P. Andrea Tacquet (1612–1660) cujas obras, dentre elas seu principal trabalho Cylindricorum et Annularium (1651), influenciaram Pascal. Neste mesmo século, o P. Girolamo Saccheri (1667–1733) lançava os fundamentos da primeira geometria não euclidiana em Euclides ab Omni Naevo Vindicatus (1733), obra que influenciou Riemann, Lobachevsky, Bolyai e Gauss.

O P. Vincenzo Riccati (1707–1775), por sua vez, estudou equações diferenciais e integrais. Descobridor das funções hiperbólicas, ele encontrou as fórmulas padrão de adição para estas funções e sua relação com a função exponencial. Lambert é freqüentemente citado como o primeiro a introduzir as funções hiperbólicas, contudo, sabe-se que ele não o fez até 1770, enquanto o trabalho do P. Riccati foi publicado entre 1757 e 1767. Seu livro Institutiones é reconhecido como o primeiro tratado extensivo sobre cálculo integral.

Na Física, foram importantes as contribuições do P. Jesuíta Francesco Grimaldi (1613–1663). P. Grimaldi descobriu a difração da luz e expôs a teoria ondulatória de sua propagação na obra Physicomathesis de Lumine (1666). Newton trata das proposições sobre difração da luz de Grimaldi na Parte III de sua Opticks (1704).

Não se deve deixar de mencionar as contribuições do P. Jesuíta Rogério Boscovich (1711–1787) ao desenvolvimento teórico sobre a estrutura da matéria, expostas em sua Theoria Philosophae Naturalis, a qual traz esboços da teoria sobre quarks [xxii]. Nas palavras de Thomson [xxiii]:

"A natureza da coesão foi mais adequadamente explicada por Boscovich do que qualquer outro filósofo. Esta é a mais bela e satisfatória parte de sua teoria".

Também foram importantes as contribuições dos Jesuítas à Astronomia e à Geofísica. Desde 1824 até hoje, 73 observatórios ao redor do mundo são operados por Jesuítas. Dentre os mais importantes e mais conhecidos estão o do Collegio Romano (Roma), Stonyhurst (Inglaterra), Kalocsa (Hungria), Ebro (Espanha), Georgetown (Washington), Havana (Cuba), Zikawei (China), Manila (Filipinas), Tananarive (Madagascar), Riverview (Austrália) e Calcutá (Índia) [xxiv]. Neste aspecto, não se deve deixar de citar as contribuições do P. Ângelo Secchi (1818–1878), em particular, seus trabalhos sobre classificação espectral de estrelas. Ele foi o primeiro a fazer uso sistemático desta técnica na classificação de estrelas, o que o fez ser chamado de "pai da Astrofísica". Na Itália, fundou a Sociedade Italiana de Espectroscopistas, dedicada a estudos espectroscópicos do Sol. Destacam-se, do mesmo modo, as contribuições dos Jesuítas à Meteorologia, especialmente no estudo e previsão de furacões tropicais [xxv].

Já no século XX, o P. Jesuíta Georges Lamaître (1894-1966) apresentou as bases da teoria da expansão do Universo em um artigo publicado nos Anais da Sociedade Científica de Bruxelas, em 1927 [xxvi]. Sua teoria foi confirmada em 1964, quando Arno Penzias e Robert Wilson descobriram a radiação de fundo, cuja existência Gamow havia previsto como uma relíquia da explosão inicial. Por seu trabalho, uma comissão internacional lhe outorgou o Prêmio Francqui, em 1934, o qual recebeu das mãos de Einstein.

Tampouco as extraordinárias contribuições dos Jesuítas se limitaram à ciência. Em 1773, contavam com 350 teatros na Europa. Fundaram o primeiro teatro no continente norte-americano – precisamente em Quebec, em 1640. Ensinaram a França a fazer porcelana. O guarda-chuva, a baunilha, o ruibarbo, a camélia e o quinino foram inovações jesuíticas na Europa.

Menos de cem anos depois da fundação da Sociedade de Jesus, os Jesuítas se tornaram os primeiros europeus a penetrarem no Tibet e depois seguirem dali para a China. O P. Jesuíta Matteo Ricci (1552–1610) provou que a Catai de Marco Pólo era idêntica à China, e não um país diferente, e publicou os primeiros mapas da China disponíveis no Ocidente. Na China, este mesmo padre redigiu um tratado de geometria euclidiana em chinês e ensinou-lhes a arte de fabricar relógios de sol. Pelos seus serviços, foi declarado mandarim oficial no palácio do imperador em Pequim. No Japão, o P. Jesuíta português Luis De Almeida fundou, em 1557, o primeiro hospital no Oriente, dentro do qual foi fundada a primeira escola Médico-Cirúrgica [xxvii]. P. Almeida manda construir também um orfanato com vacaria anexa, visando, deste modo, reduzir a mortalidade infantil na região [xxviii].

No Brasil, os Padres Jesuítas Manuel da Nóbrega e José de Anchieta foram exemplos de um prodigioso sacrifício e abnegação a serviço daqueles da recém descoberta Terra de Santa Cruz. Fundaram colégios, ensinaram aos índios a arte de construir moradias com proporção e alinhamento, fazer móveis, plantar e cultivar a terra. Ainda não estava concluída a Igreja de Nossa Senhora da Ajuda e já a escola estava franqueada aos meninos da nova Cidade do Salvador [xxix]. A criação da escola sempre contemporânea da própria cidade, ou a ela precedendo, como aconteceu em São Paulo, de modo a não se encontrar povoação alguma de certa importância que não tivesse o seu colégio, é um fato característico da missão jesuítica na América Latina.

Foi na escola de Piratininga, inaugurada no dia da Conversão de São Paulo, donde veio ao colégio o nome de São Paulo, derivando-se mais tarde a denominação para a cidade e da cidade para o Estado que P. Anchieta passou, por vezes, noites inteiras a tirar cópias, para os discípulos poderem, a falta de livros, estudar as lições [xxx].

P. Anchieta cultivou com esmero no Brasil as línguas portuguesa e tupi. Deixou-nos sobre esta última a Arte da Língua mais Usada na Costa do Brasil, bem como em latim a Ars Grammatica Linguæ Brasilicæ e o Dictionarium Linguæ Brasilicæ. No mais, a lista de alunos célebres dos Jesuítas no Brasil inclui Gregório de Mattos, Cláudio Manuel da Costa, José Basílio da Gama e P. Antonio Vieira, que, tendo vindo para o Brasil na idade de oito anos, recebeu sua formação literária e científica dos Jesuítas no Colégio de Jesus da Bahia. Também podem ser incluídos os historiadores Francisco de Souza e Pedro Taques, cronista dos bandeirantes, discípulos da Companhia no Rio de Janeiro 29.

Pelo mencionado, a Igreja, no seu magistério, empreendeu-o não somente a salvação das almas e para a felicidade eterna, mas de modo excepcional na esfera das coisas humanas em mira a segurar ainda a felicidade desta vida. Deste modo, por tudo que fez e defende, não se deve obscurecer com afirmações infundadas e distorções históricas absurdas o brilho da contribuição da Igreja Católica ao ensino e ao desenvolvimento científico. Contudo, como reconhece a própria Igreja, esta não se surpreende de ser, à semelhança do seu divino fundador, "objeto de contradição"; mas, nem por isso deixa de proclamar, com humilde firmeza, a lei moral toda, tanto a natural como a evangélica.




Rogério Côrte Sassonia 11/set./2005.




REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


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[xxiii]. (The nature of cohesion has been more happily explained by Boscovich than by any other philosopher. Indeed it forms the most beautiful and satisfactory part of his theory). Thomson, Thomas; A System of Chemistry in For Volumes, 5a Ed., Londres, 1818 apud Rooney, R.; Roger "Boscovich and the Development of Chemical Theory", J. Chem. Educ. 1985, 62, 10, 848.

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[xxvi]. Narlikar, J. V.; Abbe’ Georges Lemaître: Father of the Primeval Atom, Curr. Sci. 1994, 67, 12, 950.

[xxvii]. Fodstad, H.; Hariz, M. I.; Hirabayashi, H.; Ohye, C.; Barbarian Medicine in Feudal Japan, Neurosurgery 2002, 51, 4, 1015.

[xxviii]. Frada, J. J. C.; História, Medicina e Descobrimentos Portugueses: http://www.instituto-camoes.pt/cvc/bvc/revistaicalp/histmeddescpt.pdf, acessado em 11 de setembro de 2005.

[xxix]. Cabral, S. J., L. G.; Jesuítas no Brasil (Século XVI), vol. III, Companhia Melhoramentos: São Paulo, 1925, cap. 3.

[xxx]. Cabral, S. J., L. G.; Pátria e Religião, Sta. Rosa: Nictheroy, 1922, p. 8 apud Cabral, S. J., L. G.; Jesuítas no Brasil (Século XVI), vol. III, Companhia Melhoramentos: São Paulo, 1925, cap. 3.


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Para citar este texto:

Rogério Côrte Sassonia - "Épocas obscuras?"

MONTFORT Associação Cultural

http://www.montfort.org.br/index.php?secao=veritas&subsecao=ciencia&artigo=epocas_obsucaras&lang=bra

Online, 01/02/2006 às 17:21h

Anônimo disse...

Inquisição: verdade e mito!

Prof. Dr. Paulo Faitanin/ Dept. Filosofia -UFF

Inquisição

1. Polêmica: analisar, contar ou romancear os fatos históricos? Na historiografia contemporânea é frequënte o debate acerca do princípio da isenção subjetiva e emocional do investigador em suas pesquisas. De um lado se colocam os analistas isencionistas: a todo custo procuram descartar o subjetivismo. Representam esta postura, não de um modo absoluto, a investigação histórica de corte positivista e materialista. De outro lado, se colocam os que promovem um romancear histórico, onde os elementos subjetivos e relativistas têm vez e lugar. Representam esta postura, sobretudo em nossos dias e também não de um modo absoluto, os investigadores que romanceam a história para torná-la mais 'atual', de mais 'fácil' entendimento. Polêmica ou não, o fato é que uma análise histórica, a partir de uma absoluta isenção, é impossível, bem como ineficiente e inverídica se mero romantismo. Estes dois métodos se opõem e, as vezes, se contradizem. Já que não é possível uma absoluta isenção, ao menos caberia estabelecer - sem ecletismos e relativismos - um método que analisasse os fatos que, ao romanceá-los, nãos os distorcessem, nem os equivocassem. Não raro, temas de grande importância tem sido tratados sem compromisso histórico com a verdade dos fatos. O risco é o de fazer história segundo a opinião de quem escreve e não segundo os fatos. Contudo, o essencial numa investigação histórica são os fatos: os documentos, os dados arqueológicos...eles devem falar mais alto que o sentimento de quem os descreve.

2. Nuvem de fumaça: Dentro deste panorama, o final do século passado e o início deste novo reproduzem inúmeras histórias romanceadas que nem sempre revelam as verdades como são, senão que as escamoteiam, distorcem ou mesmo as ocultam por uma finalidade pessoal ou institucional, religiosa, política, econômica, racial etc. Dentre os temas históricos candentes o da inquisição ocupa lugar muito especial. Muitos livros apareceram e contaram, cada qual ao seu modo, as razões da inquisição. Neste contexto se enquadra o livro A Inquisição [Rio de Janeiro: Editora Imago, 2001, 331 pp.] de Michael Baigent e Richard Leigh. Foram eles mesmos que sustentaram que Dan Brown plagiou em seu romance O Código Da Vinci, a complexa estrutura do livro The Holy Blood and the Holy Graal (O Sangue Santo e o Santo Graal) que eles escreveram há 22 anos. Pois bem, tanto A Inquisição de Michael Baigent como O Código Da Vinci de Dan Brown não são livros de história, mas romances históricos, cuja verdade dos fatos tem igual ou menor valor que as opiniões dos autores que, muitas vezes, distorcem ou maqueiam a verdade, a partir de visões ou experiências subjetivas, relativas, por meio de ataques pessoais agressivos à Instituições ou pessoas.



Michael Baigent


3. Quem é Michael Baigent? Michael Baigent nasceu na Nova Zelândia em 1948 e obteve a graduação em Psiciologia pela Universidade de Canterbury. Desde de 1976 vive na Inglaterra. Publicou vários títulos em parceria com Richard Leigh, mas é ele o principal articulador das teorias que apresenta e defende em suas publicações. Em seu livro A Inquisição procura defamar, segundo ele, revelando o lado escuro da Igreja Católica que, como instituição, no passado e no presente, inventou instrumentos - a inquisição - para controlar e manipular agressivamente as idéias dos que se opunham à sua atividade, utilizando uma variedade de ferramentas, como, excomunhão, catálogo de livros proibidos, prisões, torturas e extermínios.

4. Quais as principais questões do livro de Michael Baigent? Eis as principais questões: (1) Sustenta ser a Inquisição uma instituição puramente eclesiástica; (2) Identifica na pessoa de São Domingo de Gusmão - fundador da Ordem dos Pregadores - o mentor da inquisição; (3) Restringi a inquisição espanhola à natureza eclesiástica; (4) Dá a entender que a inquisição, o Santo Ofício e agora a Congregação para a Doutrina da Fé existem na Igreja Católica como forma de coação ao medo da extinção do papado.

5. O caminho das pedras: Nesta breve análise percorreremos o caminho das pedras e apresentaremos uma visão isenta de sentimentalismos e mitos. Sob forma de questões exporemos nossa análise fundamentando as respostas em fatos históricos e documentos. Depois, sucintamente, contestaremos àquelas questões do livro de Baigent.

5.1. O que é inquisição? A palavra inquisição tem a sua origem latina em inquisitio, onis, proveniente do verbo inquirere, com o sentido de inquirir, investigar, pesquisar e indagar. Depois, na Idade Média, passaria a denominar a instituição que se encarregaria de inquirir as heresias.

5.2. Como surgiu? Como nos adverte Estevão Bettencourt no antigo Direito Romano, o juiz não empreendia a procura dos criminosos; só procedia ao julgamento depois que Ihe fosse apresentada a denúncia. Até a Alta ldade Média, o mesmo se deu na Igreja; a autoridade eclesiástica não procedia contra os delitos se estes não lhe fossem previamente apresentados. No decorrer dos tempos, porém, esta praxe mostrou-se insuficiente. Além disto, no séc. XI apareceu na Europa nova forma de delito religioso, isto é, uma heresia fanática e revolucionária, como não houvera até então: o catarismo (do grego katharós, puro) ou o movimento dos albigenses (de Albi, cidade da França meridional, onde os hereges tinham seu foco principal). Considerando a matéria por si os cátaros rejeitavam não somente a face visível da lgreja, mas também as instituições básicas da vida civil - o matrimônio, a autoridade governamental, o serviço militar - e enalteciam o suicídio. Destarte constituiam grave ameaça não somente para a fé cristã, mas também para a vida pública. Em bandos fanáticos, às vezes apoiados por nobres senhores, os cátaros provocavam tumultos, ataques às igrejas, etc., por todo o decorrer do séc. XI até 1150 aproximadamente, na França, na Alemanha, nos Países-Baixos.

5.3. Por que surgiu? Em qualquer instituição humana em que há postura divergente, quem diverge é inquirido pela unidade da maioria acerca de sua posição. Ato natural, comum e presente na vida do homem. Mas isso também ocorre em instituições que embora constituídas por homens tenham a sua unidade de inspiração pela fé, nalguma revelação divina. Assim os judeus, os islâmicos, os hindus etc. Podemos dizer que desde o início não foi diferente com o Cristianismo, já que a sua unidade, desde os primórdios, foi atacada e ferida por heresias [‘haíresis’: escolha que implica na negação pertinaz, após a recepção do Batismo, de qualquer verdade que se deve crer com fé divina ou na dúvida pertinaz a respeito dessa verdade], apostasias [‘apostasía’: abandono ou repúdio total da fé cristã] e cismas [‘schisma’: divisão por recusa de sujeição ao Sumo Pontífice ou da comunhão com os membros da Igreja a ele sujeitos]. E como no Cristianismo só há um fundador – Cristo – que legou o depósito da fé à sucessão apostólica, todo aquele que direta ou indiretamente se opunha por contradição a Cristo, aos dogmas e à sucessão apostólica desta unidade era indagado e inquirido acerca de sua postura.

5.4. Quando começou e qual era a sua relação com o poder temporal? Nos começos do cristianismo eram as penas espirituais as que se empregavam e, especialmente, a excomunhão e as penitências a que os excomungados se sujeitavam para alcançarem a reconciliação com a Igreja. Contudo, quando a partir de 381 o Imperador romano se tornou cristão, a situação dos hereges mudou. Sendo o Cristianismo religião de Estado os Césares quiseram continuar a exercer para com estes os direitos dos imperadores romanos em relação à religião pagã. A partir de então a heresia era tida como crime civil e todo atentado contra a religião oficial era um atentado contra a sociedade e obviamente contra César; assim, não se deveria ser mais clemente para com um crime cometido contra a Majestade Divina do que para com os crimes da lesa-majestade humana. E foi da legislação civil que vieram as penalidades temporais, aplicadas contra os hereges. Não foram poucos os cristãos que se opuseram a estes castigos e a maioria dos S. Padres, entre outros Santo Ambrósio, S. João Crisóstomo e S. Martinho, mostravam-se abertamente adversos. E Santo Agostinho, que ao princípio não queria contra os hereges senão as penas espirituais, mudou depois de parecer, ao reparar nas grandes desordens praticadas pelos donatistas na África, e admitia que se usasse com eles a luta comedida, por meio de multas contra os hereges vulgares e do exílio contra os cabeças; mas protestou sempre contra a pena de morte, aplicada aos hereges. E foi este o sentir que adotaram a maioria da Tradição da Igreja.

5.5. Onde ocorreu? Assim, pois, desde o início, os que as cometiam eram inquiridos e suas posturas averiguadas. Acerca disso é valioso o testemunho de: ORÍGENES, In Ezechielem homiliae, 9, 1: “Onde estão os pecados, aí está a multiplicidade (das crenças), aí o cisma, aí as heresias, aí as controvérsias. Onde, porém, está a virtude, aí está a unidade, aí a comunhão, em força disso, os crentes eram um só coração e uma só alma”. Deste modo, podemos dizer, num sentido amplo, que a inquisição sempre existiu e ocorreu sempre onde houve a quebra de unidade de uma instituição. Pois bem, dentro do contexto do cristianismo denomina-se Inquisição a instituição destinada a fazer as averiguações sobre as heresias e reprimi-las. No sento estrito, a inquisição é instrumento para averiguação das posturas daqueles que divergem da verdade que norteiam àquela instituição.

5.6. Quais as formas? Assim pois a inquisição não foi criada de uma só vez, nem procedeu do mesmo modo no decorrer dos séculos. Por isso se distinguem em tais formas: (I) A Inquisição em sentido amplo: presente desde o início no Cristianismo como indagação acerca de alguma postura contrária à fé em Cristo e (II) A Inquisição no sentido estrito que historicamente se distingue em três:

(a) A lnquisição Medieval, instituída por Gregório IX (1227-1241), pelos anos de 1231, para atalhar a perversidade herética, fundou a Inquisição, com o título de Inquisitio hæreticæ pravitatis, voltada contra as heresias cátara e valdense nos séculos XII/XIII e contra falsos misticismos nos séculos XIV/XV. O imperador Frederico II pouco se preocupava com os interesses da Igreja; mas como via os perigos das novas idéias anti-sociais e as desordens, com que os cátaros ameaçavam a paz dos seus estados, promulgou, a partir de 1220, uma série de constituições, que muito agravavam as penas pelo sínodo de Verona impostas aos hereges. Foi então que, propriamente falando, a Inquisição começou a desempenhar o seu papel por meio dos seus tribunais, distintos dos episcopais, com jurisdição diretamente recebida do Papa e com os rigores especiais no andamento dos processos, tomados, sobretudo, das leis de Frederico II. Foi a gerência inquisitorial comumente confiada a religiosos mendicantes, e especialmente, ainda que não unicamente, aos religiosos dominicanos. E por que os dominicanos? Pela simples razão de que o ideal de vida religiosa dos dominicanos era a pregação da fé e a busca da verdade e a inquisição eclesiástica fora instituída para inquirir acerca das razões que levaram os hereges a afastarem-se da verdade de fé contemplada na unidade da fé cristã.

(b) A lnquisição Espanhola, instituída em 1478 por iniciativa dos reis Fernando e Isabel; visando principalmente os judeus e muçulmanos, tornou-se poderoso instrumento do absolutismo dos monarcas espanhóis até o século XIX, a ponto de quase não poder ser considerada instituição eclesiástica (não raro a lnquisição Espanhola procedeu independentemente de Roma, resistindo à intervenção da Santa Sé, porque o rei de Espanha, em muitas ocasiões, a esta se opunha). Eram os membros do conselho da Inquisição, funcionários do Estado e nomeados pelo rei, ainda que eram escolhidos dentre os propostos pelo inquisidor-mór; e, como tais, recebiam naturalmente do rei a jurisdição secular; mas não tinham poder algum espiritual, sem que antes fossem investidos deste poder pelo delegado do Papa. Como nos adverte Marcus Moreira Lassance Pimenta em Veritatis Splendor. "Apresenta-se-nos, pois, a Inquisição Espanhola como uma instituição de natureza mista, em que o elemento religioso conserva uma preponderância bem marcada. E o fato de os juizes eclesiásticos entregarem os réus ao braço secular, vem a confirmar esta asserção; porquanto, como se explicaria este procedimento, se a Inquisição espanhola fosse apenas uma instituição do Estado ou um tribunal real? Um tribunal, que tem por costume ordinário e incessante, entregar os culpados ao tribunal secular, não é em si uma corporação secular, a não ser que este epíteto se tome uma acepção inteiramente diversa da que ordinariamente tem. Se, pelo contrário, se admite o caráter especialmente religioso deste tribunal, já facilmente se explica o recusarem-se os juízes deste tribunal a porem em execução as sentenças de pena capital, e o implorarem estes a clemência do poder secular em prol dos condenados, o que, como é sabido, foi uma norma usada em todos os tribunais eclesiásticos e preceituada pelo direito canônico"; e

(c) A lnquisição Romana (também dita "o Santo Ofício"), instituída em 1542 pelo Papa Paulo III, em vista do surto do protestantismo. Apesar das modalidades próprias, a Inquisição medieval e a romana foram movidas por princípios e mentalidade características.

5.7. Como diferem? Como vimos, das três inquisições, duas são de mesma natureza e foram instituídas para averiguar, inquirir as heresias, as doutrinas que combatem a unidade da fé, são elas: A lnquisição Medieval ou Pontifícia e a Inquisição Romana (também dita "o Santo Ofício"), que existe hoje como Congregação para a Doutrina da Fé. A lnquisição Espanhola no início seguia as premissas da Inquisição Medieval, mas logo emancipou-se do controle pontifício tendo recebido autorização do Papa Sixto IV, em 1483, que nomeou Tomás de Torquemada [1420-1498], para atuar como tribunal próprio. A partir de então foram os próprios reis da Espanha que nomeariam os inquisidores, o que nem sempre seguiam tais escolhas os critérios que observassem as premissas da fé, senão as do poder, da política e da revolta. A intervenção do poder secular exerceu profunda influência no desenvolvimento desta inquisição. Neste sentido a inquisição espanhola não é meramente eclesiástica e até em muito se afasta daquela. E vemos aqui novamente como foi pela legislação civil que vieram as penalidades temporais, aplicadas contra os hereges.

6. Análise: A Inquisição eclesiástica subordinando a instituição divina pela defesa das premissas de fé às premissas seculares da instituição humana prestou-se a atos indignos e iníguos como nos processos e condenações dos templários, no reinado de Filipe o Belo, e de Joana d’Arc. Mas isto é para estranhar se eram homens os que intervinham como juízes? Obviamente que não, pois os homens falham em seus julgamentos, mas a justiça divina não. Contudo, mesmo assim, Clemente V, em 1306, condenara a violência emergente nos processos, a ponto de nomear uma comissão para apurar os fatos, especialmente das ações de Conrado de Marburgo na Alemanha e de Roberto de Bougre em Champagne, cujas cartas dos Papas a estes inquisidores lhes faziam lembrar as suas responsabilidades e suas graves culpas. Sobre isso destaca Vacandard (De la tolerance religieuse)., “quando os inquisidores tinham de contar com os soberanos ou com a política, é que os inquisidores se achavam em maior perigo de incorrerem em maiores excessos”. “A parte que o poder civil tomou nos processos dos hereges, diz ele noutro lugar, não foi em favor dos processados, senão muito pelo contrário; e até parece que quanto mais o Estado exercia pressão sobre os tribunais eclesiásticos, mais o processo corria o risco de descambar nas arbitrariedades”.

7. Legitimidade: Será realmente justa a repressão das heresias e até por meio de penas temporais, se se julgarem necessárias? Será ela de fato legítima tanto por parte da Igreja como por parte do Estado? Cristo e com ele a Tradição afirma o direito e o dever de olhar pela pureza da fé, e de punir, até com penas temporais, aqueles dos seus filhos, que se apartarem da verdade e que por seus exemplos se tornarem pedra de escândalo para os seus irmãos. Mas o mesmo se diga acerca do direito de inquirir qualquer instituição ou pessoa que por palavra, ação ou omissão contrarie, perverta, escandalize os princípios que movam a instituição a que ofendem. Na família, no Estado e na vida pessoal é legítimo o direito de preservar o que de verdade lhe constitui e implícito o direito de inquirir os seus opositores quando estes se lhes ofendem, pervertem e escandalizem.

8. Conclusão: A coerência na fé e o senso metafísico dos medievais revelavam uma profunda reverência aos bens espirituais da alma, de tal modo que o seu bem mais valioso - a fé - era defendido com tamanho amor, convicção e coerência a ponto de se considerar o que a corrompe como o crime maior que algum homem pudesse cometer. Por isso S. Tomás adverte: É muito mais grave corromper a fé, que é a vida da alma, do que falsificar a moeda, que é o meio de prover à vida temporal. Se, pois, os falsificadores de moedas e outros malfeitores são, a bom direito, condenados à morte pelos príncipes seculares, com muito mais razão os hereges, desde que sejam comprovados tais, podem não somente ser excomungados, mas também em toda a justiça ser condenados à morte [Suma Teológica II-II, q.11, a.3, c.]. Mas não será pelo menos digno de censura o modo, como este direito foi posto em prática; não houve realmente crueldade por parte da Inquisição? Respondendo esta e àquelas questões que são lançadas no referido livro de Michael Baigent, pode-se dizer baseados nas análises dos textos de Estevão Bettencourt, João Bernardino Gonzaga e Marcus Moreira Lassance Pimenta, o seguinte:

8.1. A Igreja, nos seus onze primeiros séculos, não aplicava penas temporais aos hereges, mas recorria às espirituais (excomunhão, interdito, suspensão ...). Embora já a partir de 381 via-se a Igreja cerceada pelo poder imperial, somente no século XII passou a submeter os hereges a punições corporais. E por quê?

8.2. As heresias que surgiram-no século XI (as dos cátaros e valdenses), deixavam de ser problemas de escola ou academia, para ser movimentos sociais anarquistas, revolucionários, anti-régios, que contrariavam a ordem vigente e convulsionavam as massas com incursões e saques. Assim tornavam-se um perigo público e ao poder régio.

8.3. O Cristianismo era patrimônio da sociedade, à semelhança da prática e da família hoje. Aparecia como o vínculo necessário entre os cidadãos ou o grande bem dos povos; por conseguinte, as heresias, especialmente as turbulentas, eram tidas como crimes sociais de excepcional gravidade.

8.4. Não é, pois, de estranhar que as duas autoridades - a civil e a eclesiástica - tenham finalmente entrado em acordo para aplicar aos hereges as penas reservadas pela legislação da época aos grandes delitos, bem diferenciando a pena espiritual aplicada pelo tribunal eclesiástico da pena temporal pelo tribunal régio.

8.5. A lgreja foi levada a isto, deixando sua antiga posição, pela insistência que sobre ela exerceram não somente monarcas hostis, como Henrique II da Inglaterra e Frederico Barba-roxa da Alemanha, mas também reis piedosos e fiéis ao Papa, como Luís VII da França.

8.6. De resto, a Inquisição foi praticada pela autoridade civil mesmo antes de estar regulamentada por disposições eclesiásticas. Muitas vezes o poder civil se sobrepôs ao eclesiástico na procura de seus adversários políticos.

8.7. Segundo as categorias da época, a Inquisição era um progresso para melhor em relação ao antigo estado de coisas, em que as populações faziam justiça pelas próprias mãos. E de notar que nenhum dos Santos medievais (nem mesmo S. Francisco de Assis, tido como símbolo da mansidão) levantou a voz contra a Inquisição, embora soubessem protestar contra o que lhes parecia destoante do ideal na lgreja.

8.8. Seria absurdo imputar à Igreja os abusos de que são unicamente responsáveis os juizes inquisitoriais. Assim como não podem imputar a um indivíduo senão os atos e os efeitos provenientes da sua atividade pessoal, assim se não pode também acusar uma corporação senão dos resultados que se deram em razão da sua existência e da sua ação como associação, ou, por outras palavras, em razão dos seus princípios constitutivos, das suas leis e do exercício regular da sua autoridade.

8.9. Com respeito à Inquisição Espanhola não há dificuldade em constatar que realmente houve numerosos abusos; nem isto é para estranhar, pois eram homens os que intervinham como juízes. Em todo o caso é mister deslindar bem as responsabilidades. Os papas é que, como vimos, se mostraram sempre adversos a uma demasiada severidade tanto em clamar a atenção sobre os abusos como em coibir.

Algumas referências opostas às defendidas por Michael Baigent:

1. On-line: História da Inquisição de Marcus Moreira Lassance Pimenta em Veritatis Splendor.
2. Livros: Gonzaga, J. B. A inquisição em seu tempo. 3a. Edição. São Paulo: Editora Saraiva, 1993/ Bettencourt, E. O.S.B. A Inquisição. 1a. Edição. Rio de Janeiro: Editoração Eletrônica Eugenio Legrand, 2003.

Anônimo disse...

Mas que gente ignorante...

Orlando Fedeli


Dona Cleonira, minha professora primária - que fazia questão de ser chamada de Cleô - senhora baixinha e arredondada como uma chaleira, ensinou-me que foi Colombo quem provou que a Terra era "era redonda como uma bola, um pouco achatadinha nos pólos". Antes dele, os homens da Idade Média - gente muito ignorante... muito atrasada... - pensavam que a Terra era plana e chata. Boa Dona Cleô, que nos mandava recortar borboletas e desenhar carneirinhos em cada página do caderno, que queria bem limpinho: a pedagogia e a didática exigiam. E ela era uma Pedagoga.

No ginásio, tive outras professoras de História. Uma delas, bem mocinha e de saia curta, mascava chicletes durante as aulas, mandava os alunos lerem o livro ou fazerem "trabalho em grupo" - pesquisa, dizia ela - e, enquanto isso, pintava os lábios olhando-se num espelho baratinho. De vez em quando fazia um curto comentário: "A Idade Média foi uma época muito ignorante e atrasada. Imaginem! Eles não tinham televisão nem moto! Andavam de carroça! A mulher não tinha direitos, não havia escola pública e eles pensavam que a Terra era plana. Hoje nós estamos adiantados: tem computador, o homem chegou à Lua, e qualquer uma sabe que a Terra é redonda."

No colegial, a professora de História - a Lenindira - era de outro estilo. Não se pintava nem usava espelhinho barato. Usava jeans, óculos de lentes redondas e enormes que tornavam seus olhos míopes minúsculos. Tinha preso na blusa um bottom onde se lia: "O povo unido jamais será vencido". Falava em mais valia e exploração do proletariado. Proclamava-se atéia, dizia que éramos filhos de macacos e desancava a Idade Média, idade das trevas e da ignorância, na qual o povo era obrigado a viver rezando, enquanto a Igreja queimava os hereges e ensonava que a Terra era plana.

Entrei num Cursinho. As classes eram abarrotadas de moços e mocinhas preocupados com o vestibular e com rock. Alguns falavam em drogas. Os professores despejavam matéria aos borbotões. O professor de História, muito popular, recheava suas aulas de palavrões e slogans marxistas. Atacava a censura e defendia a liberdade. A cada cinco minutos dizia uma piada pornográfica. Todo mundo ria. Cinicamente. Debochadamente. Menos um colega, com cara desanimada, que fazia o Cursinho pela terceira vez. Ele não ria. Explicou-me que já ouvira todas aquelas piadas três vezes. Sempre nas mesmas aulas. Sempre na mesma hora. Sempre do mesmo jeito. Sempre com os mesmos palavrões. O professor os repetia sempre do mesmo modo. Como um autômato. E falava em liberdade. E sempre a mesma história: "A Idade Média tinha sido uma época muito ignorante. Naquele tempo os homens acreditavam que a Terra era plana".

* * *

Um dia, um amigo me convidou para visitar um professor. Era um sobradinho, num bairro pobre. A sala pequena estava cheia de rapazes que riam. O professor falava pelos cotovelos enquanto tomava café. Não havia palavrões.

A conversa rolou para a Idade Média. Eu, ingênuo, repeti o que aprendera nos chatos e rabiscados bancos de minhas escolas. Soltei lá o "meu" comentário: "Eu acho que a Idade Média foi uma época de gente muito ignorante - é até chamada a Idade das Trevas - na qual se queimava quem não era católico e se ensinava que a Terra era plana e chata." Pensei que ia fazer sucesso e que todos apoiariam minhas palavras, já que essas eram teses universalmente aceitas em nosso científico, progressista e tolerante século XX.

O professor, rindo, me atropelou, contundente: "Quem lhe contou essa lorota?"

Quase engoli uma azeitona que comia, com caroço e tudo. A palavra "lorota" era uma trombada em minha erudição e cultura históricas.

Sem jeito, respondi que todo mundo sabia que era assim. Todos professores que tive me ensinaram isso. Por minha memória passavam rapidamente as imagens de Dona Cleô, recortando borboletas; a mocinha que mascava chicletes, se olhando em seu espelhinho barato; Dona Lenindira com o seu bottom; o professor do Cursinho, escarrando palavrões e vomitando pornografia.

Envergonhado com essas imagens, não as citei. Falei de livros vagos, de jornais, de um filme - "Vocês não viram O nome da rosa?"- todo mundo sabe que a Idade Média foi uma época de gente muito ignorante, que pensava que a Terra era plana, não esférica. Isso é indiscutível.

Meu adversário, na polêmica que se montara, sorria. Citou fatos e autores. Como eu não capitulava e insistia, buscando desesperado no fundo dos arquivos de minha memória - tão vazios! - as informações de Lenindira e as provas que o professor do Cursinho não me dera, ele foi buscar uma pilha de livros que começou a me mostrar.

"Veja este livro (1). Aqui temos a reprodução de uma estátua de Carlos Magno. É um obra romântica do século IX, embora o cavalo seja do século XVI. Repare que o Imperador está com os símbolos de seu poder: usa coroa, numa das mãos porta a espada e na outra segura um globo"

"Que você acha que significa esse globo? Pensa que Carlos Magno fosse talvez campeão de jogo de ‘boccia’? "Esse globo representa a Terra, sobre a qual ele tinha poder. Se os medievais julgassem que a Terra era plana, deviam colocar na mão do Imperador algo como uma tábua, e não um globo. Gente realmente ignorante essa da Idade Média - ironizou o professor. Acreditavam que a Terra era plana e a representavam por meio de um globo".

O argumento era arrasador e a reprodução da imagem de Carlos Magno esmagava tudo o que me haviam ensinado nas planas e chatas aulas de História a que assistira em meus estudos do curso, bem secundário, e do Cursinho, bem primário.

Enquanto eu examinava livro e gravura, por acaso meus dedos abriram uma página na qual havia uma figura do Imperador Otão III no trono. O professor não perdeu a ocasião:

"Note também essa gravura (2). É o Imperador Otão III, que reinou no Sacro Império entre 983 e 1002. Observe que ele também segura o globo na mão esquerda. Esse globo é a Terra.

Já o professor havia pego um outro livro (3) e prosseguia:

"Aqui está uma imagem de Nossa Senhora de Montserrat, padroeira da Catalunha, do século XI. É de madeira pintada, de estilo romântico, até hoje venerada em Montserrat. Tanto ela como o menino Jesus têm nas mão o globo representativo da Terra, da qual a Virgem Maria é Rainha e da qual Cristo é Criador e Senhor.

"Repito. Esse globo não é uma bola de brinquedo. É a Terra. E se representavam a Terra por um globo, é porque sabiam que ela é redonda.

"Esta foto foi posta aí porque santo Inácio de Loyola passou uma noite de vigília diante dela e lhe ofereceu sua espada, quando de sua conversão"

"Examine agora esta esplêndida obra da escultura gótica radiante. É uma imagem de Nossa Senhora cultuada até hoje na Catedral de Notre Dame de Paris. Há reproduções dessa imagem em qualquer livro de arte gótica. Ela é muito famosa. Data de 1300, mais ou menos. O menino Jesus que ela tem nos braços segura, ele também, o globo da Terra entre seus dedos, como se brincasse com o nosso mundo."

Ousei levantar uma objeção: "Esse globo que Jesus e a Virgem Maria têm nas mãos não representaria o universo, o globo celestial, a esfera celeste?"

O professor nem se abalou:

"A objeção é fraca. Se fosse válida, Carlos Magno seria Imperador não da Terra, mas do globo celeste, o que igualaria a Deus. Ao fazer a imagem de Cristo, Sabedoria de Deus encarnada, segurando o globo na mão, brincando com a Terra, os artistas tinham se inspirado no texto da Sagrada Escritura, onde a Sabedoria de Deus diz: 'Et delectabar per singulos dies, ludens coram eo in omnitempore, ludens in orbe terrarum' (Provérbios VIII, 30-31): ‘E cada dia eu me deleitava brincando continuamente diante dEle, brincando sobre o globo da Terra’. É isso o que diz a Vulgata, texto da bíblia de S. Jerônimo, usado na Idade Média. Portanto, qualquer clérigo ou estudante medieval, conhecendo o texto bíblico, sabia que a Terra era um globo.

"E para que não reste qualquer dúvida de que a Bíblia fala em globo da terra - orbe terrarum -, veja o que diz o Dicionário Latino-Português de José Cretella Jr. e Geraldo de Ulhoa Cintra sobre o significado da palavra latina orbis:

"Orbis, is: masc. neutro=redondeza, circulo, a roda, coisa redonda ou circular.

"E o dicionário informa que em Virgílio, o grande poeta romano do tempo de Augusto e autor da Enêida, orbe terraqueo significa o globo da Terra. Temos aí mais um dado. Já Virgílio, na Antigüidade, dizia que a Terra é redonda. E Virgílio era muito lido na Idade Média. Dante Aliguieri o tinha como o modelo dos poetas e como seu mestre".

"Ainda outras passagens da Bíblia afirmam que a Terra é redonda, mas por ora deixe-me mostrar-lhe outras provas referentes à Idade Média, provas que as escolas de hoje ignoram... ou querem ignorar".

"Examine, por exemplo, este livro de Léon Gauthier (4), membro do Institut de France. Ele mostra um desenho medieval muito curioso, representando os antípodas: homens e cães de pé sobre um círculo que representa a Terra. Logo, eles não só tinham idéia de que a Terra é redonda, mas compreendiam também que haviam antípodas, uns de cabeça para baixo em relação aos outros. Repare na legendada ilustração, que registra ser esse um documento catalogado na Bibliothèque Nationale de Paris.

"Veja agora, no mesmo livro (5), um esquema do mapa-múndi medieval da mesma Bibliothèque Nationale.

De novo o mundo é representado de forma circular.

Há ainda (6) outra imagem parcial do mundo, focalizando a Europa. A curvatura do mapa demonstra que eles sabiam que a Terra é redonda."

Arrisquei outra objeção: "Todos esses documentos mostram mapas do mundo circulares, é verdade, mas não em forma de globo, e sim de discos chatos e planos."

"Em forma de pizza, você quer dizer? Também os nossos mapas atuais são circulares ou ovalados, mas sempre planos, como pizzas, apesar de conhecermos a perspectiva. Os medievais não conheciam a perspectiva; por isso nos desenhos representavam a Terra como disco. Mas em suas esculturas, como vimos, representavam nosso mundo como globo, como esfera. Ademais, se seu argumento fosse válido, daqui a 1000 anos alguém poderia pensar que no século XX era muito ignorante, pois nele se acreditaria que é plana e chata, como a mostram nossos mapas atuais."

O professor já pegara outro livro (7): "Século XIII, o maior dos séculos". Temos aqui um mapa tosco e grosseiro do século XIII, que se encontra na Catedral de Hereford. Nele a Terra é apresentada perfeitamente redonda."

Eu já estava convencido, mas o professor queria deixar o assunto resolvido por completo.

"Veja agora este texto. É a Divina Comédia de Dante Alighieri. Ele escreveu seu poema por volta de 1300. Você bem sabe que é uma das mais belas e sábias obras poéticas jamais escritas. Dante foi um grande poeta e um grande sábio, embora muitas de suas idéias sejam inaceitáveis. Aqui, no Paraíso (8), ele repete o que aprendera com seu mestre Virgílio:

"Col viso ritornai per tutte quante

le sete sfere, e vidi questo globo

tal ch’io sorrisi del suo vil sembiante".

"Traduzo os versos em linguagem corrente. É Dante que fala: ‘Com o rosto, com a vista percorri todas as sete esferas (os sete céus que Dante já visitara) e vi este globo tal que eu sorri de seu aspecto pequeno ou vil’. Ora, o globo aí designado é o globo terrestre, conforme explica o comentário a esses versos contido nessa edição (9).

Estava eu já bem consciente de que me haviam impingido uma tolice. Ainda assim, perguntei: "Toda a Idade Média sabia que a Terra era redonda?". Retrucou-me o professor: "Evidentemente deviam existir pessoas rústicas, e até alguns estudiosos, que tinham teorias estranhas sobre esse e sobre outros temas. Também hoje há cientistas que aventam teorias exóticas. Você já leu o que a imprensa tem divulgado a respeito das teorias de Stephen Hawkings sobre a origem do universo? Há hoje também pessoas que pensam que existem seres movidos a pilhas e transístores em outros planetas. Daqui a séculos, quem assistir o filme ET e pensar que o século XX acreditava, todo ele, na existência de seres daquele tipo, estará incorrendo em erro grosseiro. Assim também, é um erro grosseiro pensar que a Idade Média, enquanto expressa por seus mais altos pensadores e artistas, pensava que a Terra era plana e não esférica.

"Veja agora, prosseguiu meu interlocutor, o que diziam os maiores filósofos medievais sobre esse problema. Santo Alberto Magno, que viveu entre 1193 e 1280, e que foi mestre de São Tomás de Aquino, defendeu as idéias geográficas de Aristóteles, inclusive a esfericidade da Terra. São Tomás de Aquino - o maior gênio medieval - tratou da questão em pauta na Suma Teológica (10). Veja o que diz S. Tomás ao cuidar dos fins das ciências:

"O astronômo, por exemplo, demostra a mesma conclusão que o físico, ou seja, a esfericidade da Terra."

"Então o maior filósofo medieval afirmava que a Terra é redonda."

"É incrível, exclamei. Como é que ninguém diz que S. Tomás ensinava isso? Será que ninguém conhece esse texto? Parece-me impossível que ninguém o conheça."

"Realmente é impossível que ninguém o conheça, concordou o professor. Se os que o conhecem não o mencionam, é porque há tal preconceito contra a Idade Média, por ter sido uma época católica, que o mundo moderno ateu tem que denegri-la. E o preconceito é tão forte que ninguém se dá ao trabalho de verificar se uma acusação que se faz contra ela é verdadeira ou não.

"Repare que essas mesmas escolas atuais e esses mestres que tanto falam contra a ignorância medieval lembram que, na Antigüidade, Tales de Mileto (VI séc. A. C.) ensinara que a Terra era redonda e os mapas jônicos da Terra da Terra eram circulares.

"Os pitagóricos tinham ensinado que a Terra era esférica e Aristóteles (384-322 A.C.) provou isso pela sombra curva que nosso planeta projeta na Lua durante os eclipses lunares.

"Eratóstenes (9275-195 A. C.) foi o primeiro homem que calculou o comprimento do meridiano terrestre. Foi ele também quem fez o primeiro mapa com meridianos e paralelos.

"Crates de Malus (145 A.C.) foi o primeiro a construir um globo para representar a Terra, visto que ele era seguidor da escola estóica, a qual ensinava que a Terra era redonda" (11).

"Por todos esses dados você vê que a esfericidade da Terra deixara de ser um mistério há muito tempo. Se os sábios da Antigüidade, os geógrafos e filósofos estóicos e peripatéticos sabiam tudo isso, é bem de desconfiar que os medievais também o soubessem. Com efeito, se Aristóteles foi conhecido pelos medievais do século XIII, os estóicos foram conhecidos desde o início da Idade Média.

"Ademais, como já lhe mostrei, a própria Bíblia, muito lida e estudada pelos medievais, dizia que a Terra é redonda. Veja esse texto de Isaías: "Porventura não chegou ao nosso conhecimento que (Deus) estabeleceu os fundamentos da Terra? Ele é o que está sentado sobre a redondeza da Terra". (Is. XL, 21-22). A tradução é do Padre Mattos Soares. O texto latino da Vulgata dia aí que Deus está sentado sobre o "gyrum terrae". E o Dicionário latino-português diz que girum significa redondeza, circuito, giro, etc. Ora, a Vulgata era o texto da Bíblia usado na Idade Média, como já lhe observei."

Inconformado, voltei a perguntar: "Mas como todo mundo acredita que a Idade Média não sabia que a Terra era redonda?"

"É que de tanto se repetir uma mentira, os homens acabam acreditando nela como verdade. Como essa, há tantas outras mentiras sobre a Idade Média e sobre a História", respondeu-me o professor.

* * *

Saí plenamente convencido, satisfeito com o que aprendera e com raiva dos que haviam me enganado. E eis que, na Avenida, quem vejo eu, vindo a meu encontro? As duas. Uma de saia curta e mascando chicletes, e a outra, magra, de óculos e jeans, azeda e amarga, sempre com o seu bottom na blusa onde se lia: "O povo unido jamais será vencido".

Cumprimentei-as. Estavam indo para um comício. Não perdi tempo e despejei sobre elas os argumentos que aprendera. A professorinha de saia curta continuou mascando chicletes e aproveitou a pausa para se olhar em seu espelho baratinho. A Lenindira, embaraçada, arriscou um sofisma azedo e oco: "Mas não será que o globo na mão de Carlos Magno significavam a perfeição e não a Terra? Você sabe, aqueles medievais gostavam muito de simbologia..."

Quase explodi de tanta raiva diante de tanta má fé. A outra, a de saia curta, pôs fim à conversa dizendo: "Quem foi que fez sua cabeça?". E lá se foram as duas pela Avenida, para o comício. Convictas, uma de sua sabedoria e outra de sua sinceridade.

Mas que gente ignorante havia na Idade Média...

Orlando Fedeli

* * *

Bibliografia

(1) Walter Goetz, História Universal, Espasa-Calpe, Barcelona, vol. III, pág. 128

(2) Idem, pág. 385

(3) H. Rabner, Inácio de Loyola, ed. Desclée de Brower, Bruges, 1956, pág.115

(4) Léon Gauthier, La Chevalerie, ed. Arthaud, Paris, 1959, pág. 88

(5) Idem, pág. 78

(6) Ibidem, pág. 82

(7) James J. Walsh, The Thirteenth Greatest of the Centuries, New York, 1929, págs. 462/463

(8) canto XXII, versículos 132 a 135

(9) Dante, A Divina Comédia, ed. Ulrico Hoepli, Milão, 1985

(10) I., q.1, a.1, ad2

(11) Enciclopédia Espasa Calpe, Barcelona, verbete Mapa, vol. XXXII, pág.1132


Orlando Fedeli - "Mas que gente ignorante..."
MONTFORT Associação Cultural
http://www.montfort.org.br/index.php?secao=veritas&subsecao=ciencia&artigo=masquegente&lang=bra
Online, 20/01/2008 às 18:01h

Anônimo disse...

Sobre Pio XII:


13 Declarações de líderes judeus em defesa do Papa Pio XII


O site forumlibertas.com, publicou em 16 de abril de 2007, declarações 13 grandes líderes judeus em defesa do grande Papa Pio XII, acusado injustamente por muitos de ter sido omisso na defesa dos judeus diante de Hitler. Na verdade a Igreja, por orientação do Papa, agindo de maneira diplomática, conseguiu salvar cerca de 800 mil judeus de serem mortos pelos nazistas.

Segundo o site citado, essas declarações desmentem esta calúnia que foi fortemente propagada pelos adversários da Igreja católica. Elas começaram com a propaganda comunista nos anos 60 e se transmitiram pela “nova esquerda” por toda a Europa , junto com a obra financiada pela União Soviética “O Vigário”, de Huchhoth. Nela se baseia o filme “Amém”, de Costa-Gavras.

As declarações a seguir (tradução nossa para o português), são testemunhos desde 1940, desde Einstein até os grandes rabinos de Bucarest, Palestina e Roma. Os historiadores judeus afirmam que Pio XII salvou a vida de muitos judeus.

As declarações dos líderes judeus:

1 - Albert Einstein:

“Quando aconteceu a revolução na Alemanha, olhei com confiança as universidades, pois sabia que sempre se orgulharam de sua devoção por causa da verdade. Mas as universidades foram amordaçadas. Então, confiei nos grandes editores dos diários que proclamavam seu amor pela liberdade. Mas, do mesmo modo que as universidades, também eles tiveram que se calar, sufocados em poucas semanas. Somente a Igreja permaneceu firme, em pé, para fechar o caminho às campanhas de Hitler que pretendiam suprimir a verdade. Antes eu nunca havia experimentado um interesse particular pela Igreja, mas agora sinto por ela um grande afeto e admiração, porque a Igreja foi a única que teve a valentia e a constância para defender a verdade intelectual e a liberdade moral.”

[Albert Einstein, judeu alemão, Prêmio Nobel de Física, na Revista norte-americana TIME, em 23 de dezembro de 1940. Einstein teve que fugir da Alemanha nazista e foi acolhido nos EUA na universidade de Princeton]

2 – Isaac Herzog

“O povo de Israel nunca se esquecerá o que Sua Santidade [Pio XII] e seus ilustres delegados, inspirados pelos princípios eternos da religião que formam os fundamentos mesmos da civilização verdadeira, estão fazendo por nossos desafortunados irmãos e irmãs nesta hora , a mais trágica de nossa história, que é a prova viva da divina Providência neste mundo.”

[Isaac Herzog, Gran Rabino da Palestina, em 28 de fevereiro de 1944; “Actes et documents du Saint Siege relatifs a la Seconde Guerre Mondiale”, X, p. 292.]

3 – Alexander Shafran

“Não é fácil para nós encontrar as palavras adequadas para expressar o calor e consolo que experimentamos pela preocupação do Sumo Pontífice [Pio XII], que ofereceu uma grande soma para aliviar os sofrimentos dos judeus deportados; os judeus da Romênia nunca esqueceremos estes fatos de importância histórica.”

[Alexander Shafran, Gran Rabino de Bucarest, em 7 de abril de 1944; “Actes et documents du Saint Siege relatifs a la Seconde Guerre Mondiale”, X, p. 291-292]

4 – Juez Joseph Proskauer

“Temos ouvido em muitas partes que o Santo Padre [Pio XII] foi omisso na salvação dos refugiados na Itália, e sabemos de fontes que merecem confiança que este grande Papa estendeu suas mãos poderosas e acolhedoras para ajudar aos oprimidos na Hungria”.

[Juez Joseph Proskauer, presidente do “American Jewish Committee”, na Marcha de Conscientização de 31 de julho de 1944 em Nova York]

5 – Giuseppe Nathan

“Dirigimos uma reverente homenagem de reconhecimento ao Sumo Pontífice [Pio XII], aos religiosos e religiosas que puseram em prática as diretrizes do Santo Padre, somente viram nos perseguidos a irmãos, e com arrojo e abnegação atuaram de forma inteligente e eficaz para socorrer-nos, sem pensar nos gravíssimos perigos a que se expunham.”

[Giuseppe Nathan, Comissário da União de Comunidades Israelitas Italianas, 07-09-1945]

6 – A. Leo Kubowitzki

“Ao Santo Padre [Pio XII], em nome da União das Comunidades Israelitas, o mais sentido agradecimento pela obra levada a cabo pela Igreja Católica em favor do povo judeu em toda a Europa durante a Guerra”.

[ A.Leo Kubowitzki, Secretario Geral do “World Jewish Congress” (Congresso Judeu Mundial ), ao ser recebido pelo Papa em 21-09-1945]

7 - William Rosenwald

“Desejaria aproveitar esta oportunidade para render homenagem ao Papa Pio XII por seu esforço em favor das vítimas da Guerra e da opressão. Proveu ajuda aos judeus na Itália e interveio a favor dos refugiados para aliviar sua carga”.

[William Rosenwald, presidente de “United Jewish Appeal for Refugees”, 17 de março de 1946, citado em 18 de março no “New York Times”.

8 – Eugenio Zolli

“Podem ser escritos volumes sobre as multiformes obras de socorro de Pio XII. As regras da severa clausura cairam, todas e cada uma das coisas estão a serviço da caridade. Escolas, oficinas administrativas, igrejas, conventos, todos têm seus hóspedes. Como uma sentinela diante da sagrada herança da dor humana, surge o Pastor Angélico, Pio XII. Ele viu o abismo de desgraça ao qual a humanidade se dirige. Ele mediu e prognosticou a imensidão da tragédia. Ele fez de si mesmo o arauto da voz da justiça e o defensor da verdadeira paz”.

[Eugenio Zolli, em seu livro “Before the Dawn” (Antes da Aurora), 1954; seu nome original era Israel Zoller, Gran Rabino de Roma; durante a Segunda Guerra Mundial; convertido ao cristianismo em 1945, foi batizado como "Eugenio" em honra de Eugenio Pacelli, Pío XII]

9 – Golda Meir

“Choramos a um grande servidor da paz que levantou sua voz pelas vítimas quando o terrível martírio se abateu sobre nosso povo”.

[Golda Meier, ministra do Exterior de Israel, outubro de 1958, ao morrer Pío XII]

10 – Pinchas E. Lapide

“Em um tempo em que a força armada dominava de forma indiscriminada e o sentido moral havia caído ao nível mais baixo, Pio XII não dispunha de força alguma semelhante e pôde apelar somente à moral; se viu obrigado a contrastar a violência do mal com as mãos desnudas. Poderia ter elevado vibrantes protestos, que pareceriam inclusive insensatos, ou melhor proceder passo a passo, em silêncio. Palavras gritadas ou atos silenciosos. Pio XII escolheu os atos silenciosos e tratou de salvar o que poderia ser salvo.”

[Pinchas E. Lapide, historiador hebreu e consul de Israel em Milão, em sua obra "Three Popes and Jews" (Três Papas e os Judeus), Londres 1967; ele calcula que Pío XII e a Igreja salvaram com suas intervenções 850.000 vidas].

11 – Sir Martin Gilbert

“O mesmo Papa foi denunciado por Joseph Goebbels - ministro de Propagando do governo nazista – por haver tomado a defesa dos judeus na mensagem de Natal de 1942, onde criticou o racismo. Desempenhou também um papel, que descrevo com alguns detalhes, no resgate das três quartas partes dos judeus de Roma”.

[Sir Martin Gilbert, historiador judeu inglês, especialista no Holocausto e a Segunda Guerra Mundial, em uma entrevista em 02-02-2003 no programa "In Depth", do canal de televisão C-Span]

12 – Paolo Mieri

“O linchamento contra Pio XII? Um absurdo. Venho de uma família de origem judia e tenho parentes que morreram nos campos de concentração durante a Segunda Guerra Mundial. Esse Papa [Pio XII] e a Igreja que tanto dependia dele, fizeram muitíssimo pelos judeus. Seis milhões de judeus assassinados pelos nazistas e quase um milhão de judeus salvos graças à estrutura da Igreja e deste Pontífice. Se recrimina a Pio XII por não ter dado um grito diante das deportações do gueto de Roma, mas outros historiadores têm observado que nunca viram os antifacistas correndo à estação para tratar de deter o trem dos deportados. Um dos motivos por que este importante Papa foi crucificado se deve ao fato de que tomou parte contra o universo comunista de maneira dura, forte e decidida.”

[Paolo Mieri, periodista judeu italiano, ex-diretor do “Corriere della Será”, apresentando o livro “Pio XII; Il Papa degli ebrei” (Pio XII; O Papa dos hebreus), de Andrea Tornielli, a 6 de junho de 2001. ]

13 – David G. Dalin

“Pio XII não foi o Papa de Hitler, mas o defensor maior que já tiveram os judeus, e precisamente no momento em que o necessitávamos. O Papa Pacelli foi um justo entre as nações a quem há de reconhecer haver protegido e salvado a centenas de milhares de judeus. É difícil imaginar que tantos líderes mundiais do judaísmo, em continentes tão diferentes, tenham se equivocado ou confundido a hora de louvar a conduta do Papa durante a Guerra. Sua gratidão a Pio XII permaneceu durante muito tempo, e era genuína e profunda.

[David G. Dalin, rabino de Nova York e historiador, 22 de agosto de 2004, entrevistado em Rímini, Itália]

Contra essas declarações inequívocas de ilustres judeus, é impossível alguém mais sustentar as antigas calúnias contra o Papa Pio XII; se assim o fizer, será por ignorância histórica ou maldade consumada.

Prof. Felipe Aquino – www.cleofas.com.br

Data Publicação: 22/10/2007

Anônimo disse...

O texto que se vai ler é a íntegra da mensagem de 2 Junho de 1945 do Papa Pio XII aos Cardeais, sobre a condição da Igreja após a rendição dos Alemães. Repetindo as inequívocas condenações ao Nazismo proferidas por seu egrégio predecessor, esta alocução elucida o real posicionamento da Igreja com relação a Alemanha de Hitler, e constitui prova documental de que jamais existiu tal coisa como "o silêncio de Pio XII":



MENSAGEM SOBRE O NAZISMO E A SITUAÇÃO DA IGREJA NA ALEMANHA



Quando nós muito agradecidamente recebemos, veneráveis irmãos, as gentis palavras que o venerável e amado reitor do Colégio Sagrado ofereceu-nos em vosso nome, nossos pensamentos nos trouxeram novamente a aquele dia, seis anos atrás, quando oferecestes vossas congratulações no dia da nossa festa, após, ainda que imerecidamente, nós termos sidos erguidos à Sé de Pedro.

O mundo então estava ainda em paz: Mas que paz, e quão precária!

Com coração cheio de angústia, perplexos, rezando, nos inclinamos ante aquela paz como quem assiste a um moribundo, e obstinadamente luta para salvá-lo da morte, mesmo quando toda esperança se foi.

A mensagem que então lhes dirigimos refletia nossa triste apreensão de que o conflito, que estivera tornando-se cada vez mais ameaçador, iria estourar — um conflito cuja extensão e duração ninguém poderia prever. A subseqüente marcha dos eventos não apenas justificou por demais claramente nossos mais tristes pressentimentos, mas superou-os largamente.

Hoje, após seis anos, a luta fratricida terminou em uma parte desse mundo lacerado pela guerra. É uma paz — se assim a podemos chamar — ainda que frágil, que não pode perdurar ou ser consolidada exceto a expensas dos mais assíduos cuidados; uma paz cuja manutenção impõe a toda a igreja, a ambos pastor e fiel, tarefas graves e muito delicadas; prudência paciente, fidelidade valorosa, espírito de sacrifício!

Todos são convocados a se devotarem a isto, cada um em seu próprio ofício e em seu próprio lugar. Ninguém poderia trazer a esta tarefa demasiada ansiedade ou zelo. Quanto a nós e nosso ministério apostólico, bem sabemos, veneráveis irmãos, que poderemos seguramente contar com vossa sábia colaboração, vossas incessantes orações, vossa fiel devoção.



A Igreja e Nacional Socialismo.



Na Europa a guerra é finda; mas que feridas não nos infligiu! Nosso Mestre Divino disse: “Todo aquele que tomar da espada perecerá da espada” [Mt 26,52].

Ora, o que se vê? Vê-se o resultado do Estado reduzido à um prática que não observa os mais sagrados ideais da humanidade, que derruba os princípios invioláveis da fé Cristã. O mundo inteiro hoje contempla com estupor as ruínas que isto deixou atrás. Estas ruínas nós as vimos quando ainda estavam no futuro distante, e poucos, acreditamos, seguiram com maior ansiedade o processo conducente ao inevitável choque.

Por mais de doze anos — doze dos melhores anos de nossa maturidade — vivemos entre o povo alemão, cumprindo os deveres de ofício a nós confiados. Durante esse tempo, na atmosfera de liberdade que as condições políticas e sociais do tempo permitiam, trabalhamos pela consolidação do status da Igreja Católica na Alemanha.

Tivemos, então, a ocasião de conhecer as grandes qualidade do povo e estivemos pessoalmente em contato próximo com seus homens mais representativos. Por esta razão, acalentamos a esperança de que possa erguer-se à nova dignidade e à nova vida quando finalmente tiver enterrado o espectro satânico levantado pelo Nacional Socialismo e os culpados (como já tivemos noutros tempos a ocasião de expor) tiverem expiado os crimes que cometeram.

Enquanto ainda existia algum esfalecente brilho de esperança de que aquele movimento poderia tomar um outro e menos desastroso destino, já pela desilusão de seus membros mais moderados, já pela efetiva oposição daquela parte do povo alemão que a ele se opunha, a Igreja fez todo o possível para estabelecer uma formidável barreira à propagação de idéias a um tempo subversivas e violentas.

Na primavera de 1933 o governo alemão pediu à Santa Sé concluir um concordata com o Reich: a proposta tinha a aprovação do Episcopado e de pelo menos a maioria dos católicos alemães.

Com efeito, eles julgavam que nem as concordatas até então negociadas com alguns estados alemães individuais, nem a constituição de Weimar, davam garantias adequadas ou a certeza de respeito a suas convicções, a sua fé, direitos ou liberdade de ação.

Em tais condições as garantias não poderiam ser asseguradas exceto mediante um acordo tendo a forma solene de uma concordata com o Governo Central do Reich.

Deve se acrescentar que, uma vez que foi o Governo quem fez a proposta, a responsabilidade por todas conseqüências indesejáveis recairiam sobre a Santa Sé caso esta tivesse recusado a concordata proposta.



Conveniência da Concordata

Não é que a Igreja, por sua parte, tivesse quaisquer ilusões, construídas em excessivo otimismo ou que, em concluir a concordata, tivesse a intenção de dar qualquer tipo de aprovação aos ensinamentos ou tendências do Nacional Socialismo; isto foi expressamente declarado e explicado na ocasião (Cf. L’Osservatore Romano, No. 174, 2 de Julho de 1933). Deve, entretanto, ser reconhecido que a concordata nos anos que seguiram trouxe algumas vantagens ou, ao menos, preveniu maiores males.

Com efeito, apesar de todas as violações às quais foi submetida, deu aos Católicos uma base jurídica para sua defesa, uma fortaleza atrás da qual poderiam abrigar-se em sua oposição — tanto quanto isto era possível — da sempre crescente campanha de perseguição religiosa.

A luta contra a Igreja tornou-se, de fato, ainda mais acirrada; eram as dissoluções de organizações católicas; a gradual supressão das florescentes escolas Católicas, tanto publicas como privadas; as separações forçadas da juventude com a família e a Igreja; a pressão exercida contra a consciência de cidadãos e especialmente de funcionários públicos; a sistemática difamação, por meios de uma propaganda habilidosa e cuidadosamente organizada, da Igreja, do clero, dos fiéis e das instituições, ensinamentos e história da Igreja; o fechamento, dissolução e confisco de casas religiosas e outras instituições eclesiásticas; a supressão completa da imprensa Católica e editoras.



O Nazismo Denunciado.

Para resistir tais ataques, milhões de corajosos Católicos, homens e mulheres, cerraram fila com seus Bispos, cujos corajosos e severos pronunciamentos nunca falharam a ressoar mesmo nestes últimos anos de guerra. Estes Católicos reuniram-se em torno de seus sacerdotes para ajudá-los a adaptar seus ministérios às sempre cambiantes necessidades e condições. E até o fim, eles lançaram contra as forças da impiedade e orgulho, as forças da fé, da oração e do comportamento e educação abertamente católicos.

Nestes anos críticos, reunindo a vigilância de um pastor com a longa paciência sofredora de um pai, nosso grande predecessor, Pio XI, cumpriu sua missão como Supremo Pontífice com intrépida coragem. Mas quando, após ele ter tentado todos os meios de persuasão em vão, ele viu a si mesmo defrontado com violações deliberadas do pacto solene, com uma perseguição religiosa mascarada ou aberta mas sempre rigorosamente organizada, ele proclamou ao mundo, em 1937, no Domingo da Paixão, em sua encíclica Mit brennender Sorge, o que Nacional Socialismo realmente era: a arrogante apostasia de Jesus Cristo, a recusa de Sua doutrina e de Sua obra de redenção, o culto da violência, a idolatria da raça e sangue, a deposição da liberdade e dignidade humana.



O Chamado Papal

Como um chamado de clarim que toca o alarme, o documento Papal com seus vigorosos termos — muito vigorosos e meditados — alarmaram as mentes e corações dos homens. Muitos — mesmo além das fronteiras da Alemanha — que até então tinham cerrado seus olhos à incompatibilidade do posicionamento do Nacional Socialismo com os ensinamentos de Cristo, tiveram de reconhecer e confessar seus erros. Muitos — mas não todos! Alguns, mesmo entre os próprios fiéis, estavam demasiado cegos por seus preconceitos ou fascinados pelas vantagens políticas.

A evidência dos fatos apresentados por nosso predecessor não os convenceu, muito menos os induziu a mudar seus hábitos. Será por mera coincidência que algumas das regiões que posteriormente mais sofreram com o sistema Nacional Socialista, eram precisamente aquelas onde a encíclica Mit brennender Sorge foi menos ou em nada considerada?

Teria então sido possível, por uma oportuna e calculada ação política, bloquear de uma vez por todas toda a explosão de brutal violência e colocar o povo alemão em postos para livrar-se dos tentáculos que o estrangulavam? Teria sido possível, então, ter salvado a Europa e o mundo dessa imensa inundação de sangue? Ninguém teria atrevido a dar um julgamento desqualificado.

Mas, em todo caso, ninguém poderia acusar a Igreja de não ter denunciado e exposto em tempo a verdadeira natureza do movimento Nacional Socialista e o perigo a que expunha a civilização Cristã.

“Quem quer que estabeleça a raça ou o povo ou o estado ou alguma forma particular de estado ou o poder depositário ou qualquer outro valor fundamental da comunidade humana para ser a suprema norma de tudo, mesmo de valores religiosos, e os diviniza a um nível idólatra, distorce e perverte a ordem do mundo planejado e criado por Deus”. (Cf. Acta Apostolica Sedis, Vol. XXIX, 1937, pags. 149 e 171).

A oposição radical do Estado Nacional Socialista à Igreja Católica está plena nessa declaração da encíclica. Quando as coisas atingiram esse ponto, a Igreja não mais poderia, sem renunciar sua missão, recusar tomar uma posição perante o mundo inteiro.

Mas, ao fazer isto, tornou-se novamente “um signo que será alvo da contradição” (Lc 2,34), em presença da qual opiniões contrastantes dividiram-se em dois campos opostos.

Católicos alemães foram, pode-se dizer, unânimes em reconhecer que a encíclica Mit brennender Sorge trouxe luz, direção, consolação e conforto a todos aqueles que seriamente meditavam e conscientemente praticavam a religião de Cristo. Mas a reação daqueles que foram inculpados era inevitável, e, de fato, aquele mesmo ano, 1937, foi para a Igreja Católica na Alemanha um ano de indescritível amargura e terríveis manifestações.



A Oposição Intensificava

Os importantes eventos políticos que marcaram os dois anos seguintes e a guerra, não trouxeram nenhuma atenuação à hostilidade do Nacional Socialismo com relação a Igreja, uma hostilidade que era manifesta até esses últimos meses, quando Nacional Socialistas ainda se lisonjeavam com a idéia de que, tão logo tivessem assegurado vitória nas armas, poderiam abolir a Igreja para sempre.

Testemunhas autorizadas e absolutamente confiáveis manteve-nos informados desses planos — na verdade, eles revelaram a si mesmos na reiterada e sempre mais intensa atividade contra a Igreja na Áustria, Alsácia-Lorena e, sobretudo, naquelas partes da Polônia que já tinham sido incorporados ao velho Reich durante a guerra: lá tudo foi atacado e destruído; isto é, tudo que poderia ser alcançado por violência externa.

Continuando o trabalho de nosso predecessor, nós mesmos, durante a guerra e, especialmente, em nossas mensagens de rádio, constantemente anunciamos as demandas e leis perenes da humanidade e da fé Cristã no que toca os métodos científicos modernos para torturar e eliminar pessoas freqüentemente inocentes.

Isto era para nós o mais oportuno — e podemos mesmo dizer o único — meio eficaz de proclamar perante o mundo os imutáveis princípios da lei moral e de confirmar, no meio de tanto erro e violência, as mentes e corações dos Católicos alemães nos mais altos ideais de verdade e justiça. E nossa solicitude não foi sem seus efeitos. De fato, sabemos que nossas mensagens, e especialmente aquela do Natal de 1942, apesar de toda proibição e obstáculo, foram estudadas nas conferências do clero diocesano na Alemanha, e, então, exposta e explicada à população Católica.

Se os governantes da Alemanha tinham decidido destruir a Igreja Católica mesmo no velho Reich, a Providência decidiu de outra maneira. As tribulações infligidas na Igreja pelo Nacional Socialismo foram levadas ao término pelo repentino e trágico fim da perseguição! Das prisões, campos de concentração e fortalezas emanam, junto com prisioneiros políticos, também a turba daqueles, clérigos ou leigos, cujo único crime foi sua fidelidade a Cristo e à fé de seus pais ou o resoluto cumprimento de seus deveres como sacerdotes.

Por eles todos nós rezamos e nos atemos a cada oportunidade, sempre que a ocasião a oferecia, de enviar a eles uma palavra de conforto e benção de nosso coração paternal.



Os Padres Poloneses foram os que Sofreram Mais

Com efeito, quanto mais se arrancam os véus que até então escondiam a entristecedora paixão da igreja sob o regime Nacional Socialista, mais aparente torna-se a força, freqüentemente inflexível até a morte, de inúmeros Católicos e a gloriosa porção nesta nobre disputa que pertenceu ao clero.

Embora ainda não em posse das estatísticas completas, não podemos nos abster de lembrar aqui, como forma de exemplo, alguns detalhes dos abundantes relatos que chegaram até nós de padres e leigos que foram internados nos campos de concentração de Dacau e foram tidos dignos de sofrer reprovação pelo nome de Jesus [At 5, 41].

Em destaque, pelo número e dureza do tratamento dado a eles, estão os padres poloneses. De 1940 a 1945, 2.800 eclesiásticos e religiosos poloneses foram aprisionados neste campo; entre eles estava um bispo auxiliar polonês que lá morreu de Tifo. No último Abril, só restavam 816, todos outros estavam mortos à exceção de dois ou três, transferidos a outro campo.

No verão de 1942, 480 ministros de religião de língua alemã eram sabidos estarem reunidos lá; desses, quarenta e cinco eram Protestantes, todos os outros padres Católicos. Apesar do influxo contínuo de novos internados, especialmente de algumas dioceses da Bavária, Reno e Westfalia, seu número, como resultado do alto índice de mortalidade, no início desse ano não ultrapassava 350.

Nem deveríamos nós passar em silêncio aqueles pertencentes aos territórios ocupados, Holanda, Bélgica, França – entre eles o Bispo de Clermont – Luxemburgo, Eslovênia, Itália.

Muitos desses padres e leigos suportaram sofrimentos indescritíveis por sua fé e por sua vocação.

Em um caso, o ódio dos ímpios contra Cristo chegou ao ponto da paródia, na pessoa de um padre internado, com barbante farpado, do escarnecimento e coroamento com espinhos de nosso Redentor.

As generosas vítimas que, durante os doze anos desde 1933, por Cristo e sua Igreja sacrificaram na Alemanha suas posses, liberdade e vidas, estão erguendo suas mãos a Deus em sacrifício expiatório. Que o justo Juiz o aceite em reparação dos muitos crimes cometidos contra a humanidade não menos que contra as gerações presente e futura, e especialmente contra a juventude desafortunada da Alemanha, e que Ele, finalmente, segure o braço do anjo exterminador.

Com sempre crescente persistência, o Nacional Socialismo procurou denunciar a Igreja como inimiga do povo alemão. A injustiça manifesta da acusação teria ofendido profundamente o sentimento dos Católicos Alemães e o nosso, se tivesse vindo de outros lábios. Mas nos lábios de tais acusadores, longe de ser agravo, a acusação é o mais claro e honorável testemunho da forte e incessante oposição sustentada pela Igreja a tais doutrinas e métodos desastrosos no interesse da verdadeira civilização e do povo Alemão; para este povo, oferecemos o desejo que, libertos agora do erro que o precipitou no caos, possa encontrar novamente sua própria salvação nas fontes puras da paz e felicidade verdadeiras, nas fontes da verdade, humildade e caridade, fluindo com a Igreja desde o coração de Cristo.



II. Olhando para o Futuro:

Uma lição certamente dura aprendida, esta dos últimos anos! Deus concedeu ao menos que isto possa ser compreendido para o lucro das outras nações!

“Recebai instrução, vós que julgai o mundo!” [Sl 2, 10].

Este é o mais ardente desejo de todos que sinceramente amam a humanidade. Pois a humanidade, agora a vítima de um processo ímpio de exaustão, de cínico desprezo pela vida e direito dos homens, tem apenas uma aspiração: seguir uma vida tranqüila e pacífica, em dignidade e honesto labor. E, para este propósito, espera que um fim seja dado àquela insolência com a qual a família e o coração doméstico foram abusados e profanados durante os anos de guerra.

Pois aquela insolência clama ao céus, e evolveu num dos mais graves perigos não apenas para a religião e moralidade, mas também para a relação harmoniosa entre os homens. Criou sobretudo aquelas turbas de desamparados, desiludidos, desapontados e desesperados, que irão expandir as fileiras da revolução e desordem, em pagamento da tirania não menos despótica que estas cuja derrota planejaram os homens.

As nações, e notavelmente as médias e pequenas nações, clamam o direito de ter seus destinos em suas próprias mãos. Eles podem ser levados a assumir, com seu total e desejoso consentimento, o interesse do progresso comum, obrigação que modificarão seus direitos de soberania.



Um final para o Jogo de Guerra

Mas após terem sustentado sua porção — sua larga porção — de sofrimento para derrubar um sistema de violência brutal, eles são designados a recusar a aceitar um novo sistema político ou cultural que é decisivamente rejeitado pela grande maioria de seu povo. Eles mantém, e com razão, que a tarefa primeira de construtores da paz é de pôr um fim ao criminoso jogo de guerra e assegurar direitos vitais e obrigações mútuas, como entre o grande e o pequeno, o poderoso e o fraco.

No fundo de seus corações, os povos sentem que seu governo poderia ser desacreditado se eles não sucederem em suplantar a louca irresponsabilidade do governo da violência pela vitória do certo.

O pensamento de uma nova organização da paz é inspirado — ninguém poderia duvidar — pela mais sincera e leal boa vontade. A humanidade inteira segue o progresso dessa nobre empresa com ansioso interesse. Que amarga desilusão seria se isto fosse falhar, se tantos anos de sofrimento e sacrifício próprio fossem em vão, ao permitir novamente prevalecer aquele espírito de opressão do qual o mundo esperava ver-se liberto de uma vez por todas!

Pobre mundo, ao qual pode então aplicar-se as palavras do Cristo: “E o último estado daquele homem torna-se pior que o primeiro”[Lc 11, 24-26].

A presente situação política e social sugere estas palavras de aviso a nós. Nós tivemos, hélas, de deplorar em mais de uma região o assassinato de padres, deportação de civis, o assassinato de cidadãos sem julgamento ou em vendeta pessoal. Não menos triste são as notícias que chegaram a nós da Eslovênia e da Croácia.

Mas nós não nos deixaremos abater. Os discursos feitos por homens competentes e responsáveis no curso das últimas semanas tornaram claro que eles estão almejando o triunfo das coisas certas, não meramente como objetivo político mas mesmo como dever moral.

Por conseguinte, nós confiantemente publicamos um ardente apelo por preces a nossos filhos e filhas de todo o mundo. Que ele atinja todos aqueles que reconheçam em Deus o amoroso Pai de todos homens criados em sua imagem e semelhança, a todos que sabem que no seio de Cristo bate um divino coração rico em misericórdia, profunda e inexaurível fonte de todo bem e todo amor, de toda paz e toda reconciliação.

Do cessar de hostilidades à verdadeira e genuína paz, como nós alertamos não muito tempo atrás, o caminho será longo e árduo, demasiado longo para a reprimida aspiração da humanidade faminta por ordem e calma. Mas é inevitável que tenha de ser assim.

Talvez seja até melhor assim. É essencial que a tempestade das paixões superexcitadas seja primeiro deixada acalmar: Motos praestat componere fluctus [Virgílio, Enéidas 1, 135].

É essencial que o ódio, a desconfiança, os estímulos de um extremo nacionalismo dêem lugar ao crescimento de sábios conselhos, ao florescimento de planos pacíficos, a serenidade no intercâmbio de opiniões e a fraterna compreensão mútua.

Que o Espírito Santo, luz dos intelectos, gentil governante dos corações, digne-se a ouvir as orações de Sua Igreja e guiar em seu árduo trabalho aqueles que, em conformidade com seu mandato, estão buscando sinceramente, apesar dos obstáculos e contradições, alcançar o objetivo tão universalmente, tão ardentemente, desejado: paz, uma paz meritória do nome; uma paz construída e consolidada em sinceridade e lealdade, em justiça e realidade; uma paz de força leal e resoluta de superar ou tornar impossível aquelas condições econômicas e sociais que podem, como fizeram no passado, facilmente levar a novos conflitos; uma paz que pode ser aprovada por todos homens de mente reta de todos povos e todas nações; uma paz que as futuras gerações poderão considerar agradecidamente como o resultado feliz de um triste período; uma paz que possa projetar-se nos séculos como avanço resoluto na afirmação da dignidade humana e da liberdade ordenada; uma paz que possa ser como a Magna Carta que encerrou a idade das trevas da violência; uma paz que, sob a misericordiosa direção de Deus possa deixar-nos então atravessar prosperidade temporal sem perdermos a eternal felicidade. [Cf. Collect, Terceiro Domingo após Pentecostes]

Mas, antes de atingirmos esta paz, segue verdade que milhões de homens, em seu próprio lar ou em batalha, em prisão ou em exílio, tem de ainda beber seu amargo cálice. Quão ansiamos ver o final de seus sofrimentos e angústias, a realização de suas esperanças! Por eles, e por toda humanidade que sofre com eles e neles possa nossa humilde e ardente oração acender ao Todo Poderoso Deus.

Enquanto isso, veneráveis irmãos, nós estamos imensamente confortados pelo pensamento de que dividis nossas ansiedade, nossas orações, nossas esperanças; e que por todo o mundo Bispos, Padres e fiéis estão unindo suas súplicas às nossas no grande coro da Igreja universal.

Em testemunho de nossa profunda gratidão e como garantia de infinitas graças e favores Divinos, com sincera afeição, nós damos a vós, a eles, a todos que se unem a nós desejando e trabalhando pela paz, nossa benção apostólica.


S.S. Papa Pio XII


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Vida, Arte e Ecologia disse...

IGREJA CRISTÃ E
PROSELITISMO ATEU

“Cedi enfim admitindo que Deus era Deus, e ajoelhei-me e orei: talvez, naquela noite, o mais deprimido e relutante converso de toda a Inglaterra. Não percebi então o que se revela hoje a coisa mais ofuscante e óbvia: a humildade divina que aceita um converso mesmo em tais circunstâncias” (C.S.Lewis – “Surpreendido pela Alegria”)

O ateísmo, como movimento ideológico e filosófico – crente de que “o homem é a medida de todas as coisas” – conforme reza o modernismo - parece empreender uma verdadeira cruzada anti-religiosa, tentando minar a fé das pessoas com seu racionalismo obsessivo e, quiçá, desesperado.
Por exemplo, o jovem autor do livro “Ateísmo & Liberdade”, André Díspore Cancian, afirma: “Desfecho críticas à religiosidade e à religião, pois as julgo como algo extremamente pernicioso – um grilhão, uma verdadeira travanca ao progresso do conhecimento humano. Fazer da credulidade irrestrita, desse fechar-os-olhos par excellence – mais conhecido como fé – uma virtude foi a mais indecente perversão já perpetrada contra a liberdade humana”.
Há uma verdadeira maré de publicações que tentam vulgarizar o ateísmo como o caminho certo para uma humanidade “oprimida pelos religiosos”.
O jornalista britânico Christopher Hitchens publicou um livro chamado “deus não é GRANDE”. Afirma ele: “Se eu não posso provar definitivamente que o sentido da religião desapareceu no passado, que seus livros fundamentais são fábulas transparentes, que é uma imposição criada pelo homem, que tem sido inimiga da ciência e da pesquisa e que sobreviveu principalmente de mentiras e medos e foi cúmplice da ignorância e da culpa, bem como da escravidão, do genocídio, do racismo e da tirania, eu quase certamente posso afirmar que a religião hoje está plenamente consciente dessas críticas. Também está plenamente consciente das provas cada vez mais numerosas, referentes às origens do universo e à origem das espécies, que a relegam à marginalidade, quando não à irrelevância”.
Manipulando palavras e citando a pseudo-ciência (como a teoria de Charles Darwin – que por não encontrar sustentação continua apenas como teoria e não verdade cientifica comprovada) não apenas nega Deus, nega o valor da maioria das religiões – que buscam na transcendência não apenas a origem da realidade e da vida, como também o sentido da existência humana.
O biólogo Richard Dawkins, considerado um dos papas do ateísmo, publicou no ano passado o livro “Deus – Um delírio”. Em seu fanatismo racionalista ateu compara a “educação religiosa ao abuso infantil”. Vai mais além, conforme uma sinopse da editora: “Em 'Deus, um delírio', seu intelecto afiado se concentra exclusivamente no assunto e mostra como a religião alimenta a guerra, fomenta o fanatismo e doutrina as crianças. O objetivo deste texto mordaz é provocar os religiosos convictos, mas principalmente provocar os que são religiosos 'por inércia', levando-os a pensar racionalmente e trocar sua 'crença' pelo 'orgulho ateu' e pela ciência”. Na verdade esse ateísmo proselitista parece firmar-se, cada vez mais, ironicamente, como uma nova religião – como mostra outra obra, “Tratado de ateologia”, de Michel Onfray: “Deus não está morto nem moribundo – ao contrário do que pensam Nietzsche e Heine. Nem morto nem moribundo porque não mortal. Uma ficção não morre, uma ilusão não expira nunca, não se refuta um conto infantil”.
Há, desde há muitos anos, uma verdadeira guerra às tradições judaico-cristãs, cuja difusão deu origem a civilização ocidental, conquistas na ciência e elevando a dignidade humana através de valores éticos e morais – que muitos querem banir da consciência humana porque confrontam pressupostos da velha e decadente condição humana.
Em sua obra “Civilização em Transição” C.G.Jung lembra a Revolução Francesa como “não tanto uma revolução política mas muito mais uma revolução dos espíritos, uma explosão generalizada da energia armazenada pelo iluminismo francês”. Observa: “A primeira destituição oficial do cristianismo pela Revolução deve ter causado uma profunda impressão no pagão inconsciente que existe em nós, pois desde então ele não teve mais sossego. E, desde então, a descristianização da cosmovisão fez rápidos progressos”.
Não podemos negar, no entanto, que a religião, em si, como prática humana, é sujeita a erros e manipulações – que tem ocorrido na História.
Vemos, no entanto, como a Bíblia, revelando a presença de Deus e sua vontade – intervindo na História e na vida de seus personagens – não esconde as misérias da condição humana, nem a fragilidade e pecados de seus heróis. Nesse sentido confronta os mitos, fantásticos e manipuladores, da tão celebrada Grécia, pelos racionalistas, e sua cultura.
Quando a religião, como instituição humana, se afasta dos preceitos áureos das Sagradas Escrituras, torna-se em inimigas da verdade – e é fato que isso vem ocorrendo através dos séculos. No entanto a verdadeira Igreja de N.S.Jesus Cristo vem prevalecendo há mais de dois mil anos, mesmo que em meio ao trigo haja muito joio – como alertou Jesus a seus discípulos: “Pelos frutos os conhecereis”.
Os teóricos do ateísmo, em sua vertente que ostenta nomes como Sigmund Freud, Friedrich Nietzsche, David Hume, Henry L. Mencken, Arthur Schopenhauer, Mikhail Bakunin, Sebastièn Faure, Bertrand Russell, Richard Dawkins e Geoffrey Miller, vêm influenciando uma nova safra de niilistas, nessa cruzada contra a realidade da fé – tentando desconstruí-la na mente nas novas gerações utilizando falsos pressupostos.
Sé há grandes contradições no seio de instituições religiosas esse fato não limita o poder, a presença benéfica e salutar para a vida das nações. Cremos e defendemos o valor da mensagem do Evangelho de Jesus Cristo, que coaduna com os ideais mais elevados da consciência humana – criada à “imagem e semelhança de Deus”.
Jesus também se referiu aos inimigos da fé, que combateriam utilizando os mais diversos meios. Desde seus primórdios a Igreja de Cristo foi martirizada pelos seus opositores: Vários apóstolos, muitos pais da Igreja, quase toda a geração de crentes, no primeiro século, os protestantes, no Século XVI, foram alvos do ódio irracional de potentados terrenos. A gloriosa galeria dos mártires continua a fulgurar heróis da fé em pleno século 21 (dois missionários coreanos, por exemplo, foram sacrificados por grupos fanatizados no Afeganistão, há alguns meses – porque expressavam com serviço seu amor a Cristo e ao seu semelhante, em ações humanitárias). Nunca, porém, ouvimos dizer que houveram pessoas martirizadas por defenderem o ateísmo e seus ideais de uma vida sem Deus!
Por outro lado a filosofia, desde o advento da equação hegeliana, vem influenciando uma geração para a qual nada faz sentido e o vazio deve ser preenchido pelo hedonismo e crescente sede de um consumismo desesperado – fortalecendo a indústria das drogas e da violência, bem como um consumismo que degrada os ecosistemas.
Devemos também lembrar que Jesus ensina à prática da fé, expressa através de um novo estilo de vida, não mais guiado pela velha natureza, nem sustentado por hierarquias tradicionais. Propôs um modus vivendi cuja máxima resumiu em dois preceitos: “Amarás ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, com todas as tuas forças, com todo teu entendimento, e, amarás a teu próximo como a ti mesmo”.
Desde seus primórdios a Igreja cristã tornou-se o seio de todos os excluídos: escravos, presidiários, assassinos arrependidos, mulheres discriminadas, crianças desamparadas, mendigos e aflitos, doentes e endemoninhados. Jesus disse para um grupo de religiosos: “Eu vim para dos doentes e não para os que não necessitam de médico” – negando a auto-suficiência humana que, presa a rituais, negava o verdadeiro culto a Deus.
Jesus observou as multidões como rebanhos sem pastor e atribuiu a seus discípulos o nobre papel de liderar os povos desamparados de todas as nações.
A humanidade não pode se esquecer dos horrores causados pelo ateísmo de Estado: Milhões de mortos, assassinados, deportados e submetidos a campos de concentração, na Rússia e países do leste europeu – que até hoje é assombrado pelos seus traumas. Milhões de judeus foram exterminados barbaramente por um regime soberbo liderado por um homem sem temor a Deus, chamado Adolf Hitler. Jesus garantiu a vitória a seus seguidores: “Edificarei a minha Igreja e as portas do inferno não prevalecerão contra ela”.
Devemos, pois, entender um princípio básico: A Igreja cristã transcende às denominações religiosas; ela deve se responsabilizar pelas falhas de seus seguidores, porém não pode ser responsabilizada pelas mazelas de instituições ou de governos apenas nominalmente “cristãos” – porque as instituições passam, mas a Igreja (o Corpo místico de Cristo) prevalece, sendo continua e crescentemente consolada, perdoada, santificada e glorificada.
A Igreja de Cristo é caracterizada por aquele que nega a si mesmo em benefício do próximo; é aquela que oferece a outra face e não revida a acusações e afrontas; é aquela que chora pelos seus mártires, mas não martiriza ninguém; clama pela justiça, mas não apela para a violência para fazer valer algum direito. Sua missão é ser sal da terra e luz do mundo – o amor é seu motivo e o serviço abnegado o coração de seu Evangelho. Vive para a glória de Deus e é essencialmente livre pois “onde está o Espírito do Senhor, aí há liberdade”.
Devemos nos aliar aos ateus na denuncia a injustiça e a barbárie, ao fanatismo intolerante e a discriminação – sem, no entanto, abrir mão da liberdade de reafirmar nossa fé e prosseguir na missão de fazer discípulos para Cristo.

vidarteecologia.blogspot.com/ José J Azevedo.

Roger disse...

Senhor "Conde"
O senhor afirma que a Igreja não queimou ninguém na Inquisição. Está correto. Ela condenava por heresia e mandava os réus às autoridades (na falta de melhor termo) civis. Ocorre que o senhor "esqueceu-se" de dizer que os eclesiásticos SABIAM o que seria feito com os condenados (e ainda tem cooragem de falar mal de Pôncio Pilatos...). E mais, que os bens dos executados (aliás, de toda a família destes) eram confiscados pelos monarcas, que eram bem generosos com os seguidores do nazareno...

Conde Loppeux de la Villanueva disse...

O senhor afirma que a Igreja não queimou ninguém na Inquisição. Está correto. Ela condenava por heresia e mandava os réus às autoridades (na falta de melhor termo) civis. Ocorre que o senhor "esqueceu-se" de dizer que os eclesiásticos SABIAM o que seria feito com os condenados (e ainda tem cooragem de falar mal de Pôncio Pilatos...).


Conde-E quem disse o contrário, sua besta? Eu disse que os eclesiásticos não executavam a sentença, mas repassavam as autoridades o poder de executá-las. Todavia, a maior parte dos casos inquisitoriais não dava em morte. E quanto a Pôncio Pilatos, a tese não somente é jocosa, como mau caráter e desonesta. Só pela sua afirmação, eu sei que vc é judeu. Vc precisa estudar a história de seu povo. Os judeus tb tinham leis punitivas de morte a quem cometesse o crime de blasfêmia, dentro de suas comunidades. O fato deve ser entendido, dentro de um contexto da época e das mentalidades daquele povo.


E mais, que os bens dos executados (aliás, de toda a família destes) eram confiscados pelos monarcas, que eram bem generosos com os seguidores do nazareno...

Conde-E pq não seriam, se são cristãos? Os reis deveriam ser generosos com os islâmicos ou judeus, por acaso, sua tonteria?

Conde Loppeux de la Villanueva disse...

É até piada que o sr. judeu, que preferira escolher um bandido a um homem santo e divino, agora queira transformar a Igreja numa espécie de Pôncio Pilatos. . .Pilatos, ao menos, lavou as mãos. Já o nosso amigo judeu preferiu que o sangue de um inocente caísse sobre ele.

Leandro Ilek disse...

Tem que ter muito saco para ler um texto tão extenso e que, assim como no começo, dever estar impregnado de "achismos" maquiados.

Conde Loppeux de la Villanueva disse...

Tem que ter muito saco para ler um texto tão extenso e que, assim como no começo, dever estar impregnado de "achismos" maquiados.

Conde- Que dirá, que devo aguentar vc. . .

Conde Loppeux de la Villanueva disse...

Ilek, o molek.

Leandro Ilek disse...

Vamos as piadinhas entao...

Conde, o Konder:

Um dia pretende ganhar dinheiro com esses textos? Ou seriam "textículos"...?

Conde Loppeux de la Villanueva disse...

Um dia pretende ganhar dinheiro com esses textos? Ou seriam "textículos"...?


Conde-Testículos são aquelas bolas que, provavelmente, estão entrelaçados na sua bunda.

Anônimo disse...

Não adianta tentar colocar na cabecinha desses jumento ateus que catolicismo e cristianismo são coisas diferentes, que os crimes de um não podem ser responsabilizados pelo outro.

Anônimo disse...

Concordo com tudo, discordo de tudo.

Mas, vem cá!, ter um papa que era membro da juventude hitlerista é motivo de jubilo para os cristãos católicos?

Por que o nível de milagres caiu tanto nos últimos séculos, mesmo a população tendo aumentado em PG (progressão geométrica)?

Sempre quis saber o motivo pelo qual a ICAR não permite investigações a fundo quando padres são acusados de pedofilia e também me espanta a rapidez com que são transferidos de paróquia ou de país quando surgem esse tipo de denúncia. Alguém se habilita?

O reino de deus adota que modelo: absolutista ou democrático? Por que jesus não falou em república democrática de deus e sim em reino de deus, em reino no meu pai? Ele quer simples adoradores ou pessoas que pensam por si mesmo?

Tá, tudo isso é maldade minha, que não devo ter Jesus no coração, reconheço.

Mas uma perguntinha não quer calar: por que os católicos não continuam nas igrejas, convençam pelo exemplo, reformem suas instituições e as adequem à realidade contemporânea e deixam os outros pensar como bem entendem? Por que tem sempre de agredir quem discorda? Isso cansa... Talvez seja o motivo pelo qual a igreja organizada esteja, cada dia mais, se tornando uma peça sem utilidade no museu da história. Pensem nisso.

Anônimo disse...

Quer saber como pensam os ateus do brasil, vejam os blogs do ateu lucabi brasil!

Anônimo disse...

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